LEGADO DO PODER | CAOS (VOL. 1)

2 | AMEAÇA

A carruagem esperava pela princesa do lado de fora do Palácio da Luz ainda ao amanhecer. Na bagagem apenas algumas roupas, comida e ouro. A neve caía como de costume, mas Aurora estava esperançosa. Pouco antes de partir, a princesa abraçou seus pais e guardou sua espada na bainha.

Caleb esperava por ela do lado de fora, os cabelos grisalhos, caindo em seus ombros, se misturavam aos flocos de neve que chegavam do céu, os olhos cor de avelã piscavam lentamente, suas roupas eram grossas feitas de pele de raposa e usava botas de couro e luvas. Aurora se contentava apenas com uma calça de algodão, camisa branca e corset preto. Os cabelos dourados cintilavam sobre o branco da neve e estavam perfeitamente alinhados em uma trança lateral, que corria sobre seus ombros e terminava no quadril.

— Tudo pronto? — Caleb estava com a voz mais rouca do que o normal naquela manhã.

— Sim — a princesa afirmou.

— Chegaremos em Astraluna logo após o anoitecer, se tudo correr bem. — Caleb parecia preocupado.

— Correrá.

Aurora estava segura e confiante. A viagem até o reino vizinho era promissora, mas a ansiedade dominava seu coração, pois nunca estivera em solo sagrado lunar. O soldado e a princesa entraram na carruagem e seguiram viagem.

No caminho a neve dificultava a passagem dos cavalos e o vento tornava a situação mais inquietante. As árvores secas pareciam resistir bem ao frio, mas não era incomum encontrar algumas delas caídas pela estrada, em consequência da forte ventania. O céu nublado permitia pouca incidência solar, mas a princesa aproveitava cada flash de luz para se fortalecer.

Desde a infância, a princesa gostava de passar muito tempo do lado de fora do castelo, perambulando pelos jardins e pomares. Aurora, assim como o seu pai, era uma herdeira do Deus Sol, os escolhidos para portar a magia do astro rei na terra. Seus poderes de manipulação solar iam muito além do controle da luz ou cura, ela podia fazer coisas tão impressionantes que nem a própria princesa conseguia acreditar.

Quando atingiu a idade de seis anos, passou a frequentar a abadia, um santuário sagrado onde todas as crianças especiais poderiam aprender e aperfeiçoar suas habilidades. Assim como elas, muitas crianças eram agraciadas com a magia do Sol no reino de Solarium, mas suas habilidades eram mais restritas. Para os magos comuns, apenas alguns encantamentos eram possíveis, mas para os herdeiros diretos, pouquíssimos limites foram estabelecidos. Assim, o povo de Solarium se dividia em três: os herdeiros, os magos comuns e os humanos.

Aurora sabia muito pouco sobre Astraluna, mas assim como o Deus Sol criou filhos na terra, a Deusa Lua também deu habilidades especiais às suas criações. Eles eram capazes de manipular qualquer coisa que fosse afetada pela energia do astro da noite e, assim como em Solarium, os herdeiros diretos da Deusa governavam sobre os magos comuns e humanos.

A princesa piscou algumas vezes enquanto fitava o céu, como se tentasse, de alguma forma, extrair a energia da sua fonte de magia para se fortalecer. Desde que curara aquela menina no vilarejo, Aurora sentia-se fraca e nauseada, pois não conseguia recarregar o seu nível de magia ao habitual. Para os herdeiros e magos comuns, a força vital mágica que corria em suas veias era mais importante do que o sangue e o próprio oxigênio, ficar com a mana baixa poderia causar-lhes a morte.

No canto de sua visão, a princesa pôde ver Caleb, que lançou um olhar preocupado sobre ela.

— Estou quase ouvindo os seus pensamentos. — Ela sorriu quando seus olhos amarelos encontraram os do homem.

— Como está se sentindo? — O tom paterno de Caleb lhe causava leve irritação.

— Bem, melhor do que nunca — respondeu Aurora.