08. Jyhad

63 14 54
                                    

— Você se lembra como se sentiu quando matou a primeira pessoa? — o loiro perguntou.

Deitados na cama grande, Hueningkai encarava o teto refletindo sobre os últimos acontecimentos. Já se encontrava mais calmo, mas a culpa ainda era grande. Soobin apenas o observava, acariciando os ombros, o colo e o braço desnudo, admirando a pele tão clara quanto a própria marcada pelas mordidas que não conteve. Ele parecia ainda mais belo.

— Lembro que me senti perdido, angustiado, assustado. Lembro os nomes dos sentimentos, mas não lembro exatamente da sensação — Hueningkai o fitou curioso, sem entender como era possível que ele não lembrasse como sentir tudo aquilo.

— Já faz tanto tempo, eu vivi anos demais. Huening. Quando se vive demais algumas coisas se tornam borrões, outras param de ter importância, não fazem mais sentido ou deixam de ter o peso ético que os humanos carregam. Muito do que os humanos acreditam é baseado em princípios, mas quando você tem séculos de vida e já viu de tudo os princípios caem por terra. Principalmente quando dentro de você existe uma besta louca por sangue.

O loiro mastigou o lábio inferior, refletindo sobre o que lhe fora dito, mas ainda descrente com toda a conformidade que Soobin apresentava em relação a não vida.

— Devia existir alguma forma de controlar a besta.

— Existe. É isso que fazemos aqui, por isso temos rebanhos, por isso não caçamos como vampiros solitários. É mais seguro.

— Não pareceu tão seguro hoje, não quando matei aquela garota — constatou, a lembrança do sangue em seu paladar se misturando a imagem do corpo sem vida em seus braços.

— Huening, a segurança não é para eles, é para nós. Nós temos um acordo entre clãs, estamos sob supervisão de algo maior, algo que chamamos de Camarilla. Não somos apenas nós, mas vários clãs pelo mundo. Somos adeptos da Máscara que esconde a existência de seres como nós.

"Não existe sentido em dominar e se expor. A última coisa que desejamos é causar conflito com humanos, queremos viver nas sombras. Temos sim acordos com humanos como você mesmo sabe, nos rebanhos, mas também com aqueles que são considerados de fato 'importantes'. Por isso quando vampiros rebeldes passam a chamar muita atenção é meu dever como Príncipe deste distrito interromper as ações que poderiam causar pânico e tornar pública nossa existência. Nós queremos que os humanos acreditem que somos apenas histórias fantasiosas de horror."

— Por quê?

— Se houvesse algum tipo de guerra nós acabaríamos matando os humanos, mas nós precisamos deles. Sem humanos não somos capazes de nos alimentar. Além do mais, o mundo seria chato se fosse habitado só por vampiros. Nossa raça tem um incrível complexo de superioridade, acabaríamos nos matando em busca de provar quem é o melhor e eu reconheço isso.

Novamente um misto de sentimentos invadiu a mente do recém nascido, a confirmação de que humanos serviam apenas como alimento o lembrando que há pouco tempo atrás aquela também era sua única serventia aos olhos do rapaz ao seu lado. Se perguntava o porquê ele tinha lhe transformado se era apenas alimento. Nunca obteve tal resposta.

— Então é por isso que protegem os humanos? Por que eles são comida? — Soobin suspirou e sorriu, afastando alguns fios do rosto do rapaz.

— Humanos são para nós tal qual gado é para eles. Precisamos de alimento, por isso os "cultivamos".

Odiava aquilo. Apesar do prazer momentâneo a ação em si ainda lhe era desprezível, mas infelizmente descobriu da pior forma que o único jeito de controlar sua fome era se alimentar regularmente.

Sob a Máscara da Camarilla • csb + hnkOnde histórias criam vida. Descubra agora