Capítulo 2

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Analu

Pensa em uma pessoa que faz merda e multiplica por mil, essa pessoa sou eu. Juro que faço as coisas sem pensar na hora e só depois, bem depois, percebo a burrada. E para piorar a situação, a minha avó não ajuda muito, já que acabei de chegar nessa cidade e ela já me larga com um homem completamente desconhecido. Não que eu seja muito familiarizada com a dona Iolanda, afinal eu só a conheci quando ela se ofereceu para ficar com a minha guarda ou eu estaria em algum abrigo para adolescentes, mas pelo menos ela é mulher e uma senhora de idade avançada, então foi muito mais fácil eu me sentir segura na sua casa, porém a irmã dela descobriu que está com uma bactéria no estômago e precisa de apoio e cuidado, por isso que, entre me jogar para o conselho tutelar e me jogar nos braços de um traficante, minha vozinha escolheu a segunda alternativa.  Tudo deve ser melhor do que ficar sob a tutela do estado. Se a justiça não me ajudou quando eu pedi ajuda, não vão me ajudar agora que já me livrei dos meus dois piores pesadelos: minha mãe e meu pai.

Mas enfim, como eu estava falando, eu só faço merda e a última delas foi tentar tomar banho no quarto do meu tio, só que ele chegou e me flagrou de toalha e como se não pudesse ser mais constrangedor, o babaca me expulsou e agora estou lutando contra um monstro de asas que está dentro do banheiro, me impedindo de tomar um bom banho. Não que eu queira questionar as criações de Deus, mas acho a maior covardia do mundo ter dado o dom de voar para algumas baratas.

— A barata ainda tá aí dentro? - Thiago entra no banheiro sem avisos e eu tomo um susto. — O que foi? Achou que a barata tinha aprendido a abrir porta?

— Muito piadista você. - ironizo uma risada.

— Muito medrosa você. - ele zomba e eu reviro os olhos. — Calma, vou matar ela. - o homem se abaixa para pegar uma sandália e eu me desespero.

— Não! - grito e o meu tio me olha com raiva. — Não precisa matar, é um ser vivo. - vou até o quarto, abro minha mochila, pego um vidrinho transparente e volto para o banheiro. — Coloca ela aqui dentro e a solte lá fora. - ofereço a pequena vasilha e ele me olha com desdém.

— Tu tá tirando uma com a minha cara, né? Não é possível que você acha mesmo que vou fazer isso.

— Por que você mataria ela? - pergunto cruzando os braços.

— Se algo te incomoda, tu mata. Simples assim. - o machão responde e eu arqueio minha sobrancelha.

— Homens me incomodam e nem por isso eu dou uma de Rihanna.

— Tu é sapatão, né? - sua risada irônica me faz querer dar um soco nele, mas me controlo. — Logo vi que era...

— Eu não sou lésbica. Infelizmente, sou uma hétero que odeia sua orientação sexual, mas devo ter sido amaldiçoada na vida passada e por isso gosto de macho.

— Hum. - Thiago pega a sandália e vai em direção a coitada da barata, porém eu seguro seu braço antes dele cometer um assassinato.

— Não faz isso, por favor! Sério, eu fico muito mal quando vejo qualquer animal morrendo.

— Você é insuportável, garota. - ele reclama, mas pega o vidrinho e captura a monstrinha. — Essa vai ser a única vez que tento ser legal contigo. - é a última coisa que ouço da sua boca antes dele sair.

Se isso é o Thiago sendo legal, nem imagino o que vou ter que aturar pela frente nos próximos dias.

Aproveito que estou sozinha para tomar banho e dou um suspiro profundo quando sinto a água quente caindo sobre o meu corpo, aliviando todos os estresses que passei hoje.

— O que tu gosta de comer? - ouço a voz do meu tio do lado de fora do box.

— Qualquer coisa, moço. - falo um tanto intimidada por ter um homem tão próximo de mim em um momento íntimo.

— Certo. Vou colocar farinha e água na mesa pra tu. - ele fala e sai enquanto eu dou uma gargalhada nervosa torcendo para ser brincadeira.

***

Depois que eu estava de banho tomado e vestida adequadamente, fui direto para a cozinha, porque estava varada de fome e encontrei o dono da casa sentado em um banco em frente ao balcão e comendo um marmita com churrasco.

— Pedi filé de frango pra tu. - ele empurra a marmita na minha direção assim que me ver. — Só que a galinha já tá morta e não tem como colocar no vidro pra soltar lá fora, falsa protetora dos animais.

— Na minha opinião, é totalmente diferente matar um animal para se alimentar e matar um animal por diversão ou perversidade.

— Essa é a desculpa pra sua hipocrisia?

— Eu não preciso de desculpas para ser uma hipócrita assumida, porque todos nós somos um bando de hipócritas, alguns só ultrapassam os limites. - respondo já perdendo a paciência.

— Talvez a gente se dê bem. - Thiago sorri e eu o olho sem entender.

Espero que ele não esteja achando que vou vender drogas.

Sento ao lado do meu tio, pego os talheres e abro a quentinha e fico surpresa que a comida parece realmente boa.

— Obrigada por ter comprado comida para mim e desculpa o tumulto que causei. - peço sem olhar para ele e começo a comer em silêncio.

— Tranquilo, Ana Luiza. - sorrio ao ouvi-lo chamar meu nome.

— Prefiro que me chamem de Analu. - aviso.

— Eu gosto quando me chamam de gostosão. - sua voz soa com humor e não seguro minha gargalhada.

— Humildade é tudo... Tudo o que você não tem. - brinco e me sinto mais confortável na minha nova casa temporária.

Preciso fazer isso dar certo, eu estou tendo uma nova chance de viver com pessoas normais e vou me esforçar ao máximo para não perder essa oportunidade que a vida está me oferecendo.

— Tu sabe quanto tempo vai ficar aqui comigo? - ele pergunta depois de alguns minutos.

— Não tenho a mínima idéia, mas prometo tentar não incomodar.

PECADO CARNAL [degustação]Onde histórias criam vida. Descubra agora