Capítulo 1

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Amy

Amy Karter definitivamente não estava entre as garotas mais bonitas de Olivill — esse era o primeiro fato sobre mim —, e estava tudo bem, eu admitia essa verdade sem problema algum. Mas, sendo sincera e não presunçosa, com o tempo percebi que tinha lá minhas vantagens em não ser, apesar dos apelidos cruéis das outras crianças, que só ganhavam mais força devido ao meu peso e altura. Com meus cabelos rebeldes cor de mel e cachos volumosos, as pessoas no geral gostavam, diziam que meus olhos castanhos tão expressivos eram convidativos. Alguns ousariam até mesmo dizer que a aparência meiga e frágil me remetia sempre ao papel de vítima, mas não era verdade, ao contrário do que parecia, eu era uma menina forte e determinada, e até mesmo um tanto orgulhosa — admito.
Eu cresci em Olivill, uma cidade do interior, em uma típica família de classe média. Mesmo gostando do fato de todos se conhecerem e serem amigos, a verdade é que nossa família considerada "modelo" escondia segredos sombrios, e para minha péssima sorte, eu fui ensinada a mantê-los. E ainda que minha mãe tentasse passar a imagem de perfeição, isso só era verdade em seus sonhos e aos olhos dos vizinhos, claro.
O problema existia e, por mais que eu desejasse que os sonhos fantasiosos de minha mãe fossem verdadeiros, a triste realidade estava estampada em meus olhos, todos os dias me contando uma única história: no pesadelo que eu vivia, não tinha para onde escapar.
Desde muito cedo aprendi a não demonstrar claramente meus sentimentos, confesso que isso me tornou indiferente à minha própria dor, afinal, eu aprendi com meus pais que o mais importante era manter as aparências. E por muitos anos desempenhei meu papel naquela perfeita farsa.
James O' Karter, o responsável pelo nosso inferno e mais conhecido como meu pai, era filho único de um casal de classe média. Me lembro dele como uma pessoa muito fria, que sempre trabalhou na imobiliária da família como corretor de imóveis. Ele tinha um único deus, e apesar de frequentarmos a igreja, não era o Cristo em uma cruz e, sim, o dinheiro. Quando meus avós faleceram, ele não viu problemas em conduzir os negócios da família, destacando-se cada vez mais para fazer bem ao próprio ego.
O exemplar sr. Karter, como todos o chamavam, aos olhos da sociedade era um homem bondoso, disciplinado, bom vizinho, amigo, pai e marido perfeito. Já minha mãe, Anastácia Karter, por sua vez, fora aquela mocinha tímida, que achava que a vida era um conto de fadas, com isso sempre sonhou que um dia seu príncipe perfeito chegaria. E se sentiu privilegiada quando o lindo garoto do colégio, o qual todas as suas amigas cobiçavam, declarou-se para ela.
Como ambas as famílias aprovaram o relacionamento, meses após a formatura, o sonhado conto de fadas se concretizou, dando assim, para minha desgraça, origem à família que todos julgavam ser perfeita.
O que nenhum vizinho sabia era que o meu pai nem sempre era tão exemplar assim. Genioso e possessivo, ele achava que a sua linda e educada esposa era sua propriedade, um brinde que ele usaria a seu bel-prazer e faria o que desejasse com ela, afinal, eles haviam se casado e ela era sua para usar, assim como todos os seus bens.
Apesar de não acreditar muito nisso, minha mãe dizia que o primeiro ano de casamento pareceu um conto de fadas. Ela tinha o péssimo hábito de relembrar, como se de alguma forma aquilo fosse aliviar algo para nós. Contava sobre a casa linda, o marido romântico e dedicado. Parecia mesmo descrever um conto de fadas. Segundo minha mãe, ela não poderia ter desejado mais da vida. Às vezes, ainda me pergunto se em algum momento ela realmente notou que seu príncipe não passava de um homem abusivo e violento. A paixão cega? Não sei, nunca estive apaixonada, mas cegou minha mãe, cegou a ponto de não ver o marido perfeito se tornar cada vez mais possessivo e agressivo.
E quando veio a primeira gravidez, meu pai se decepcionou, ele queria um menino, o que em sua cabeça machista daria continuação ao seu nome. E para a tristeza da minha mãe, que tinha esperança de que com a gravidez ele voltasse a ser o homem por quem se apaixonou, viu tudo ruir quando teve a confirmação do sexo. Ainda não sei por que ele escolheu meu nome, Amy, pois, ao contrário do significado, eu nunca me senti amada por eles.
