Capítulo 2

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Max

Quando a viúva entrou na sala, fiz de tudo para não mostrar o quão satisfeito estava. Jamais confessaria para ninguém, mas uma parte de mim pensou que ela não pudesse vir.
Seria uma tremenda burrice se deixar levar por um orgulho besta iniciado no idiota de seu marido. Se afundar em dívidas e morar em um hotel de quinta categoria com as filhas, não parecia fazer o estilo da mulher à minha frente.
Mesmo que na minha mente não fosse uma atitude inteligente, eu pensei sim na possibilidade de ela negar o convite para uma conversa de negócios, afinal, em meus anos de trabalho já vi pessoas falindo por não dar o braço a torcer e não admitir que fracassou.
Todo o senhor de terras não deve se acomodar nunca, deve estar sempre preparado para qualquer adversidade, seja em pragas na lavoura ou até no mínimo que era alguma conta de valor errado.
Meu pai sempre me ensinou que só devemos confiar de olhos fechados em nós mesmos. O ser humano por si só é uma criatura gananciosa que quando vê algum ganho que vem facilmente, quer sempre tirar vantagem.
Minha única exceção era Xavier, nele eu confiava, porque assim como eu, foi ensinado pelo meu pai desde criança a amar cada pedaço de terra, além de ser muito grato ao meu coroa que não o deixou morrer na rua.
— Boa tarde, senhora Barbosa. — Levantei e estendi a mão em um cumprimento formal.
— Muito boa tarde, senhor Rodrigues — respondeu em tom comedido, contudo, me surpreendendo ao passar o indicador na palma da minha mão antes de nosso toque, pelo aperto de mãos, finalizar.
Minhas sobrancelhas se uniram em confusão pelo gesto ousado e inesperado, entretanto, tratei de esconder a surpresa com uma expressão neutra.
— Espero que a viagem tenha sido boa, sei que a distância das terras é um pouco longa. — Suzana assentiu e deu um sorriso tímido.
— De carro não é tão cansativo, só perdi a prática de dirigir, mas me saí bem.
— Entendo. Sente-se. Quer alguma coisa? Temos café, limonada, pães, porém, se nada lhe agradar, posso mandar Tereza fazer alguma coisa. — Ela descartou tudo com um aceno de mão.
— Vamos direto ao assunto. — Assenti.
Pus a mão no queixo para esconder um sorriso de satisfação. Gostava de pessoas diretas e não estava mesmo com paciência para trivialidades sociais.
— De acordo.
— Esse senhor vai ficar? — perguntou, se referindo a Xavier.
— Ele é necessário.
— Achei que o assunto fosse particular, não me sinto confortável para abrir o jogo sobre minhas posses na frente de estranhos, se o assunto for mesmo o que estou pensando. — Suzana parecia nervosa e isso era bom.
— Acho que a falência da sua família não é segredo para ninguém na região. Na verdade, posso chutar e dizer que toda Goiânia sabe que vocês não têm nada e devem a todos.
Suzana se levantou e pôs as mãos na cintura. Chegava a ser engraçada a sua tentativa de pôr medo em alguém.
Avaliando sua aparência, era difícil acreditar que uma mulher tão bonita quanto Suzana foi um dia, se deixou acabar tanto. Nem todo o luxo conseguiu esconder a pele envelhecendo por trás da maquiagem e nem a tonalidade do cabelo esbranquiçado.
Porém, tinha que admitir, não era possível se cuidar muito com o tanto de dívidas que o falecido marido tinha, não iria sobrar nada para coisas banais.
— É uma audácia o senhor me chamar até aqui para me insultar, ainda mais na frente do seu subordinado.
— Acalme-se e sente-se, por favor, senhora. Em primeiro lugar, Xavier não é meu subordinado, meça suas palavras. E em segundo, não a ofendi em hora alguma, falar a verdade não é sinal de insultos — disse em tom firme.
Não me importava se a mulher estava ofendida ou não, o que eu não tolerava era seu insulto ao Xavier. Ele é muito mais que um simples administrador aqui, é o irmão que não tive.
— Peço desculpas pelo insulto, senhor Xavier.
Olhei para ele, que assentiu, descartando o pedido dela e balançando a cabeça para prosseguir com a conversa.
— Agora que estamos acertados, seguiremos ao assunto pelo qual lhe chamei. — Cruzei as mãos e a fitei. — Sei muito bem da dificuldade que a senhora está enfrentando. A qualquer momento o banco pode fazer valer o seu direito e tomar posse dos seus bens como garantia de pagamento e, se ainda assim não for o suficiente, as terras serão tomadas.
