Capítulo 1

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SABRINA


"... Um consenso, eu diria, entre terapeutas, sexólogos e ginecologistas (aqueles que se importam com mais do que a sua saúde física), é que você precisa se descobrir primeiro sozinha, pelas próprias mãos. Tocar-se é primordial. Só você, na privacidade do seu quarto, no conforto da sua cama, é capaz de entender o seu corpo, de perceber quais estímulos lhe dão satisfação ou desconforto. Sem esquecer a questão de que o sexo começa na cabeça. Sim, despertar sua libido é também fantasiar, deixando que sua mente viaje para lugares que talvez nunca tivesse coragem de se expor. É imaginar pessoas, situações e avaliar as sensações provocadas por esses pensamentos. É por aí que se deve começar a descoberta do próprio prazer."

Reli o texto que ainda passará por uma revisão antes de ir para o blog.

— Talvez eu acrescente ou exclua algo até lá, mas o principal está aí, Mel — resmunguei para a minha companheira de quatro patas esticada confortavelmente no chão, ao meu lado.

Baixei o olhar para vê-la mexer a orelha, indicando que, apesar dos olhos fechados, seguia atenta à minha voz.

Sorri e voltei a atenção para a redação digitada, então o meu celular vibrou sobre a mesa, indicando uma chamada de minha amiga. Eu havia tirado o som para poder me concentrar melhor nas palavras que precisava registrar logo após testar um novo acessório. Gostava de aproveitar parte do torpor do clímax ainda em minha mente e meu corpo para reproduzir melhor as sensações enquanto as passava para o papel. Melhor dizendo, para o arquivo no notebook.

Deslizei o dedo pela tela e o som abafado da respiração de Maya me atingiu, lembrando-me de que eu estava atrasada para a academia. Ela certamente já caminhava na esteira aquecendo.

— Desculpe! — falei de imediato e ela bufou. — Em minha defesa, estava trabalhando.

— Sei bem o tipo de trabalho!

— Eu ganho pra isso — lembrei-lhe após colocar no viva-voz para poder terminar de me trocar. Por sorte eu já estava de legging e top.

— Tal quais as garotas de programa. Aliás, você deveria inventar um título para a sua profissão. Algo mais glamouroso do que "testadora de produtos eróticos".

Minha risada saiu contida por conta da camiseta que passava pela minha cabeça.

Não dava para chamar o que eu fazia de profissão. Trabalho com certeza, afinal eu tinha responsabilidades: testar os novos sex toys produzidos sob a supervisão de uma sexóloga, relatando minha opinião com imparcialidade. E, sim, eu era remunerada para isso.

O novo ofício surgiu porque chamei a atenção em uma postagem na qual relatei uma experiência para lá de ruim. Tornar isso público, ainda que sob um pseudônimo, despertou a curiosidade de quem visualizava minhas redes sociais a ponto de viralizar. Em poucos dias, minha conta ganhou dezenas de milhares de seguidores, transformando-me praticamente em uma influencer.

— Podemos discutir isso enquanto malhamos — brinquei. — Tô saindo. Te vejo em menos de dez minutos.

Ainda a ouvi resmungar alguma coisa antes que eu desligasse. Passei a mão na minha garrafa de água e na pequena mochila que costumava carregar, jogando o celular dentro sob o olhar atento da yorkshire de cinco anos. Abaixei-me para lhe dar um beijinho e tranquei o apartamento, correndo para o elevador que não demorou a chegar ao meu andar. Entrei e, antes que as portas de aço se fechassem, lancei um olhar para a porta de madeira à esquerda.

O novo morador – sabia que era um homem por conta dos comentários do porteiro – mudara-se havia pouco mais de uma semana, mas eu ainda não o tinha visto, apenas ouvido uma movimentação dentro do apartamento. Uma, aliás, bem instigante, repleta de murmúrios, risadas e gemidos altos. Tão altos que eu nem precisava usar minha imaginação para entender exatamente o que estava rolando e para chegar à conclusão de que ou a mulher era uma excelente atriz, ou o cara era realmente bom na arte de dar prazer.

Um Antigo Amor de VizinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora