Linha de largada

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#TWICERUN

Tóquio era uma grande capital com mais de dez milhões de pessoas. Em cada esquina, um fluxo interminável de pessoas e mercadorias onde era possível encontrar de tudo um pouco e que só diminuía de madrugada, horário em que a maioria das pessoas estava cansada demais para ficar acordada depois de um longo dia de trabalho. No verão, as roupas grudavam no corpo pelo calor abafado e as máquinas de sorvete iam e voltavam da manutenção, quase como se a primavera tivesse levado toda sua amenidade com o desabrochar das flores de cerejeira.  

Naquele inverno em questão, a temperatura não parecia subir mais que nove graus celsius, o que obrigava todo mundo a perder metade do salário com aquecedores. Por isso, enquanto as ruas eram iluminadas por semáforos demorados e placas brilhantes de centenas de arranha-céus, duas pessoas esfregavam as mãos sobre a grelha em busca do fraco calor das brasas. Isso era um lembrete de sua posição na sociedade, algo para marcar o fracasso de suas vidas longe de casa. 

Yuto pegou o último pedaço de carne em seu prato e encheu com o molho caseiro antes de comer, expressando sua satisfação com um murmúrio alto. Fazia duas semanas que eles não tinham nada além de ovos e arroz na geladeira, então aquela refeição era um paraíso gastronômico, e considerando que estavam na lojinha de aperitivos do Lee, aquilo não estava tão longe de ser verdade. 

— Tire os olhos do meu prato. — Jihyo mergulhou as fatias suculentas no líquido laranja que escorria da gema mole e tratou de encher a boca antes que o parceiro a roubasse, seria traição praticar tal ato.

— Eu não estou fazendo nada. — rebateu, o tom lamurioso enquanto focava no conjunto de porcelana pendurado na parede da loja — Você só tem sorte demais, ficou com o prato mais cheio e a tarefa mais fácil!  

— O cozinheiro sempre gostou mais de mim porque eu nunca reclamei da pimenta no tempero dele, então a culpa disso é sua, mas quanto a tarefa: eu não considero dirigir para a filha do prefeito a atividade mais agradável do mundo. Ela é só mais uma riquinha mimada que torra do dinheiro do pai com bolsas de marca.

— Não seja ingrata, Hyo! Prefiro isso a cuidar do abastecimento daqui. — ela riu, negando com a cabeça ao se lembrar de como o amigo odiava pegar as cargas da loja e dirigir dentro do limite de velocidade. 

— Já está reclamando de novo, vê? Se dirigisse melhor estaria no meu lugar.  

O rapaz de cabelos medianos afastou o prato e se esticou na cadeira, levando-a a um ângulo que sempre garantia uma repreensão para os dois. Ele nunca mudaria, mesmo amadurecido, parecia que os anos só proporcionaram uma altura invejável e um bom físico. 

— Não é como se eu contasse com isso para te vencer em algo. 

Aquele excesso de confiança fez Jihyo erguer as sobrancelhas em descrença, claro que ela adoraria provar o contrário para que Yuto pagasse a refeição, mas eles tinham pouco tempo até a corrida principal. Por isso, ela apenas depositou as notas sobre a mesa e se despediu brevemente do cozinheiro que encarou feio o rapaz, provavelmente tinha escutado partes soltas da conversa que renderam ainda mais antipatia para o desaforado. 

Assim, quando abriu a porta do seu carro preferido, a euforia veio quase imediatamente. Deslizou as mãos no volante com um deleite que só quem corria poderia entender, as vibrações do motor que saía de seu breve descanso. Sendo o primeiro automóvel que conseguiu quando se mudou da Coréia do Sul, ela tinha grandes motivos para se afeiçoar tanto ao modelo: um Dodge Charger que parecia o demônio em forma de máquina.

Manobrou para fora do estacionamento escuro com Yuto preparando toda a rota no GPS enquanto avançavam para o local da disputa. Seria uma corrida distante do centro, a partir de uma encruzilhada isolada, com o objetivo de atrasar os policiais que chegariam de qualquer jeito. Perto da cidade vizinha, como se eles já não tivessem problemas demais onde moravam, ninguém num raio de vinte quilômetros se aproximaria sem ser visto. E apesar de conhecer cada metro de Yamanashi, Jihyo não se negou ao benefício de um co-piloto, precisava de um peso a mais para equilibrar nas curvas quando o carro fosse jogado para o lado nas derrapagens. Além disso, seria complicado prestar atenção na rota uma vez que os seus adversários viviam para jogá-la fora da pista. Nada limpo, mas eram as regras da rua.  

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