1° Capítulo: Vestida de vermelho

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¹ Quem é aquele que vem de Edom, que vem de Bozra, com as roupas tingidas de vermelho? Quem é aquele que, num manto de esplendor, avança a passos largos na grandeza da sua força? "Sou eu, que falo com retidão, poderoso para salvar. "
² Por que tuas roupas estão vermelhas, como as de quem pisa uvas no lagar?
³ "Sozinho pisei uvas no lagar; das nações ninguém esteve comigo. Eu os pisoteei na minha ira e os pisei na minha indignação; o sangue deles respingou na minha roupa, e eu manchei toda a minha veste.

Isaías 63:1-3



Foi como estar em um sonho. Um sonho ruim. Eu estava em um mar de escuridão e, no momento seguinte, quando abri meus olhos, estava deitado em um chão batido de terra. Abaixo do que parecia ser um telhado de madeira coberto com palha, havia alguns furos por onde a luz do sol passava, ofuscando minha visão e me deixando ainda mais atordoado. Onde eu estava? Como vim parar nesse lugar estranho? Até as perguntas me deixavam zonzo. Então, decidi parar de fazê-las para tentar filtrar os sons que escutava. Eram muitos. Ouvi o choro de crianças, gritos de homens furiosos, pedidos por misericórdia e, por último, um barulho como de uma vassoura varrendo algo. Apesar de todo o barulho e do caos, sei bem que foi o som dessa vassoura que me acordou. Como se ela estivesse varrendo minha própria mente, tentando esconder minhas memórias. Eu não poderia deixar.

Levantei-me devagar, mas fiquei tonto, então resolvi ficar apenas sentado. Olhei para frente e vi que havia uma porta que levava ao caos que se ouvia lá fora. Não havia uma chave para que eu pudesse me trancar lá dentro; portanto, a porta certamente estava destrancada. Senti um cheiro forte no ar, um cheiro de ferro, ou talvez sangue — algo podre. Vi um pouco de luz entrando por uma pequena janela à minha esquerda, mas ainda era difícil visualizar o ambiente enquanto meus olhos tentavam se adaptar à escuridão. Havia uma cadeira de madeira ao lado da porta, e ferramentas estavam penduradas por pregos na parede. Uma delas me chamou a atenção; parecia um canivete, daqueles que têm várias funções. Talvez eu pegasse ele antes de me arriscar a sair daqui. Escutei um choramingo à minha direita e, ao olhar para o lado, levei um pequeno susto, já que pensava estar sozinho. Um menino de olhos escuros e amedrontados, cheio de lágrimas, me olhava assustado.

Tentei perguntar a ele, mas senti minha garganta raspando, como se eu não tivesse bebido água por um bom tempo. Finalmente, consegui dizer: "O que houve? Você sabe o que está acontecendo lá fora?" Ele hesitou, olhando para baixo, antes de murmurar: "A morte veio nos buscar. Mas eu não quero morrer." Sem entender, concordei e perguntei o que tinha acontecido comigo. Ele soltou um longo suspiro e disse: "Eu não sei. Não sei nem quem é você. Não sei como vim parar aqui. Só sei que não posso sair, porque senão vão me matar." Ele parecia estar em choque; com certeza viu coisas ruins. Provavelmente, não conseguiria tirar nenhuma informação útil dele. Mas o senso de urgência chegou até mim. Eu precisava sobreviver também. Mas, para isso, precisava sair dali, mesmo que fosse ir ao encontro dos gritos e choros do lado de fora.

Para ajudar, eu estava com uma forte dor na cabeça. Toquei nela e, quando olhei para a minha mão, vi um pouco de sangue. Olhei para o chão e vi alguns pedaços de vidro quebrados, do que antes poderia ser um espelho. Peguei o maior caco que encontrei e encarei minha testa. Havia um corte na têmpora direita, mas, felizmente, parecia superficial e boa parte do sangue já estava seco. Afastei aquele vidro para me olhar melhor.

Vi o rosto de um rapaz assustado, com cerca de 17 ou 18 anos. Não sabia dizer ao certo. Cabelos que um dia talvez fossem dourados cobriam sua testa, e seus olhos castanhos escuros nada me diziam. Maçãs do rosto um pouco vermelhas, queixo quadrado, lábios inchados e cortados. A pele? Ressecada e queimada, de quem há muito tempo não via protetor solar e, com certeza, também não tinha água. Isso me fez perceber que minha garganta estava raspando de tão seca. Eu não reconhecia aquele rosto, mesmo sabendo que era meu. Minhas memórias pareciam estar escondidas; não conseguia lembrar de nada, nem mesmo do meu nome.

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⏰ Última atualização: Oct 07 ⏰

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Orestes - O CaptorOnde histórias criam vida. Descubra agora