Cap. 5 - Das gargalhadas a Aflição

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No colégio estava o maior alvoroço, pois uma mendiga havia quebrado o vidro da janela ao tentar entrar em uma sala do primeiro andar. Faltava água em algumas instalações sanitárias, então fomos dispensados da aula de Educação Física. Porém, as outras aulas permaneceram normais.

As garotas estavam eufóricas, por uma razão que não se resumia em falta de água, nem mesmo pela vidraça quebrada por uma mendiga. Dali a alguns dias aconteceria o show de uma banda pop britânica famosa que estava em turnê pela cidade. No auge da fama, conseguir um ingresso se tornaria um sonho distante e quase impossível. Vender outra joia seria uma verdadeira loucura.

Norma ocupava um lado da parede mais próxima da sua cama, com os pôsteres dos rapazes famosos. Ela não sabia sobre da turnê, pois ainda não tinha comentado nada a respeito.

Sentada na meia parede que separava o refeitório da quadra de vôlei, eu observava a confusão das meninas disputando o orelhão, quando uma delas me gritou:

- Ei, Judith!

E continuou:

- Judiiiiiith! Vem aqui! Não quer também tentar a sorte de ganhar um ingresso da rádio para o show?

A rádio sempre fazia essas promoções quando vinha alguém famoso em Linópolis. Levando em conta o grande número de ligações, a chance de ganhar um ingresso através do sorteio era bem remota. Encontrar orelhões vazios era quase impossível, eram muito disputados pelas frenéticas da nossa cidade. Existia um grupo de pessoas que atendiam as ligações dentro da rádio, mesmo assim, na maioria das vezes o telefone ficava ocupado.

Novamente a garota me chamou e se aproximou de mim:

- Judith, liga lá e dá o seu nome. Sei que não se importa, mas já imaginou se você ganhasse um par de ingressos? Você poderia dar para mim!

Zoé era muito insistente, muito parecida com Norma. Ela simplesmente jogou sua mochila no chão e sentou em cima dela, continuando a falar:

- Judith, estudamos na mesma turma até o ano passado não foi?

E continuou:

- Nunca fomos amigas, mas também nunca tive nada contra você!

O silêncio continuou por alguns minutos entre nós, enquanto no meio daquele movimento em volta do orelhão, alguém falava em voz alta quando era atendida por alguém do outro lado da linha: POR FAVOR, REALIZE O MEU SONHO! QUERO MUITO IR NESTE SHOW!

Então Zoé voltou a me importunar:

- Você está me ouvindo?

- Claro. Só não estou associando o que tem a ver o tempo estudando na mesma classe com os ingressos da promoção.

Devagar, Zoé foi se colocando de pé, e me olhou meio desconcertada quando disse:

- Judith, eu queria te fazer uma pergunta.

Eu estava sentada, com os braços entrelaçados nas minhas pernas, o queixo apoiado no meu joelho esquerdo, e meus pensamentos vagando naquele miserável apartamento.

Neste horário, Norma estaria preparando mamadeiras ou fazendo malabarismos para multiplicar algo para eles comerem. Dinorá provavelmente estaria sentada na cadeira com Ariel, inquieta e presa entre suas pernas, enquanto tentava fazer um penteado. O papai estaria dormindo, como todos os dias. Foi quando alguém me cutucou.

- Oiiiiii, Judith! Estou falando há um tempão e você está voando, nem sabe o que eu disse.

E ela continuou:

- Sei que não ouviu, ou estaria confirmando, ou dando uma bronca. Se não fez nenhum dos dois, foi porque nem prestou atenção no que eu disse.

Zoé, não se calava. Tive vontade de pegá-la pelos cabelos e jogar-la do outro lado do orelhão, só assim me deixaria em paz.

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