uh, together

iv

A partir do momento que se esgotou o prazo dado por 'Ela' ao quarteto, sem que qualquer um dos quatro fosse o escolhido, foi como se uma nuvem se dissipasse sobre Flávia e Guilherme e os dois sentissem como se pudessem, finalmente, respirar e tirar o pé do acelerador a respeito de seu próprio relacionamento.

Embora ninguém mais os julgasse a respeito da velocidade com a qual se casaram e tiveram a pequena Paulinha, tanto o médico quanto a cantora tinham plena consciência de que tinham pulado fases, pois ambos pensavam que não teriam tempo para aproveitar os momentos de namoro e noivado. Até mesmo a gravidez de Paulinha fora vivida de forma truncada, aos trancos e barrancos, devido à separação ocasionada pelo momento de insanidade de Guilherme, que regredira e ofendera a esposa sem qualquer motivo para tal.

Assim, a partir do momento que ambos perceberam que tinham uma vida inteira pela frente, há cerca de dois meses, resolveram viver tudo do jeito dito "certo". Isto é, passaram a viver como namorados, com pequenas viagens a sós, idas ao cinema, jantares e longos fins de semana a bordo do "Pink", onde conversavam sobre tudo e sobre nada, conhecendo-se ainda mais.

Os momentos de romance não se limitavam apenas a eles dois, contudo. Sempre que possível incluíam Paulinha, Antônio, os pais e a irmã de Flávia e os pais de Guilherme. Pois, para espanto geral, Celina havia sofrido uma transformação por completo quando Guilherme admitira que ou ele ou Flávia poderiam morrer em breve e se tornara uma mulher mais humana e menos controladora e preconceituosa.

Testemunhar a mudança do filho e seu sofrimento durante os três meses de separação com Flávia havia sido o catalisador daquela metamorfose. Celina perdera as contas de quantas vezes esbarrara no filho chorando baixinho no quarto do casal, abraçado às roupas que a nora havia deixado na mansão. Porém, quando ela, revoltada, tentava criticar a decisão de Flávia de terminar o casamento, Guilherme não permitia. O médico admitia que ele havia sido o principal responsável pela dissolução de sua união e, por esse motivo, ninguém estava autorizado a falar mal de sua esposa –– porque ela ainda era sua esposa e, se dependesse dele, jamais deixaria de ser.

Celina ficara perplexa com a maturidade do filho. Nunca, durante a união com Rose, ele a impedira de criticar a ex-modelo –– nem mesmo no auge da paixão pela mãe de Antônio. Agora, por amor a Flávia, ele cortara seu desabafo pela raiz, antes mesmo de começar –– e sem alterar a voz, sem se transtornar, sem explodir, mas com uma dignidade e um respeito gigantesco à mãe de sua filha caçula. Por mais que não aprovasse a nova nora, Celina fora forçada a admitir que ela e o amor por ela haviam ajudado Guilherme a tornar-se um homem de quem qualquer mãe se orgulharia.

Já testemunhar o amadurecimento da nora e a cumplicidade de Guilherme com a esposa após o nascimento da neta caçula havia ajudado a mudar a opinião da psicanalista a respeito da aspirante a cantora. Sim, Flávia dera muitas cabeçadas na vida –– o que era direito a ela, sendo uma moça tão jovem, criada sem a presença da mãe (mesmo a mãe sendo aquela tresloucada da Paula Terrare). Mas era uma mãe dedicada e amorosa para Paulinha, e uma esposa devotada e companheira para Guilherme.

Em resumo, Flávia era tudo que Celina sempre quisera para seu filho. Como ela podia não desenvolver afeto e carinho pela jovem?

Naquela manhã, a família Monteiro Bragança, acompanhada por Paula e Ingrid, iria para o AquaRio. O aquário havia inaugurado um novo ambiente cuja construção eles haviam acompanhado com curiosidade, e, considerando o calor que estava fazendo na capital carioca, era o melhor programa para fazer com a pequena Paulinha.

Especialmente tendo em mente que, nas últimas semanas, Flávia andava sentindo tonturas e fraquezas que estavam deixando Guilherme extremamente preocupado.

Era naquilo que ele pensava quando acordou e deparou-se com a cena linda de sua esposa dormindo profundamente, com Paulinha aninhada contra ela e acomodada entre seu corpo e o de Flávia. Sempre que acordava e via sua garota abusada ao seu lado, com a filha dos dois entre eles, agradecia a Deus por ter conseguido mudar seu destino e recebido a oportunidade de viver aquela vida. A vida que sempre sonhara, ao lado da mulher por quem sempre esperara, mesmo sem saber. Mesmo sem querer.