Ela exclamou, visivelmente chocada ao deparar-se com duas crianças encharcadas e trêmulas.

- Nós estavamos brincando no lago das águas dançantes, senhora Allanane - Apollo respondeu, numa meio verdade.

- Bem, entrem, entrem! Não fiquem parados aí, por favor - insistiu ela, com uma voz repleta de calor e apressamento. Com gestos gentis, Adulária conduziu os dois até a velha lareira de pedras que dominava o centro da modesta sala de Ayla.

O crepitar das chamas parecia saudá-los com um abraço acolhedor quando ajoelharam-se diante da lareira, suas mãos trêmulas encontrando o tão necessitado alívio do frio que parecia congelar seus corpos.

Enquanto eles se deixaram envolver pelo calor reconfortante, Adulária rapidamente providenciou cobertores quentes, cuja maciez era um contraponto confortável para a rudeza do frio. Em seguida, ela também trouxera dois copos de Goritch-quente e biscoitinhos de baunilha que a mesma havia acabado de desenformar-los.

O aroma delicioso encheu o olfato daquelas crianças.

- Obrigada mamãe - Ayla dirigiu-se à sua mãe quando ela a serviu, em seguida, sua mãe voltou-se para Apollo, servindo-o também, como alguém que aprecia a companhia do amigo de sua filha.

- Aqui, filho - ofereceu a senhora Allanane o prato de biscoitos e a bebida, demonstrando sua gentileza e hospitalidade. Ele, em resposta, expressou sua gratidão com respeito e educação:

- Muito obrigado, senhora Allanane.

O garoto saboreou com gosto,imerso na delicia, lambendo os lábios sujos da bebida feita com café e cacau.

Após o lanche reconfortante e conversas junto à lareira com Aysha e sua mãe, ele ergueu-se, desprendendo-se do calor acolhedor que envolvia a sala. Pois a noite, a cúmplice silenciosa, já se estendia em sua escuridão máxima, recordando-lhe a urgência de retornar ao seu lar. O relógio implacável marcava as oito da noite, indicando que a hora de buscar seus irmãos na casa da senhora Enayla Eliek, se aproximava.

- Obrigado novamente pela hospitalidade, Mrs. Allanane - disse ele - Agora necessito ir para meus irmãos.

- Deus o acompanhe, filho - disse a mulher, entregando-lhe um pacote contendo doces e especiarias feitos por ela. Aquele gesto simbolizava mais do que gentileza.

- Aqui, para vós e seus irmãos - era um presente que continha o cuidado e a dedicação de uma mãe. O menino então agradeceu.

- Obrigado.

- Até logo,Apollo - Ayla se despediu do garoto num sorriso.

- Até, Ayla - respondeu, ao sair pela porta, embarcando numa jornada noturna, onde a escuridão se tornava sua aliada.

Então, cauteloso, desliza pelas sombras, mergulhando na noite. Seus passos ecoavam no silêncio noturno enquanto as estrelas cintilavam como joias perdidas no vasto firmamento. A brisa noturna sussurrava segredos entre as folhas das árvores, criando uma sinfonia suave que o envolvia enquanto atravessava a ruela escura.

De repente, lamparinas dançantes pela escuridão revelaram três homens mascarados, segurando baús reluzentes.

A penumbra acaricia Apollo enquanto por instinto ele se esconde próximo a um latão de lixo, seu coração pulsando no compasso dos segredos noturnos.

Os mascarados avançam ao beco, as lanternas esculpindo as danças das sombras.

Imóvel, ele observa intrigado, quando um quarto homem, com máscara incrustada em esmeraldas, emerge da escuridão. Um murmúrio ouviu-se entre eles, e os baús se abriram, revelando seus segredos mais sombrios.

O líder vira o conteúdo do mesmo ao chão, soltando uma gargalhada perversa. Seus olhos flamejavam como fogo, e sua face mascarada cintilava com o brilho que emergia das joias irradiantes que continha naquele baú. Um diamante captura sua atenção, e começou a olhá-lo fixamente.