Com os anos, as agressões se tornaram cada vez mais frequentes e quando sua fúria não era saciada apenas em minha mãe, restava a ele incluir sua filha. Eu não entendia por que meu pai me odiava tanto, no entanto, como minha mãe nunca reagiu, eu aprendi a me conformar com aquela situação, uma vez que ouvira ela insinuar que eu era culpada, pois deveria ter nascido homem.
Lembro-me de um dia, ao chegar da escola e não encontrar com minha mãe no caminho, entrei em casa e me deparei com ela chorando no sofá. Meu pai ainda não havia chegado do trabalho, e, inocentemente, sugeri que fôssemos embora. Foi quando, pela primeira vez, minha mãe me calou com um tapa, dizendo que ela seria louca se deixasse um homem bom e honesto como meu pai. Insistiu dizendo que as pessoas pensariam que ela era uma mulher sem escrúpulos, e que, por mera vaidade, fracassou no casamento.
Não, ela nunca permitiria que isso acontecesse e não queria ouvir isso da minha boca, concluindo que um dia eu a entenderia. O que nunca ocorreu, porém, como minha mãe ordenou, nunca mais toquei no assunto, ou sequer pensei sobre ele até o dia que ela anunciou que eu teria um irmão.
O motivo para colocar outra pessoa naquele inferno, só Deus conhecia. Mas, ao contrário do que eu imaginava, meu pai recebeu a notícia com certa alegria e disse, em um tom rude enquanto olhava para nós, que esperava que fosse homem para que ele pudesse ser recompensado por tudo que havia gastado conosco durante esses anos. Minha mãe, como sempre, não se atreveu a retrucá-lo, contudo, naquela mesma noite, no jantar, foi surpreendida quando meu pai, depois de anos me ignorando, pediu que eu fizesse uma oração em voz alta rogando a Deus que me concedesse um irmão, e assim eu o fiz todos os dias até o bebê nascer.
Um menino lindo e saudável, meu irmão tinha os olhos verdes como os do nosso pai, com bochechas rosadas e cabelo loiro. Foi com festa e alegria que ele escolheu seu nome, Benjamin, segundo James, o novo membro da família era mesmo o filho da felicidade, e confesso que com o passar dos anos fui obrigada a lhe dar razão.
A vida continuou e, para a minha alegria, depois do nascimento de Benjamin, não houve mais agressões da parte de meu pai. Apesar de ainda ser tão rude comigo e minha mãe, a violência física acabou depois de Ben. E finalmente, pela primeira vez, mesmo não acreditando mais na tal felicidade, eu pude ter um pouco de paz, se é que poderia assim considerar.
Se antes eu já era ignorada, com a chegada de Ben passei a ser invisível para os meus pais, o que eu nunca vi como problema. Ao contrário disso, apesar de Ben ter toda a atenção e mimos em excesso, o amor entre nós não só existia, como se intensificava cada vez mais.
O passado agressivo do meu pai foi deixado apenas em minhas lembranças, e como o meu irmão nunca conheceu esse seu lado, para ele, James sempre foi um herói, apesar de ainda sentir calafrios quando ele, por alguma razão, alterava seu tom de voz. Mas diante da alegria de Ben, eu sempre me contentei em manter a farsa. Não pelos meus pais em si, mas ver a felicidade estampada nos olhos do meu irmão era a minha recompensa para manter o silêncio.
Eu não me transformei como a Cinderela, mas apesar da infância que tive, posso dizer que os anos foram generosos comigo. Com os meus quinze anos, mesmo estando longe de ser a mais atraente, me considerava um pouco sexy, bonita até, mas nada além disso. Não era aquele tipo que roubava todos os olhares, no entanto era notada por alguns. Ao contrário da maioria das adolescentes, como eu não seguia moda e sendo avessa a tendências, a situação só piorava, entretanto eu gostava de ter meu próprio estilo. Enfim, como dizia a Helen, a única amiga íntima que tinha desde o colegial, "Amy é Amy e ponto final. Nada mais e nada menos".
Embora o meu estilo tão comum e meu excesso de timidez, houve sim alguns romances de adolescentes, mas graças ao "bom exemplo" de relacionamento que tive em casa, sempre achei que os garotos eram patéticos demais para serem levados a sério, e com isso nunca caí nessa de paixão ou romance intenso, o que me fez terminar o colegial ainda sendo virgem, e juro que apesar de Helen debochar, isso para mim não fazia diferença alguma.
Talvez um dia acontecesse, mas sexo não era prioridade em minha vida, ao contrário da Helen, que desde os quinze se entregou às paixões da carne, me tendo sempre como sua fiel confidente para consolá-la a cada decepção.
Quando me formei com excelentes notas, meus pais entraram em um consenso e, para a minha surpresa, decidiram, para manter o bom nome com os vizinhos, me mandar para a universidade. Eu nunca me senti tão feliz em minha vida. Com esse inusitado ato, enfim vi minha sonhada liberdade bater à porta. E novamente, para uma garota que não esperava muito da vida, me encontrei animada com a mudança repentina do acaso. Seria esse o momento para finalmente escrever minha história? Ainda que tardiamente, senti a esperança crescer em meu peito pela primeira vez.
Como eu já esperava, meus pais não interferiram em minha escolha, mesmo quando anunciei que faria jornalismo. Não que faltassem palavras para discordarem, na verdade, eles nem viam a escolha como algo inteligente, contudo, não fazia diferença, afinal, era eu e não o Ben. E com isso, não houve objeções em ter que arcar com as despesas e os estudos. Prometeram que se eu mantivesse as boas notas, eles enviariam, sempre ao final do mês, um cheque com o valor das despesas totais.
Mas eu, que sempre tive ambição pela liberdade e independência, sabia qual caminho seguir, e ele iniciaria assim que eu me mudasse para Portivill, lugar onde se localizava universidade a qual fui aceita.
Estava tão ansiosa, que já havia feito vários planos, sendo que o primeiro seria procurar um emprego. A ideia de continuar a precisar do meu pai me provocava ânsia, e depender do seu dinheiro não estava em nenhum desses planos.
Já estava tudo combinado, eu e Helen dividiríamos um apartamento alugado perto do Campus, ambas decidimos pelo mesmo curso. Dias antes da mudança, eu já havia feito todos os preparativos. E quando o grande dia enfim chegou, o único que chorou como um bebê foi o Ben, que já com seus onze anos, me fez prometer que assim que possível eu o visitaria. O que nunca ocorreu.
O primeiro ano de estudos me deixou em grande êxtase. Consegui um emprego de meio período em uma livraria próxima ao prédio onde morávamos. Respirar a liberdade todos os dias era a minha tese de felicidade. O salário não era lá grandes coisas, mas satisfazia meu ego e, por enquanto, já estava bom. Depois de tudo, eu não me sentia no direito de reclamar, a vida estava me dando uma chance de finalmente escrever minha história, e não iria fracassar.
Eu tinha minha melhor amiga como companheira de apartamento, um emprego que satisfazia minha ânsia de liberdade e o curso dos meus sonhos. Realmente, não havia espaço para reclamações, enfim a vida começara a sorrir para mim, e de maneira alguma seria ingrata de não retribuir o sorriso.
Graças a Helen – que era a miss simpatia em pessoa —, nós duas fizemos muitas amizades e começamos a namorar. Os namoros de Helen não duravam muito, já o meu durou cerca de dois anos e meio. Matt era o sortudo da vez, como dizia Helen — e foi por insistência dela que começamos um romance —, mas eu não podia reclamar, ele era um garoto bonito, com ótimo senso de humor, o oposto de mim, que até as piadas eram sem graça.
Mas, independentemente de todas as controvérsias, eu gostava mesmo de estar com ele. Por um tempo até passei a acreditar no amor, apesar de não ser com tanta paixão e desejo como Helen várias vezes me descrevia, mas estava satisfeita. Foi com ele que eu tive minha primeira relação sexual, o que me fez questionar o porquê de as pessoas gostarem de sexo. Não havia muito desejo, eu sequer conseguia chegar ao orgasmo, e após meses, passei a questionar se todo prazer que as pessoas diziam existir não era invenção, ao menos das mulheres, já que ele sempre gozava. E mesmo que houvesse um pouco de curiosidade, esse não era um assunto que eu estava disposta a levar adiante. Mesmo com a minha insatisfação, eu me convenci de que estava tudo bem assim.



Pouco antes de nos formarmos, fui surpreendida quando Matt terminou comigo e ainda acabou confessando suas traições. Como justificativa, ele me culpou dizendo que eu era muito fria — o que eu não podia negar —, e, segundo ele, esse motivo o afastou. Porém, o que meu namorado imbecil não entendia e não ousei dizer é que eu não era assim porque queria, e sim por não conseguir me soltar. Até me esforcei durante o relacionamento, mas foi em vão.
