1. A Vingança é Dolorida

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Sabe aquela paixão de infância? Seu melhor amigo que você sempre foi apaixonada enquanto ele estava cada mês com uma namorada diferente? Pois é, essa minha paixão de infância está ajoelhado na minha frente e acabou de se declarar para mim como eu semprei sonhei... e como eu já o vi fazendo para várias outras garotas.

- Ai, ai, Jonathan... Me apaixonei por você quando nós tínhamos cinco anos. Você lembra? Eu estava sentada na calçada chorando porque tinha caído do skate e ralado o joelho, então você começou a fazer graça para tentar me fazer rir e conseguiu. Eu mal tive tempo de piscar e me apaixonei por você. Viramos melhores amigos depois daquele dia - eu disse relembrando. - Quando nós tínhamos dez anos você começou a namorar aquela ruiva de voz irritante, lembra? Chorei tanto aquele dia. Você não tem noção o quanto de água perdi quando percebi que você só me via como sua irmã que andava de skate com você. Mas vocês terminaram menos de um mês depois e eu achei que era porque você começou a sentir algo por mim... Me iludi pela primeira vez... Aos doze anos você começou a namorar aquela garota das unhas incrivelmentes gigantes, percebi que tinha sido trouxa pela primeira vez... Esse seu namoro durou um pouco mais, cerca de oito meses. Fiquei tão feliz aquele dia que a vi saindo chorando da sua casa e acabei descobrindo que a unha dela era postiça, mas isso não vem ao caso, o fato é que eu me iludi pela segunda vez achando que você poderia me ver como algo mais agora que estava solteiro - respirei fundo e continuei. - Aos quinze anos você não tinha nenhuma namorada, mas já tinha pegado todas as garotas da região, exceto eu... Então percebi que havia sido trouxa pela segunda vez.

- Desculpa, Leeh. Não sabia que você gostava de mim - ele disse.

- Depois de todos esses anos de convivência com quatrocentas mil mulheres diferentes ainda não aprendeu que quando uma mulher está falando você não deve interromper?

- Desculpa, continua.

- Aos dezessete anos você voltou a se aproximar de mim, eu achei que você finalmente tinha percebido que eu e você nascemos para ficar juntos, mas claro... Me iludi pela terceira vez... Os anos foram passando e você trocava de mulher mais do que de roupa. Eu via suas declarações lindas e depois você terminava com elas em menos de um mês, então percebi que tinha sido trouxa pela terceira vez... E quando você me pedia ajuda para conquistar uma mulher? Isso me dava vontade de me matar! Mas eu te ajudava. Sabe por que eu te ajudava? Porque eu te amava e achava um dia você ia perceber que nenhuma das mulherzinhas fúteis que você saía era para você - eu disse com vontade de chorar, mas segurei as lágrimas. - E agora, vinte anos depois que eu te conheci, você está aqui se declarando para mim como eu sonhei por anos e anos...

- Me desculpa por ter sido tão cego durante todos esses anos - ele disse me olhando como se tivesse arrependido.

- Não, eu que te agradeço - eu disse e ele fez uma careta confusa. - Porque depois de ser trouxa várias vezes eu finalmente acordei. Sua declaração é linda, mas é um texto pronto. Um texto que eu escrevi para você falar para sua ex loira oxigenada! Mas é claro que depois de tantas declarações você nem lembra quem te ajudou e para quem você fez cada declaração, não é? Jonathan, eu sofri por você durante vinte anos, desejei que você loucamente, mas o mundo gira. Agora é você que está ajoelhado na minha frente, mas adivinha, agora eu que não quero.

Não deixei tempo para ele falar mais nada, só entrei no elevador e apertei o térreo. Mas é claro que eu quero, minha vida inteira sendo trouxa não foi o suficiente para ver que ele não vale a pena. Eu o amo. Eu sofri por ele durante 20 anos, agora é a vez dele. Sim, foi tudo uma estúpida vingança. Não sei porque dizem que a vingança é doce, doce são os chocolates importados que ele me trouxe e eu não peguei. A vingança é dolorida. Meu coração dói e meus olhos ardem de segurar as lágrimas que querem cair.

- Charlotte, se meu chefe perguntar avisa que eu fui respirar ar puro porque estava passando mal - falei para a recepcionista assim que as portas do elevador se abriram.
Saí do edifício e olhei para os lados. Não sabia bem para onde eu estava indo.

- Letícia? - uma voz conhecida me chamou.

- Ah, oi, Leonardo - eu disse. Leonardo, o irmão dois anos mais velho do Jonathan e tão lindo quanto, estava sentado no capo de um lindo carro preto.

- Meu irmão é um idiota, não é? - ele perguntou e eu confirmei com a cabeça sem voz para falar qualquer coisa. - Ele foi o único que não percebeu o quanto você o amava. Era óbvio aos olhos de todos, sempre foi. Mas meu irmão sempre foi cego - Não tinha forças para falar nada, então apenas sentei no capo do carro ao lado dele. - Sabia que era idiotisse vir aqui, mas além de cego o Jonathan é surdo. Acho que o único sentido dele que não é defeituoso é o tato, porque o tanto que ele fica apalpando a bunda das namoradas loiras oxigenadas não tem igual.

- Isso não ajuda muito - eu disse baixinho.

- Desculpe. Você não merece todo esse sofrimento. A namorada loira oxigenada do Jonathan terminou com ele, então ele veio atrás da loira natural, no caso você. Ele não estava suportando a rejeição e finalmente olhou para você com outros olhos. Meu irmão é extremamente idiota as vezes. Toda vez que ele estava com alguma namorada você ficava tão cabisbaixa.

- Pelo jeito você era o único que notava.

- Eu sempre notava você. Eu sei que você nunca reparou nisso - ele disse, o que era completamente verdade. - Você sempre esteve muito concertada no meu irmão para reparar em qualquer outro garoto.

- V-você gostava de mim?

- Sim. Lembro de todas aquelas vezes em que você ia em casa e o Jonathan não estava. Você sempre ficava deprimida porque sabia que ele tinha saído com alguma garota. Eu tentava te animar igual ele fazia, mas nunca dava muito certo. Depois ele chegava sozinho e você sorria animada esperando que aquela forte amizade se tornasse algo mais - recordei-me de todos os momentos e reparei que o cego da história não era só o Jonathan, eu também fui cega.

Aproximei meu rosto do Leonardo. Eu ia beija-lo quando o celular dele tocou.

- Desculpa, tenho que atender, é a minha noiva - ele disse. - Oi, amor. Estou tendo que servir de motorista para o Jonathan, mas já já vou para casa. Estou com saudades...

Olhei para o edifício e vi que o Jonathan estava saindo do elevador, não sem antes parar para flertar com a recepcionista, é claro. Acenei para o Leonardo e sai andando pelo pavimento antes que o Jonathan me visse.

Nunca fui muito de acreditar em carma, mas acho que agora acredito. Jonathan demorou muito para perceber o que eu sintia e me perdeu. E eu demorei muito para perceber o que o Léo sentia e o perdi. Essa é a vida. Mas assim como o Leonardo merece ser feliz com sua noiva, eu mereço achar alguém para ser feliz comigo. Pensando bem, meu colega de trabalho que senta na mesa ao lado sempre trocou uns olhares comigo. Acho que está na hora de voltar ao trabalho se eu não quiser perder meu emprego e boas oportunidades, se é que me entendem...

Pisquei e Me ApaixoneiOnde histórias criam vida. Descubra agora