- Hum... Este aqui - proferiu, a voz densa e glacial, murmurando palavras que ressoam como o crepitar de uma fogueira sinistra. Ele seleciona a gema com precisão, depositando-a com reverência em uma bandeja estendida por um de seus homens. Em seguida, uma pulseira de diamante negro, envolta em prata, junta-se à seleção, revelando a meticulosidade da escolha.

Entretanto, o garoto oculto, observando de seu esconderijo, percebe que a partida dos malfeitores não parece ser iminente, e o menino precisava chegar até em casa o quanto antes, mas o esmeraldas estava mergulhado na avaliação das joias.

O homem examina um colar esculpido em girassóis com uma expressão indiferente. Sua decisão é rápida e impiedosa, descartando a jóia longe com um gesto desdenhoso, como se a beleza não alcançasse seus padrões de valor.

- Devolvam todas as jóias a Lionel, rapazes - as palavras dele ecoaram como um decreto sombrio, instruindo os capangas a devolverem as jóias a um tal de Lionel. Seu comando ressoava com uma autoridade inquestionável, permeada pela certeza de que a barganha estava longe de ser encerrada.

- Informem ao mesmo que não aceitarei a oferta a menos que dê-me algo digno em honra do tratado que temos - declarou com uma serenidade que contrastava com a ganância que emanava de suas ações. A exigência não era apenas uma questão de posse material, mas sim um jogo de influência e reciprocidade entre aqueles que compartilhavam alianças e compromissos obscuros.

Por fim, o homem deixara a ruela, os homens, sob seu comando, apressam-se a recolher todas as jóias antes de o seguirem.

Sendo assim cautelosamente, Apollo pôde sair de seu esconderijo, onde por momentos se ocultara como uma testemunha silente dos acontecimentos noturnos.

Seus olhos pousaram rapidamente no colar de girassóis esculpidos, abandonado no chão. Era pingente de beleza notável,porque joga-lo fora? Ele se perguntava.

Então com reverência, Apollo recolheu o colar, sentindo a textura das pétalas esculpidas em suas mãos. Assim, com o colar cuidadosamente resgatado, Apollo traçou seu caminho na penumbra da noite em direção à sua casa.

***

O sol alaranjado de outono raiava nas grandes montanhas ao redor da cidade de Otrinia. Seus raios penetravam pela janela, acordando um garoto sonolento de onze anos para mais um dia de labuta. Com olhos pesados, levantou-se após uma noite de escasso sono, suas olheiras, eram testemunhas do cansaço.

Ele espreguiçou-se, consciente da responsabilidade de acordar os irmãos para a escola. Antes de envolver-se nas vestes do novo dia, notou uma pedra que estava em seu bolso,fruto de seu trabalho da noite anterior.

A pedra lunar, outrora uma figura pouco retangular marcada por fragmentos incinerados, agora repousava em sua palma como uma obra-prima em forma oval. E sua superfície polida cintilava de brancura.

Com a pedra segura em seu bolso novamente, Apollo adentrou o quarto onde duas crianças de seis anos ainda se encontravam imersas nos mundos e reinos oníricos.

- Laurel, Dain, levantem-se - instigou Apollo, abrindo as janelas para revelar os raios dourados da manhã.

- Vamos hora de acordar.

- Hum, o que? - a menina de cabelos loiros murmurou, sonolenta e bocejou.

- Aula Laurel, a senhora Allanane já vos aguardam - respondeu ele puxando os cobertores de Dain para acordá-lo.

- Vamos,Lau,acorde-o. O café sairá em três minutos - disse Apollo à irmã e se retirou do quarto.

A menina ainda ensonada,aproximou-se do irmão gêmeo começando a sacoleja-lo.

- Dain,acorde... Vamos logo,Dain!

O menino acordou subitamente com os gritos de sua irmã.

- Ah, o que é que foi? - perguntou exasperado.

- Levante-se, rápido! - ela puxava ele pelo braço.

- Laurel, Dain, o café está pronto! - Chamou o irmão mais velho. Os mais novos se entreolharam,e saíram em disparada em direção a cozinha.

A Pedra da lua e o Girassol (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora