Alvorada

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E lá vamos nós, antes mesmo do sol se aventurar no céu, rumo ao acampamento de José e Giovana. A falta de sono pesa sobre nossos ombros, mas eu me sinto um pouco revigorada pelo tempo que passei inconsciente. Não me separo um segundo sequer do meu arco desde que deixamos para trás a casa abandonada onde descansamos. Ele é como uma extensão de mim, uma fonte de conforto e proteção em meio à escuridão da floresta.

Seguimos adiante, com José um pouco à frente e Giovana ao meu lado, cada um de nós envolto em seus próprios pensamentos e preocupações.

Observo com curiosidade quando o rapaz desvia para a esquerda, afastando-se do caminho que Giovana havia meticulosamente delineado. Baixando minha voz, inclino-me em direção a ela e pergunto: "Por que não estamos seguindo o caminho que você me mostrou?"

Giovana responde em um sussurro, seus olhos brilhando com a cautela típica de quem conhece os segredos da floresta. "É que o José armou algumas armadilhas por aqui para pegar animais pequenos. Acho que ele quer verificar se conseguiu capturar algum."

Com um suspiro contido, eu retorno o olhar para José, observando-o com curiosidade enquanto ele desbrava o caminho com confiança. Parece conhecer cada trilha e cada curva, como se pertencesse a esse lugar.

Sinto o olhar de Giovana sobre mim enquanto caminhamos pela trilha irregular. "Ei, Amanda, antes de tudo isso começar, o que você fazia da vida?", ela pergunta, olhando-me com curiosidade.

"Bem, antes de toda essa loucura começar, eu estava apenas tentando aproveitar umas folgas do trabalho. A empresa de turismo onde eu trabalhava estava um pouco mais tranquila naquele período, e minha faculdade tinha parado por conta de uma greve dos estudantes", revelo, tentando reunir o máximo de detalhes possíveis que lembro.

Lembro-me claramente da sensação do sol quente na minha pele enquanto caminhávamos pelas praias douradas da cidade litorânea, minha amiga ao meu lado compartilhando risadas e histórias. "Eu e uns amigos decidimos viajar para Ondasul, sabe, só para descontrair um pouco. Queríamos conhecer as praias famosas de lá, mergulhar no mar azul e simplesmente aproveitar a vida", explico, um sorriso nostálgico brincando em meus lábios.

"Mas então... tudo mudou." A lembrança da invasão repentina envolve meu coração com um aperto familiar, e por um momento, o som das ondas e a brisa do mar parecem tão distantes quanto as estrelas no céu noturno. "A invasão aconteceu enquanto estávamos lá, e assistimos todo aquele paraíso desmoronar diante dos nossos olhos."

Giovana, com uma expressão de pesar, abaixa os olhos ao ouvir minha resposta, e sinto a tristeza envolver todo o nosso pequeno espaço como uma sombra escura. Minha voz treme um pouco quando começo a contar sobre aquele terrível dia.

"Bianca..." murmuro o nome da minha amiga com um nó na garganta, revivendo a sensação de desespero que tomou conta de mim naquele momento. "Foi tudo muito rápido... Um segundo estávamos juntas, e no próximo..." Minha voz falha enquanto tento conter as lágrimas que ameaçam escapar.

Lembro-me vividamente da sensação do sangue quente e pegajoso em minhas mãos enquanto eu lutava para estancar o ferimento de Bianca. "Ela... ela foi atingida por um pedaço de concreto... Os outros saíram correndo para buscar ajuda, enquanto eu... eu fiquei ao lado dela, sem saber ao certo que fazer."

Minhas palavras parecem se dissipar no ar fresco da noite, perdendo-se na escuridão que nos cerca.

Após um minuto que parece uma eternidade, Giovana quebra o silêncio com uma pergunta tímida, quase como se temesse a resposta. Sua voz, suave e quase imperceptível, ecoa entre as árvores como um suspiro, enquanto seus olhos procuram os meus em busca de uma resposta.

O que há nas SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora