Madden Fairfax
UM ANO DEPOIS:
— Esse lugar é horrível — reclamei, olhando ao redor. — Temos mesmo que nos mudar?
— Sim — garantiu meu pai, sem estender a conversa. — Vai se acostumar com a Carolina, filho, e aqui tem praias também.
Revirei os olhos. Sim, eu sabia que tinha praias na Carolina do Sul. Já havia, inclusive, surfado em uma delas. Mas era tão entediante.
— Não é como em Sydney — declarei.
— Terá que se adaptar, Madden — concluiu com uma certa frieza, mas eu sabia que era apenas pose.
Ele sentiria tanta falta quanto eu.
— O que tem lá que não tem aqui?
— Cangurus — mencionei, ele franziu o cenho, rindo. — Qual é? Eu estava tentando adestrar aquele que apareceu no nosso quintal mês passado. Estava quase conseguindo se...
— Palhaço — interrompeu-me. — Fala sério, Madden. Você pode recomeçar sua vida aqui. Sem tantos conflitos dessa vez. Quem sabe um pouco de paz? Isso pode te fazer bem e acalmar os nervos da sua pobre mãe.
Foi minha vez de rir.
— Só brigo por causas justas — justifiquei-me. — Além disso tem o Perry.
— Quem é Perry?
— Ornitorrinco. Você não lembra dele? Eu o alimentei. Ficamos amigos... eu teria adotado ele. Tínhamos planos para o futuro — o olhar do meu pai era de riso e espanto, mas ainda não parecia achar isso um bom motivo para ficar na Austrália. — Não acredito que não se lembra do Perry.
— Aquele bicho é venenoso — reclamou ele, totalmente abismado. — E você nem sabe se é sempre o Perry que aparece por lá, pode ser que sejam outros e você esteja sendo feito de idiota por um grupo de ornitorrincos — enfatizou, rindo enquanto digitava. — Tem alguém especial?
Foi minha vez de encará-lo com surpresa. Talvez ele não conhecesse tão bem o próprio filho. Ou era apenas uma tentativa de mostrar que não há nada que me prenda em Sydney. A verdade é que não tinha mesmo. Mas era uma cidade grande, uma metrópole. Arranha céus por toda parte, uma natureza selvagem, ondas perfeitas, mulheres bronzeadas, sol o ano todo. Lá eu me sentia livre. Tinha o que fazer, o que explorar, lugares para ir, meninas por toda parte e escolas legais.
O que tinha em Greenport? Nada. Escolas caretas. Ondas medíocres. Gente pálida. Animais comuns. Praias rasas. Provavelmente eu estava encarando tudo aquilo com preconceito? Sim, mas ali não era meu país. De qualquer modo, todos sabem que Madden Fairfax gosta de mudanças, mas poderiam ter nos mandado para um lugar melhor.
— Tem a Anna — contei, ganhando a atenção dele. — E a Brittany, a Mika, Alisson, Thay, Melissa...
— Já entendi — interrompeu minha listagem. — Você não sossega nunca.
— Sossegar para que? Você sabe que sou uma alma livre — brinquei, apesar de estar chateado. — E eu gostava muito delas, ok?
— Sei do que você gostava, Madden — zombou revirando os olhos. — Um dia uma garota vai quebrar seu coração. E eu vou rir — previu com ar descontraído.
— Sabe, dizem que não tenho um.
— Você tem, querido, acredite. Todos temos um — bateu a mão em meu ombro, como se me entendesse. — É aqui, obrigado — sinalizou para o motorista. — Vamos lá?
Descemos do carro, a visão me tirou um pouco do fôlego, o monumento parecia desproporcional à cidade. Era como encontrar um Botticelli original em uma galeria de esquina. Eu e meu pai nos entreolhamos, perplexos com a escolha arquitetônica, uma mistura de templo grego e universidade clássica. Não poderia negar a beleza, aquilo parecia uma imensa obra de arte. Não se encaixava, no entanto. Nossos passos eram hesitantes, aquele terreno imenso era intimidante. Ainda mais com todo aquele pessoal uniformizado, andando de um lado para o outro, agindo com mais profissionalismo do que no escritório de engenharia onde meu pai trabalhava.
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Free Soul
RomanceMadden Fairfax tinha certeza de que tinha um pouco do oceano dentro de si, era expansivo, irreverente, perigoso para alguns e deliciosamente atraente para outros. Quem ele era? Depende de quem respondesse. A superfície rasa pertencia a tudo e a todo...