01

333 41 2
                                    



Fazia dois dias que a garota de descendência asiática havia voltado para o acampamento, uma colina isolada no meio do nada. Ela não fez questão de avisar a ninguém sobre seu retorno; afinal, quem ela deveria avisar? Seus meio-irmãos por parte de pai estavam, claro, no acampamento, mas a verdade é que ela não se sentia verdadeiramente conectada a eles. Por mais que fossem irmãos, as conversas sobre sentimentos e a vida pareciam sempre distantes, como se estivessem em mundos separados. Embora compartilhassem um laço de sangue, eles eram mais colegas de acampamento do que uma verdadeira família para ela.

Quando se sentou para atender o telefone irritante que não parava de tocar, Mei sentiu um peso no peito. Sabia que sua mãe provavelmente estava brava com ela por não ter avisado sobre a volta. Era um pequeno erro, mas algo que sempre a fazia sentir-se culpada, como se estivesse desrespeitando a única pessoa que realmente se importava com ela. Ao olhar para as duas malas empoleiradas no canto do quarto, ela percebeu que nem sequer se dera o trabalho de arrumar. Estava exausta, não apenas fisicamente, mas emocionalmente. Estava cansada de tentar se encaixar, de se preocupar o tempo todo.

Com um suspiro, Mei pegou o celular e viu o nome de sua mãe na tela. Hesitante, sentiu um aperto no coração. Sabia que sua mãe se preocuparia, mas o que mais a deixava ansiosa era saber que a conversa iria ser mais uma daquelas em que sentia que não fazia o suficiente. Levou o aparelho ao ouvido, o estômago se apertando.

— Bom dia, mãe — respondeu, se virando para olhar o quarto, como se esperasse encontrar alguma resposta para os seus próprios sentimentos ali.

— Bom dia, Mei — respondeu sua mãe, com um tom irritado, que fez o peito de Mei apertar ainda mais. — Já chegou ao acampamento? Acho que você esqueceu de me ligar há dois dias...

Mei sentiu um calor subir ao rosto, um leve constrangimento. Ela sabia que estava errada. Mas a viagem até o acampamento foi caótica, e depois disso, teve que se encontrar com Quíron para entender o que estava acontecendo, já que passou dois meses longe de tudo. Mesmo assim, se sentia culpada por não ter dado a sua mãe a atenção que ela tanto merecia.

— Me desculpa, mãe. Foi uma correria até o acampamento, mas eu cheguei bem e já conferi tudo o que precisava com Quíron — disse apressada, tentando acalmar os nervos. Ela sabia o que sua mãe queria ouvir. A culpa quase a engoliu, mas ela não podia mostrar fraqueza agora.

— Bom, fico feliz que tenha chegado bem — a voz da mãe ficou mais suave, mas ainda havia uma preocupação evidente. — Só não esqueça de me ligar da próxima vez — ela disse, com aquele tom de mãe que parece conseguir atravessar qualquer distância, qualquer abismo emocional.

— Eu sei, e sinto muito. Da próxima vez, serei pontual — Mei tentou responder de maneira descontraída, mas seu coração ainda estava pesado. A verdade é que ela queria muito falar sobre outras coisas, como o campista novo que matou um minotauro. Mas sabia que, por agora, sua mãe só queria a garantia de que estava bem. E ela se sentia grata por isso, embora soubesse que isso não era suficiente para reparar a falha.

— Você está tentando fugir dessa conversa, né? — Sua mãe soltou uma risada suave, mas Mei podia sentir o amor por trás da brincadeira. A vontade de rir também surgiu, mas não foi o suficiente para afastar o peso em seu peito.

— Só promete que vai se cuidar, minha luz, e ligar toda semana — a voz da mãe ficou suave, carinhosa. Foi como se ela tentasse abraçá-la à distância. Mei sentiu os olhos se umedecerem, mas não deixou as lágrimas caírem. Ela sabia que a mãe se preocupava, mas ela mesma estava sempre se sentindo perdida entre as expectativas e o que ela realmente queria para sua vida.

— Claro que sim, mãe. Já viu alguém mais responsável que sua filha? — Mei tentou suavizar a conversa com uma piada, mas a verdade era que ela estava começando a se sentir mais vulnerável do que gostaria. Ela escutou a risada da mãe e sorriu, sentindo uma pequena onda de alívio.

— Semana que vem vou te ligar e te atualizar sobre tudo. Te amo, mãe — ela falou com sinceridade, sentindo uma conexão profunda naquele momento, apesar da distância.

— Eu também te amo, minha luz — a mãe suspirou do outro lado da linha, e Mei sorriu, sentindo o calor no coração. Aquela era a sensação que ela mais queria manter: o amor da sua mãe, aquele apoio incondicional. Ela apertou o botão de desligar a chamada e ficou ali por um momento, ouvindo o silêncio e tentando processar tudo.

Mei suspirou cansada, sentindo uma mistura de sentimentos. Encostou os olhos nas duas malas no canto do quarto. Ela realmente precisava arrumar tudo, mas estava tão cansada que a ideia de começar parecia um fardo ainda maior. Como sempre, ela adiaria o inevitável, jogando um pouco mais de peso em seus ombros, mas sem a energia para lidar com isso agora.

Caminhou até o banheiro do chalé e entrou em um dos boxes para tomar um banho quente. O som da água a relaxava, mas também trazia à tona todas as emoções que ela tentava evitar. Depois de dez minutos, Mei saiu do banho e vestiu uma das roupas mais confortáveis que tinha, tentando se acalmar para o resto do dia. Quando se olhou no espelho, sentiu uma sensação de vazio. Tantas coisas não ditas, tantos sentimentos não expressos. Mas, por agora, ela iria seguir em frente.

Ao olhar a hora, Mei se apressou e saiu do chalé. Sentiu o calor do sol em sua pele e, por um momento, ela se esqueceu de tudo. O calor a envolvia como um abraço acolhedor, e um sorriso tímido se formou em seus lábios. Afinal, ela era filha de Apolo. E, mesmo em meio a tantas incertezas, ela ainda podia encontrar um pouco de paz no simples toque da luz do sol.

    

HIPNOSE•Luke CastellanOnde histórias criam vida. Descubra agora