Lógico que houve muitas lágrimas, mas todas na escuridão do meu quarto, nem mesmo Helen as viu, e mesmo que quisesse me consolar, ela me conhecia bem o suficiente para saber que somente quando estivesse pronta falaria sobre isso.
Como eu sempre brincava, éramos como a luz e a escuridão, ambas se completavam. Era até mesmo de se espantar como poderíamos ser amigas sendo tão diferentes. Enquanto eu não ligava para moda, Helen seguia a moda como um ritual de saúde, tendo sua mãe, uma designer de moda, grande culpa nisso. Já seu pai, um escritor contemporâneo, sempre apoiou a mulher e filha, dando a Helen o poder de suas próprias escolhas.
E pensando nela, poderia dizer que Helen era tipo a "Britney Spears" do Campus. A loira gostosa que todos os caras queriam pegar, e muitos conseguiam. Ela tinha determinação, gostava de chamar a atenção fosse pela inteligência ou pela beleza, e em uma das vezes, quando por diversão apostamos quem levaria a melhor em uma determinada matéria, apesar do meu esforço e noites de sono com a cara enfiada nos livros, me surpreendi quando Helen levou a melhor. Contudo, mais tarde ela me confessou que dormiu com o professor para conseguir vencer, o que achei injusto, mas essa era a Helen, a garota que fazia qualquer coisa para conseguir o sucesso. E eu admirava isso nela.
Quando o grande dia da formatura finalmente chegou, combinamos que ambas as famílias se encontrariam no local onde ocorreria a colação de grau. E, já prontas para sair, um telefonema inesperado nos surpreendeu.
Era para mim. Ao atender, a sra. Marie, uma vizinha dos meus pais, me informou que eles sofreram um grave acidente e que eu deveria voltar com urgência. Por instantes, meu mundo desabou. Perguntei por Ben, ela informou que me irmão não estava no momento do acidente, que havia ficado em sua casa. É verdade que nunca nos demos bem, mas eram meus pais e jamais, em momento algum, eu desejei mal a eles. A sensação de poder perdê-los me desnorteou. Sem tempo para pensar a respeito e ter que dar muitas explicações, acabei ocultando em parte a verdade para Helen, pois naquele momento só conseguia pensar em como o Ben precisava de mim. Deixei todos os preparativos da formatura para trás e retornei para minha cidade natal.
Durante toda a viagem, que durou cerca de oito horas, chorei como uma louca. Um choro que eu mesma não conseguia decifrar, afinal, havia um aperto grande em meu peito. Desejava que fosse um terrível mal-entendido, e que ao voltar para a casa os encontraria e saberia que tudo não passou de um engano, no entanto, como que prevendo a dor da despedida, eu senti que meus desejos não se realizariam. Ainda que eu fizesse mil preces, teria que encarar a realidade.
Quando cheguei a nossa velha casa, como previ, descobri que meus pais não resistiram. E ao conversar com a sra. Marie fui informada que sofreram um acidente a caminho da formatura.
Não houve tempo para lamentações, havia decisões a serem tomadas, e foi isso que fiz. Com a ajuda de amigos e familiares, inclusive Helen, a quem liguei após passar o choque inicial, organizei o funeral, dando aos meus pais um enterro como de meus avós. E por mais que toda a situação me fizesse desmoronar, eu precisava ser forte. Por Ben, precisava continuar.
Por quatro anos ficamos sem nos ver pessoalmente, a não ser por fotos e chamadas de vídeo, e me surpreendi ao ver que meu irmão se transformou em um belo jovem e, com seus quinze anos, poderia muito bem dizer que já completara os dezoito. Era mais alto que eu, corpo atlético, loiro de olhos verdes. Sim, ele era muito bonito, e aqueles mesmos olhos que antes eram alegres e cheios de vida, agora estavam tristes e vazios.
Quando finalmente tudo passou e pudemos voltar para a casa, que agora parecia tão vazia, nos abraçamos por um longo tempo sem pronunciarmos uma única palavra. Mas o sentimento que nos unia ainda era o mesmo, ele sempre seria meu doce irmãozinho, e eu, sua amada irmã. E esse mesmo sentimento nos permitiria continuar.
Os dias que seguiram foram longos e dolorosos. Eu estava perdida, e Ben pouco falava, não havia muito que dizer, a sensação de impotência fazia com que eu não suportasse mais ficar naquele lugar. Ao conversar com meu irmão, sendo nós os únicos herdeiros, entramos em um acordo, e uma vez que eu era responsável por ele perante a lei, decidimos vender a casa e a imobiliária, assim poderíamos comprar um apartamento em Portvill, onde teríamos a chance de recomeçar novamente sem receber os constantes olhares de pena.
