01. No topo da lista

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VANTE

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VANTE

Contei os 32 comprimidos que restaram no espelho do banheiro, não sei porque sempre venho conferir, já fazem dois meses desde que minha mãe morreu, mas eu ainda acho que a quantidade vai diminuir sempre que conto. Minha psicóloga disse que é a fase da negação, mas eu nunca neguei que minha mãe foi levada pelo câncer, acho que seja só uma forma de me sentir próximo dela, com o resto de comprimidos de dor muscular guardado no espelho do banheiro. Joguei todos os outros fora, mas eu comprei esse tantas vezes no mês que me sinto apegado.

  Do outro lado da casa o alarme toca mais uma vez, reviro os olhos mesmo sendo a terceira vez que deixo no modo soneca. Guardo o remédio e me vejo no reflexo do espelho, talvez eu devesse pentear meu cabelo, ou aprender a usar uma gravata sem ser aberta ao redor do pescoço. O silêncio me acompanha até a porta da frente do meu apartamento, pelo visto tive sorte hoje, quase sempre a síndica vem cobrar o aluguel, ou mandar eu arrumar um emprego, mesmo eu sempre dizendo que trabalho a mais de dois anos, talvez seja a idade, mamãe sempre disse que ela distorcia tudo que os inquilinos falavam, chegou a expulsar o morador do 134 por chamar ela de vadia gorda, mas eu tenho quase certeza que não foi isso, nunca vou entender o porque dele não ter processado ela.

O porteiro me deseja um bom dia logo depois de tragar seu cigarro. Na parada tinham sempre as mesmas pessoas a espera do ônibus para o trabalho. Pego meus fones da bolsa e conecto no celular, a primeira música do modo aleatório a tocar é With a Smile, não sei o que é sorrir a alguns anos, um de verdade, acho que não sei mais fazer isso. O ônibus para e subo, sentando no fundo e encarando o prédio onde moro, cor marrom e paredes desgastadas, se dissipar da minha visão, agora eu enxergava o verde dos meus olhos no reflexo opaco da janela, odeio ir pra escola em dias nublados.

Jace, o cobrador, me acorda para avisar que cheguei no ponto, no início eu odiava ser acordado e ele odiava me acordar, ainda odeio, mas ele descobriu que eu era um garoto pobre órfão a um mês, a pena dele me faz não perder o primeiro horário de aula desde então. Eu não reclamaria de perder aula de álgebra, jogo minha mochila na mesa e deito a cabeça por cima antes do professor chegar, isso me polpa de ouvir reclamações. Assim que começo a sonhar, abro os olhos com o som de um estrondo, ainda estou com o rosto deitado, tentando assimiliar quando vejo Sr. Peter, o diretor, com a mão no rosto e o professor claramente estressado olhando pra algum ponto fixo, tal ponto que sigo até um garoto encostado na parede próximo a porta, ainda com a mochila apoiada em um dos ombros, sorrindo desinteressado.

— Seu pai não liberou sua matrícula aqui. — Sr. Peter diz, com a voz cansada.

O moreno continua na parede, agora com os braços cruzados, não percebi quando me encarou, pisco algumas vezes ainda sonolento, e então outro estrondo, ou meu ouvido estava sensível de tanta música no volume alto. Um homem bem vestido entra na sala, agora o garoto não olhava mais pra mim, e sim ao recém chegado, seu sorriso sumiu. Ficaram se encarando por poucos segundos até o homem apontar para fora.

Sem tempo pro amorOnde histórias criam vida. Descubra agora