O ÚLTIMO POR DO SOL

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Eu sou o Alfa e o Omega, diz o senhor Deus. Aquele que é, que era e que a de vir: o dominador.

Apocalipse 1:8

No silêncio angustiante da fria madrugada de Setembro, Surya acordou encharcada de suor devido a um sonho envolvendo o atropelamento de um homem que não conhecia. As imagens ainda eram tão vivas que a atormentavam como açoites. A rua onde o acidente acontecera no sonho ficava próxima ao escritório onde Surya trabalhara.

Basta! Não aguento mais, me deixem em paz! ― gritou ela para o vazio, como se as tormentas dos seus pensamentos fossem libertá-la.

Não era a primeira vez que Surya tinha sonhos mortuários, e isso a deprimia. A Senhora Morte não causava-lhe medo, mas detestava a ideia de que um dia teria que estar frente a frente com ela. As horas passavam lenta e silenciosamente. Para seus olhos arregalados, o teto do quarto era a última tentativa de conciliar o sono, antes que a aurora despontasse no horizonte. E a insônia ­- forte aliada do medo ­­­- pelo menos havia dado trégua e, quando conseguiu embarcar em um leve cochilo, Surya não ouviu o celular despertar.

Cecília afastou as cortinas brancas e abriu a janela da sacada do quarto. Aliás, era ela quem fazia isso todos os dias, pois era a única forma de arrancar Surya da cama. O sol já estava alto e lampejos de seus raios lamberam suavemente a sua face angelical. Então, Surya deu um pulo da cama e se deu conta de que já eram sete horas.

― Bom dia, dorminhoca! Hora de se levantar. ― cumprimentou Cecília.

Ambas eram amigas inseparáveis. Irmãs do peito, como Cecília ― ou Ciça, para os íntimos ― sempre dizia. Surya acreditava que aqueles laços de afinidade entre elas seriam eternos. Ciça era uma linda mulher e que estava habituada aos labores da vida. Moravam juntas há alguns anos, dividindo as despesas para não ficar pesado no orçamento de cada uma.

― Bom dia, querida. ― saudou Surya, espreguiçando-se na cama para espantar o sono que ainda teimava em fechar-lhe pesadamente os olhos. Seus longos cabelos loiros estavam lindamente desarrumados.

Além de amigas, Ciça e Surya também trabalhavam juntas. Possuíam um pequeno atelier de trabalhos manuais, instalado bem perto da casa onde residiam. Para venderem as peças que produziam, montaram uma modesta lojinha com uma imensa variedade de trabalhos, desde bijuterias até pequenas obras de arte.

Da janela, a despeito do sol, um ar gélido lhe tocava o corpo parecendo atingir os seus ossos, arrepiando-lhe e a pele macia. Surya levantou-se apressada da sua abençoada cama em busca de agasalho e caminhou até o lavabo. Ao alcançar o corredor, olhou seu reflexo no espelho e assustou-se com as olheiras embaixo dos olhos levemente caídos, castigados pela noite horrenda que tivera.

Estou sem cor, tão pálida... pensou com desânimo. Também, vivo cansada e sem tempo para nada; olha só para essas olheiras embaixo dos olhos ― continuou lamentando-se.

Suas noites eram frequentemente atormentadas por pesadelos e por isso Surya nunca conseguia acordar no horário certo. Sua vida estava sempre fora dos eixos.

― Porque nunca escuto o despertador? - questionava-se, irritada com o seu atraso. Após fazer sua higiente, procurou por Cecília na cozinha, mas ela não se encontrava. Aproveitou para tomar uma xícara de café e comer um pedaço de bolo de fubá, recém-saído do forno, provavelmente feito por sua amiga que adorava se aventurar pelos prazeres da gastronomia. Sem esperar mais por Ciça, dirigiu-se ao ateliê para trabalhar um pouco. Pensava em uma maneira de mudar sua vida para não parecer uma viva com cara de morta.

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⏰ Última atualização: Jun 24, 2015 ⏰

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