Eu sabia que não seria fácil, e até que tudo se resolvesse levariam alguns meses. Era um risco a correr, contudo, como disse Mahatma Gandhi: "Não existe um caminho para a felicidade. A felicidade é o caminho". E eu sabia que já estava na hora de deixar o passado para trás e trilhar o meu próprio caminho.
De fato, foram semanas de dor de cabeça com o advogado para arrumar os papéis, vender a casa, a imobiliária e todo restante. Mas, após meses presos a essa loucura, nós conseguimos comprar um apartamento perto de onde eu e Helen nos instalamos há alguns anos, inclusive, foi ela a que mais apoiou a ideia. Não era algo tão bom como a casa onde eu e Ben crescemos, mas era necessário deixar guardado algum dinheiro caso houvesse alguma necessidade, e até mesmo para os estudos de Ben, porque sim, assim como meus pais proporcionaram os meus, eu faria o mesmo por ele.
E, além disso, eu tinha plena consciência que até arrumar um emprego em minha área, dependeríamos da pensão do nosso pai que, sinceramente, era menos do que eu esperava, mas a sorte estava ao nosso lado, e como eu sempre soube administrar bem minhas finanças, não teria tantos problemas com isso.
Quando finalmente mudamos para o novo apartamento, ele parecia menor do que eu acreditava ser, com duas suítes, sala de estar conjugada com sala de jantar, uma cozinha minúscula, uma área de serviço e um banheiro social. Era realmente simples em comparação com a casa dos nossos pais, mas era nosso recomeço e, para mim, estava perfeito, já para Ben, nem tanto. Entretanto, como ele já não era mais o mesmo garoto, não fazia questão de dar opinião. Desde que pudesse ter total controle sobre seu quarto, o resto não importava muito.
Foi triste ver o meu irmão, que antes era tão alegre, se tornar um garoto de poucas palavras e genioso como meu pai. Mas como tudo era recente, eu ainda tinha esperança de vê-lo superar aquela terrível tragédia e voltar a mesma alegria de antes. Eu tinha consciência que não poderia ocupar o lugar dos nossos pais, porém, faria o possível para vê-lo feliz novamente.
Quando pude contemplar tudo pronto, me senti realizada e com mais esperança. Procurei, junto a Ben, um colégio, entramos em acordo e ele retomou os estudos. Helen sempre vinha me visitar, e em umas dessas visitas me mostrou uma boa proposta de emprego em uma editora conhecida, e como o salário era bom, caso conseguisse, seria uma ótima experiência no ramo e aliviaria, e muito, nossas despesas, visto que justamente por isso eu já estava desesperada por um emprego. Ao contrário de Helen, que era filha única de um casal de classe média alta e não tinha preocupações financeiras, eu tinha.
Tendo o pai da minha amiga contrato com essa editora, ela me disse que pediria a ele para me indicar. E ele, por ser um escritor renomado, conhecia a família proprietária, e com o pedido da filha se dispôs a me ajudar.
A vaga era para assistente pessoal do jovem empresário que trabalhava chefiando a editora de seus pais, um tipinho mulherengo de sorriso fácil e, com certeza, um sedutor atraente. Esse foi o modo como Helen o descreveu, claro, usando palavras mais chulas, e eu sabia que para ela descrevê-lo assim, ele o era, mas isso não me intimidaria. Na verdade, sequer me sentia atraída por esse tipo, tudo que eu queria era o emprego e faria o possível para consegui-lo.
Com a ajuda do pai de Helen, eu realmente consegui. Depois de uma entrevista no departamento pessoal, passei a ocupar a vaga e começaria na próxima semana, fato que me deixou radiante. Para comemorar, Helen insistiu que eu melhorasse minha aparência, com isso, fui a um salão de beleza indicado por ela. Não que eu fosse mudar meu estilo, mas por todo apoio que ela me deu, eu quis, de alguma forma, deixar minha gratidão evidente, e para a minha amiga isso significa seguir suas ideias. Nada radical, apenas clareei mais as madeixas, o que, segundo ela, realçou minha beleza, e o resultado foi aprovado não somente por ela, mas por Ben também.
Apesar dessa grande reviravolta, essa agora era a minha nova vida e eu me esforçaria para vivê-la intensamente.


 

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Trapaças do destinoOnde histórias criam vida. Descubra agora