Luzes da primavera

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Ainda de mãos dadas, olhavam o céu adquirir um tom de azul profundo e as estrelas começando a brilhar. A cidade inteira estava iluminada e o castelo parecia reluzir à luz da lua.

Kelvin ajustou sua coroa de flores, de vez em quando esticando o pescoço para ver se as luzes começaram. Ramiro riu um pouco da afobação, segurando delicadamente seu pulso, o trazendo para mais perto.

— Kevinho, se sente aqui. As luzes ainda vão demorar um pouquinho, mas já já começa. A lua já está alta no céu.

O jovem bufou com impaciência, mas obedeceu, sentando-se de frente a Ramiro, olhando para o céu com um olhar sonhador. O cacheado seguiu o exemplo, inclinando-se, apoiando os cotovelos nos joelhos ao tentar recordar-se das constelações que seus colegas do orfanato o mostravam, mas não conseguiu recordar de nenhuma além das clássicas.

Sem perceber, o loirinho também se inclinou, apoiando o queixo nas duas mãos enquanto pensava que, por mais que estivessem mais apagadas ali do que na floresta, as estrelas estavam mais lindas do que lembrava.

— Eu fico pensando como eu passei tantos dias preso lá naquela casa, vendo só aquele pedacinho de mundo e me contentando. Tantos dias olhando a janela, vendo uma luz aqui e ali e só pensando de onde elas vinham. Como tentei não ver? Você nunca deve ter sentido essa sensação, mas entende, não é?

— Posso não entender o que é ser preso do mesmo jeito que você porque sempre fui livre, mas eu entendo o que é sonhar acordado, achar que está vivendo a vida em vão, apenas sobrevivendo. Acho que, de alguma forma, são prisões diferentes, não?

— Sim. — Kelvin concordou com um sorriso triste — Mas agora eu sinto que estou onde devo estar. Consigo ver um futuro à minha frente, longe de lá. Fico muito feliz por finalmente me sentir livre. Tudo isso graças a...

Os dois desceram o olhar ao mesmo tempo, percebendo a proximidade de seus rostos. A penumbra da noite não era um empecilho muito grande quando se trata de perceber os olhares diferenciados. Ramiro olhava para o loirinho como se fosse um diamante, admirando cada detalhe daquele rosto quase perfeito. Os olhos grandes o admiravam de volta, com um brilho diferente.

Kelvin sentiu as bochechas esquentarem. Os olhos viajavam pelos traços rústicos do homem à sua frente. Sentia um calor estranho, uma tentação que o fazia olhar diretamente para a boca envolta pela barba. Borboletas começaram a voar em seu estômago e ele teve a súbita curiosidade de saber se aqueles lábios eram tão macios quanto pareciam.

Envergonhados, desviaram o olhar, mas as mãos se alcançaram timidamente, dedilhando todo o caminho de madeira antes das pontas dos dedos se encontrarem. Ramiro virou a palma da mão e o loiro abrigou a sua lá dentro, percebendo o quão pequena era a sua.

Kelvin subiu o olhar novamente, os lábios entreabertos, mas logo viu uma lanterna subir ao céu. Largou a mão que o abrigava e foi até a extremidade do barco, o agitando um pouco. Ele abriu um sorriso em expectativa, os olhos brilhando ao ver as luzes começando a subir ao céu noturno.

Uma atmosfera linda começou a se formar, acompanhada da paisagem daquelas lanternas unidas em um único propósito, parecendo estrelas. Kelvin estava emocionado por ver aquilo pessoalmente, depois de dezoito primaveras esperando. Afinal, hoje era o seu aniversário.

Ele não se lembrava disso até aquele momento, mas não se importava. Qual a melhor maneira de passar aquela data especial, senão realizando seu sonho de infância? Conquistando sua liberdade? Acompanhando do seu primeiro amigo, depois de Pascal.

— Olha, Ramiro! — Ele exclamou com uma animação que mal conseguia conter dentro de si, virando-se para olhar para o amigo, ofegou em surpresa.

O cacheado tinha duas lanternas já acesas, prontas para serem lançadas.

Luzes da Primavera (Kelmiro AU) Onde histórias criam vida. Descubra agora