Uma vez, quando criança, Lucas saiu com sua mãe para um passeio pelo zoológico. Ele havia se encantado com a variedade de animais que seus olhos conseguiam ver, mas também sentiu um leve aperto na garganta como se quisesse chorar, pensando como devia ser horrível passar a vida atrás de grades com seres desconhecidos invadindo sua privacidade, apenas pela oportunidade de o observar.
Mas conforme o passeio prosseguia, esse pensamento sobre a injustiça da vida foi deixando a mente do garoto pouco a pouco. Chegou um momento em que ele simplesmente esqueceu do porquê ficara indignado, quando se deparou em frente a jaula onde ficava um enorme leão. O animal estava sentado entre as patas traseiras, a cabeça virada para o lado, como se algo muito interessante estivesse prendendo sua atenção ao invés do humano magrelo que o observava de longe.
Naquele momento, o pequeno Lucas sentiu seu coração acelerar de emoção, pensando que ali estava o ser que era considerado o rei do mundo animal, cercado de grades feitas por humanos fracos em comparação ao majestoso felino.
O menino sentiu os olhos lacrimejar e uma pontada de inveja misturada com pena. Ali estava o animal que, em sua liberdade, poderia correr livre por toda uma selva, não tinha que dar satisfações a ninguém, ninguém o cobrava para ser mais do que era e, no entanto... No entanto, estava preso. Porque na vida, por mais que se queira escapar, às vezes simplesmente não é possível.
Foi essa lembrança, a do passeio no zoológico, que veio à mente de Lucas enquanto ele colocava a mochila de lona no chão e deitava a cabeça sobre ela. Não havia o que fazer; ele já tinha procurado por portas e janelas, o que se mostrara inútil e cansativo, então só o que restava era tentar dormir para pelo menos escapar para o mundo dos sonhos.
Era isso que ele queria, não fosse pelo barulho repentino e alto que surgiu, como se algo ou alguém tivesse caído no chão. O que realmente aconteceu, Lucas percebeu, quando abriu os olhos e se sentou.
Do outro lado do cômodo havia um outro garoto, mais ou menos da mesma idade de Lucas e com uma mochila de lona ao seu lado. O outro garoto logo se levantou do chão, olhando para todos os lados, como se estivesse tentando se situar de onde estava.
Lucas continuou sentado encostado na parede e apenas observou o garoto sair correndo tateando as paredes, em busca de alguma porta e gritando sobre como ele faria algum velho nojento se arrepender, para segundos depois implorar para sair dali. Em algum momento, entre um xingamento e uma súplica, o garoto se cansou, abaixou a cabeça e caiu de joelhos no chão com as mãos cobrindo o que deviam ser lágrimas escorrendo pelo rosto.
Mesmo com medo, irritado e cansado, Lucas se levantou e foi até o garoto. O outro não pareceu escutar passos atrás de si, por isso se assustou quando Lucas colocou a mão em seu ombro.
- Ei, relaxa - Lucas disse, quando o garoto se afastou abruptamente e se levantou, a mão erguida quase como se estivesse preparando um tapa. - Eu também fui jogado aqui do nada, então não gasta suas energias tentando achar uma saída ou gritar por ajuda. Não tem. Acredite, eu tentei.
Lucas suspirou e voltou para se sentar em seu canto. Com isso, o outro garoto fez o mesmo, pegando sua mochila e a apoiando no colo.
- Cara, o que diabos está acontecendo? Onde é que a gente está? - Montanha perguntou.
- Eu não sei. Em um momento eu estava em casa escutando música, quando um homem apareceu do nada na janela do meu quarto e a próxima coisa que eu sei é que caí aqui. - Lucas respondeu, suspirando, a mão direita fechada em punho e acertando a própria perna, a frustração e medo só aumentando. - Aliás, como é que você se chama?
- Montanha.
- Montanha? - Lucas ergueu uma sobrancelha.
- É. Por quê? Tem algum problema?
- Não, cara, é que...Olha, está vendo aquele canto ali, um pouco mais iluminado? Ali tem algumas pedras e eu sei que vai parecer estranho, mas algumas tem nomes de pessoas. Inclusive tinha uma com o meu nome e o homem que me jogou aqui ficou repetindo que eu devia pegar logo a pedra com meu nome. Eu sei, não faz sentido.
Quando ele disse isso, Lucas percebeu que a expressão de Montanha mudou, como se de repente ele tivesse se lembrado de algo. Montanha se levantou e correu para o canto que Lucas apontou, se ajoelhou e começou a tatear as pedras até achar aquela que tinha o seu nome. No momento que ele pegou o objeto nas mãos, surgiu um leve brilho branco que durou por poucos segundos, mas foi o suficiente para fazer Montanha arquejar e soltar a pedra no chão novamente, se afastando como se tivesse levado um choque.
- Relaxa, aconteceu o mesmo quando eu peguei a pedra com meu nome. Mas eu acho que você devia guardar a sua.
Montanha olhou para Lucas e pegou a pedra de volta do chão, se levantou e voltou para seu lugar. Pegou a mochila de lona e mexeu no zíper para abrir, mas parecia estar emperrado.
- Nem tenta, parece que está grudado. Eu puxei com a mão, com os dentes e nada. - Lucas disse, balançando a cabeça para estalar o pescoço tenso.
- Por que diabos então me deram uma mochila que não posso abrir? - Montanha suspirou, encostando a cabeça na parede. Uma dor atrás da pálpebra começando.
- É sério que é com isso que você está curioso, e não com o porquê de termos sido sequestrados, ou onde estamos?
- Você disse que não tem saída. - Montanha falou colocando a mochila no chão.
- É, nem porta ou janela.
- Então.
- Então o que?
- Bem, se vão me matar, eu queria pelo menos ver se deixaram alguma comida nessa mochila. O maluco que me jogou aqui fez isso justo na noite que eu não pude jantar.
- Você só pode estar me zoando.
- É isso ou chorar. E eu prefiro não gastar mais nenhuma lágrima.
Lucas suspirou e se ajeitou novamente para deitar-se. Seu coração parecia apertado, como se uma mão estivesse fechada sobre ele, o pressionando. O jovem precisou colocar a mão na boca para abafar o soluço que lhe subiu a garganta. Ele se virou de lado, para que o outro menino não pudesse ver que em seus olhos havia lágrimas. Fechando os olhos para conter o choro, Lucas se deixou afundar novamente na lembrança do passeio ao zoológico, pensando em como devia ter sido horrível para o leão ser retirado de seu habitat natural e largado em um lugar desconhecido, sendo afastado de sua família sem saber quando iria escapar de sua prisão.
E se com vida ou não.
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Conclave de Nume - Jogos Divinos: O confronto dos mortais
FanfictionCinco jovens são misteriosamente sequestrados e transportados para uma dimensão diferente. Lá, descobrem que cada um foi escolhido por um deus específico e que precisarão participar de jogos de sobrevivência. Enquanto lutam como uma equipe, os seque...