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𓇼Azul. Tudo o que eu via era azul.
O mar a nossa frente, o céu limpo, seu vestido cintilante que balançava com o vento.
Ela amava azul e eu a via em tudo — tudo que era azul.
Meus pés afundavam na areia quando senti a brisa que entrava em contraste com sua pele cálida tocando meus dedos. A encarei, ela sorriu.
Via azul em seus olhos também.
Suas mãos passaram a me puxar gentilmente pela praia em direção ao mar, vez ou outra, seu corpo se virava em minha direção e seus olhos penetravam os meus sorrindo.
Tudo nela sorria. Seus olhos, que ficavam pequenos e brilhantes, sua boca que se curvava da maneira mais fofa possível.
Sua alma inteira era de sorrisos. Até seu fígado sorria, assim como o Ketut do seu livro predileto costumava indicar.
Era como se sua felicidade completa estivesse diante de seus olhos, como se apenas o mar, Dora e eu fôssemos o suficiente para ela. E talvez, a vida ideal de Mabelz envolvesse esses três elementos.
Se eu não fosse tão cabeça dura, talvez.
Lembro-me da última briga e das outras também. Eu costumava me irritar facilmente com a leveza que Mabelz levava a vida.
Ela gostava de comprar vinho barato, porque segundo sua filosofia, o gosto não importava quando você já estava bêbado. Depois, levávamos a garrafa até a praia e bebíamos no gargalo encarando a imensidão do mar.
Mabelz era relativamente fraca pra bebida. Depois de alguns goles, meio cambaleante, ela se levantava da areia e passava a rodopiar e fazer passos desajeitados ao som do mar.
Aquilo me irritava, primeiramente pelos olhos curiosos que, por vezes, caçoavam da maneira que ela dançava desengonçada. Depois, os olhares masculinos sugestivos me enchia de ciúmes.
O que, para ela deveria ser um momento bom, tornava-se o motivo de brigas mais tarde.
Porém, naquele instante, vê-la me arrastando com as mesmas passadas desastradas na areia, não me irritava. Me deixava feliz.
— Porsche... — ela me chamava, virando-se por vezes, tropeçando e afundando seus pés na areia fofa.
Então Mabelz parou. Parou quando chegamos próximos ao mar.
Parou quando sentimos a onda trazer a água que molhava nossos pés.
Geladas. Azuis.
Bolhas se formavam em nossos pés enquanto o mar levava as ondas de volta.
Senti um arrepio.
O mar também queria levá-la. E ela, se perder naquele azul infinito.
— Porsche. — Alguém me chamou. De repente, tudo sumiu. A voz era masculina, firme, diferente da doce Mabelz, que desapareceu junto aos meus devaneios.
Era Third. Tinha Dora nos braços. Ela chorava.
Ele aproximou-se segurando-a com firmeza e ergueu seu corpo em minha direção. Embora chorosa, Dora agarrou o tio Third e se recusou vir para o meu braço. Franzi o cenho.
Talvez Dora tão pequena pudesse entender o que estava acontecendo.
Me virei, pensando convicto de que a pequena queria me dizer algo. Queria me dizer que eu deveria fazer logo a coisa certa.
Caminhei em direção ao carrinho de Dora, ao lado de Jackie que comia um camarão na orla da praia. Peguei a caixinha de MDF.
Então, o azul se transformou em cinza. Junto dela, as polaroids que queimei.
Mabelz queria voar na imensidão do céu azul. Mabelz queria mergulhar no infinito mar.
Azul.
Third próximo ao mar brincava com os pezinhos de Dora na água gelada que ria alegremente. Mabelz escolhera Lapat como padrinho exatamente por ele ser um cara bom. Ela não poderia estar mais correta.
Então abri a caixa. Uma parte de Mabelz realizou seu sonho e voou com a brisa de verão.
Olhei para o céu. Sorri.
Avancei sobre a areia fofa. Meus pés grudavam nela e sujavam, sempre pareciam três vezes mais imundos do que os dela. Ríamos comparando-os.
Beira-mar. Third agarrara Dora, que já não misturava grito e riso, parecia séria.
Meu Deus, tive a certeza de que ela era tão inteligente quanto a mãe.
Jackie se aproximou.
A caixa estava aberta e alguma parte do resíduo continuava se esvaindo pelo ar. Ela queria partir de vez e rumar ao azul.
Comecei a chorar copiosamente. Meus braços fizeram um movimento automático quando lancei a caixa de MDF para frente.
Mabelz navegava. Ela se perdeu naquele mar junto com as nossas polaroids.
Então, Dora chorou. Eu mantive meus pés imundos de areia próximo ao mar. Próximo a Mabelz.
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polaroid | porsche x mabelz
Fiksi PenggemarMabelz costumava ser azul, agora era cinza. Junto com as nossas polaroids. 𓇼