Prólogo

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França — 15 de fevereiro de 1462

As pessoas saíram como avalanches pelas ruas ladeadas de pedras enegrecidas pelo tempo. Havia terminado, ele sabia. De maneira furtiva, tentou ouvir o veredicto. Ainda não era hora de sair da toca. "Morte às bruxas" era o que a maioria dizia aos gritos. Condenadas, deduziu enquanto pensava no que poderia fazer. Não podia abandoná-la naquele momento tão difícil.

Espiou pela fresta na madeira e, apesar da parca iluminação do Sol já se pondo, pôde ver as mulheres acorrentadas sendo levadas à força pelas ruas de Cannes. Elas estavam sendo escoltadas pelos carrascos da Inquisição, que tinham tochas flamejantes em mãos. Naquele momento, elas serviam para iluminar o trajeto enquanto o cortejo vinha logo atrás, mas ele sabia que posteriormente serviriam para acender as piras. Estavam somente três... Faltava uma! Os aldeãos estavam delirando de felicidade. "Que bando de ignorantes", pensou. Tinha que ser rápido, pois não demoraria muito para que a sentença fosse executada. Sabia que teria mais de sua espécie por ali, espreitando-as. Precisava encontrá-la!

Quando a procissão passou, ele começou a mover-se lentamente e sem fazer barulhos para não chamar a atenção. Sempre pelas sombras. Não podia ser visto. Em meio à multidão, avistou um rosto bastante familiar. O jovem monge andava com seu capuz sobre a cabeça. Na mão, uma cruz de madeira que segurava tremendo. O horror estava estampado em sua face.

— Bernard! Bernard, aqui! — sussurrou quando o rapaz passou próximo de onde estava. Não ia junto da multidão, tinha ficado um pouco atrás do cortejo. Quando o jovem reconheceu o dono da voz, soltou um suspiro de pavor, mas não recuou. Na verdade, olhou para os lados e se aproximou dele, entrando sorrateiramente naquele beco escuro.

— Jesus seja louvado! Ainda bem que apareceu! Uma calamidade, meu bom amigo, condenaram todas! — sentiu uma chama acender dentro de seu peito morto. Não podia ser verdade. Ela não podia ser queimada viva.

— Todas? — perguntou bestificado.

Bernard confirmou com a cabeça.

A ideia de perdê-la daquela forma era insuportável. Desde que a irmã Angéle fora encontrada morta e com o corpo desprovido de sangue, a inquisição começou a persegui-las atrás de provas para incriminá-las. Ele sabia o que havia acontecido a Angéle e agora sabia o que iria acontecer a sua pequena caso não interferisse.

— Onde está a senhorita Jeanne? — perguntou.

— Não estava no julgamento. A senhora Odette não permitiu que ela comparecesse, mas as senhoritas Viviane e Aimée estavam e saíram acorrentadas. Provavelmente irão buscar a senhorita Jeanne em sua residência. — A voz de Bernard soava triste. De fato aquilo era um absurdo. — Irão queimá-las, Gerard! Queimá-las vivas!

— Não posso permitir que eles cometam tal atrocidade com Jeanne! — proferiu, cerrando os dentes. Sentia a garganta arder. Estava agitado e isso lhe provocava sede.

— Então sugiro que seja rápido. Elas foram condenadas por bruxaria e nesses casos a execução é imediata. Pobres mulheres! — A lamentação do jovem monge não lhe parecia muito convincente, afinal ele fazia parte daquele circo.

Gerard sabia que elas eram realmente bruxas, mas tinha a certeza de que jamais fizeram nada de mal. Por tudo o que presenciou na companhia delas, não havia dúvidas de que eram boas. O único pecado que cometeram foi nascer pertencendo a uma linhagem antiga e que muito recentemente era cobiçada pelos seres da noite por conta de uma descoberta magnífica. Elas eram as escolhidas. O sangue da linhagem era tão poderoso que, usado da maneira correta, poderia permitir a um ser da noite o dom de sair à luz do sol sem se ferir.

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