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A porta foi tocada e João não ouvira. Mais uma batida. A pessoa do lado de fora provavelmente estava inquieta. A mão que batera a porta cessou seu movimento, entrementes, João não percebera, uma vez que não ouviu o som de nenhum toque – o que o adolescente perceberia era o envelope preto deixado embaixo da porta. De uma forma não tão aleatória assim, João, que possuía um nome comum embora desprovido de nome composto, seria surpreendido no dia seguinte, pois, fora um dos convidados da festa de Joana. Caso ele resolvesse ir à festa, poderia descobrir o que João e Joana tinham em comum, além de versões semelhantes de seus nomes.

João conhecia pouco Joana, sabia que ela era de origem chinesa e brasileira, aprendeu português em Macau com sua avó, mas morava em Gansu. Quando chegou ao Brasil, resolvera fazer algumas aulas particulares, já que sua mãe, apesar de brasileira, só falava chinês com ela e o português que aprendera era um pouco distinto da Língua Portuguesa, de forma que sua professora alegara ser Língua Brasileira. Joana era reservada, estava há quatro meses no Brasil, falava apenas quando lhe dirigiam a palavra. Certa vez, João observou a moça comendo sozinha no pátio, quase falou com ela neste dia, mas se conteve, sua insegurança de como seria a reação da chinesa-brasileira o impediu.

Exatamente por ser uma pessoa, aparentemente, introvertida, e por nunca ter visto a garota socializando, João se sentiu atônito ao encontrar um convite da jovem na manhã seguinte debaixo de sua porta – de modo que conseguira aturdir o garoto com um simples gesto, pois, além de ser Joana, a dona da festa, a temática envolvia morte, uma adaptação do dia dos finados chinês no Brasil. Não sabia exatamente o que era mais surpreendente, o que percebeu era uma grande necessidade de adjetivos e/ou novas palavras para representar o que ele sentiu ao abrir o envelope preto.

A Volta dos que (não) foram.Onde histórias criam vida. Descubra agora