2 - Hanau

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hanau

(ha·nau)

substantivo feminino havaiano

1. Significa renascimento.

2. Renovar.

3. Nascer para a vida e para o novo.

6 meses depois.

Levava uma vida sossegada — bem, na medida que a grande São Paulo permitia. São meus quase 32 anos, minha juventude tardia, minha vontade de fazer acontecer em uma das maiores cidades do mundo. Estava vivendo em meio aos meus passos largos e curtos, sem me preocupar muito.

E o que importa pra mim é que você que vê isso de fora, saiba de algumas coisas sobre mim: Eu sou urbana, gosto de botas altas, bebo muito martini e vinho, amo arquitetura. Eu também amo gatos, amo cultura — amo minha cultura. Amo ser de escorpião, não sou chegada às pessoas, não paro muito tempo num relacionamento só. Gosto de sorvete de limão, borda de pizza do meu Babbo, amo misturar o italiano com o português, amo ler Virginia Wolf e amo escutar The Cranberries. As minhas unhas sempre estão em tons de negro, e nos meus olhos... eu não dispenso uma maquiagem forte nos meus olhos.

Eu também amo a minha prima Alê, amo a Bru, o Rei, a Flavinha e meu prinhado Marquinhos. Eu gostava do meu ex Michael, mas só gostava. Acho que nunca amei ninguém, no sentido romântico da coisa. Mas eu adoro flertar. Adoro sexo também, mas a burocracia é absurda. Eu adoro ir num pub, amo viajar. Sou São Paulina em São Paulo, Cruzeirense em Minas. Eu gosto de ligações longas com meu Babbo, embora já soubesse de todas as pautas que ele ia me trazer. Número 7 é meu número da sorte, número da perfeição. Às vezes sigo o budismo, mas eu sou muito irritada pra ter uma religião certa. Detesto intromissão. Gosto do meu espaço pessoal. Eu sou livre, e tem muito disso de mulher livre ser tida como perdida pelo mundo, mas honestamente, não tô nem aí — eu não precisava ouvir do meu pai que eu era ovelha branca em pele de ovelha negra, porque eu sabia bem disso.

Essa decisão de retornar, ressurgir, renascer... não foi do dia pra noite. Eu saí de Monte Verde com 16, cheia de medo, cheia de esperança, com vontade de fazer acontecer. São Paulo não foi um tiro no escuro graças a minha tia Nádia, única irmã de minha mãe, que tratou bem de cuidar de mim como uma filha, como fez com Alessandra, minha prima mais velha. Alê cursou jornalismo em Belas Artes, e eu entrei um ano depois para Arquitetura, na mesma faculdade.

Não posso dizer que foi uma experiência boa para o meu babbo, que passou cerca de 16 anos sem a filha por perto, fisicamente falando. Mas ele tinha a nonna, entre todos os seus afilhados na cidade que ele mais amava no mundo, então... o velho não estava sozinho de verdade.

Metade da minha vida é São Paulo, e a outra metade, Minas. Com a morte de mamãe, sinceramente... minhas memórias são quase nada. Eu lembro de fazer trocentas peripécias na cozinha da cantina, dos crochês da minha avó, de namorar escondido com uns 15 anos numa das áreas de reserva natural e de comer muita, muita comida boa.

São Paulo tinha cantinas incríveis, mas nada como a cantina dos Antonelli. Babbo deve ter o lugar desde os seus 14 anos, quando minha nonna decidiu vir de Bologna para o Brasil – é um negócio de família, passa de geração em geração. Uma pena que sou um desastre natural pra coisa, e cozinha nunca foi lá meu forte, sendo sincera.

O eu era o famoso caso de, casa de ferreiro, espeto de pau.

Mas como toda ovelha retorna ao seu pasto... cá estou eu de volta ao distrito. Será que lembram de mim nesse buraco? Boa pergunta.

Outra excelente pergunta é porque infernos chovia como um fim de mundo em pleno pré-verão. Raios, tempestades, as piores coisas do mundo me aconteciam naquela estrada. Meu Mini Hatch de 5 portas, abarrotado de bolsas e malas manifestava que hora ou outra, naquela estrada maldita, iria parar. O foda é justamente isso: de mecânica, eu apenas entendo o número do meu borracheiro Alvacir, e o telefone da seguradora.

InnamoratoOnde histórias criam vida. Descubra agora