— Como sabe disso tudo? — sussurrou incrédula.
— As notícias correm, e eu sou um homem que gosta de se manter informado. — Dei de ombros.
— Você só se informou por que, desde que seu pai estava vivo, tinha interesse em nossas terras.
— É um detalhe também. — Um meio sorriso se formou em meu rosto e continuei: — Sendo ainda mais direto e lhe poupando de mostrar algo de que já tenha conhecimento, eu tenho uma proposta a fazer. Quero comprar as terras, lhe dar uma quantia que permitirá sua boa vida e de suas filhas. Obviamente, não será um valor tão alto que poderá ficar no luxo eternamente.
— E quem disse que vou vender para você? Meu marido iria repudiar isso.
— Não permiti intimidade, me chame de senhor. Prefere morar na rua, senhora Barbosa? Pedir esmolas, ou quem sabe, vender o corpo? Garanto que não conseguirá muito — a provoquei abertamente.
A viúva corou, Xavier fazia sinais por trás dela dando a entender que fui longe demais.
Merda! Estava nervoso e com pouca paciência para gente estúpida que não conseguia enxergar o óbvio. Porém, tinha que me controlar. Sendo escroto e canalha, não me faria ganhar aquela guerra e muito menos ter o que eu tanto desejava.
Mesmo sabendo que a mulher à minha frente pouco valia, eu tinha que tentar fingir que a respeitava.
— Peço perdão, agora eu que me excedi. Eu quero facilitar as coisas, sabe que o seu destino e de suas filhas será a rua. Acha que vale a pena por causa de orgulho?
Os segundos que se seguiram foram o de mais absoluto silêncio. Esperei batendo a caneta que segurava no tampo da mesa, até que ela respirou fundo e olhou nos meus olhos.
— Tenho total ciência do que me disse, sei que a condição atual da minha família não é uma das melhores. O trabalho de minha filha mais velha em uma clínica não é o suficiente para cobrir as despesas que temos, e minha mais nova está no último ano de faculdade.
— E o que a impede de vender? Será o melhor para ambas as partes e a senhora não sairá perdendo. Tem consciência que se sua casa for tomada, você não levará um tostão? — Ela assentiu.
— Sei disso. Só que sei também que todas as dívidas farão com que as terras sejam desvalorizadas, ainda assim, sairei no prejuízo.
Me pus a pensar no que ela disse. Era uma mulher gananciosa, disse isso como uma maneira de não diminuir o valor que suas terras valem, mesmo com dívidas. O que Suzana não queria perder, na verdade, era seu estilo de vida.
Era uma cobra sorrateira, sabia que eu era capaz de tudo para conseguir as terras e que não sossegaria. Estava jogando verde comigo.
— Sobre isso, não poderei fazer nada.
— Ai, meu Deus, o Senhor poderia ter me levado! — ela disse, olhando para o teto. Mais um de seus dramas, era nítido. — Estou fadada a sair das terras que vivi por tantos anos e que criei minhas filhas. — Pôs os braços na mesa e começou a chorar.
Xavier a olhou incrédulo e sem saber como reagir. Eu, por outro lado, revirei os olhos. Detestava drama, e se ela achava que iria conseguir arrancar uma boa grana de mim com aquele teatro de quinta, estava enganada.
Peguei uma folha de papel e escrevi o valor que estava disposto a dar pelas terras. Não iria dar mais nada além disso, era o que valia. Já iria perder mais dinheiro com as dívidas que as terras deveriam ter.
— Esse é o valor que tenho em mente. — Passei o papel pela mesa.
Ela se levantou, enxugou os olhos, que não tinham lágrima alguma, e olhou o valor. Vi seu semblante mudar de tristeza falsa para raiva.
— Mas isso é um absurdo, é um valor extremamente baixo, em vista do quanto vale — disse irritada, fechando os punhos sobre o papel e o amassando.
— E é somente isso que vou dar, nem um centavo a mais.
Suzana jogou o papel à minha frente e se levantou. Suas mãos fechadas como se quisesse me bater, e deveria ter essa vontade mesmo.
— Pois não vou te vender nada!
Senti o ódio tomar conta de mim. Eu queria muito que essa dor de cabeça se resolvesse hoje, porém, essa mulher estava disposta a carregar esse problema até o último segundo.
Respirei fundo e suprimi a vontade que eu tinha de lhe dizer umas verdades e a pôr para fora. Contudo, me mantive calmo por fora, me encostei na cadeira confortável que mantinha no escritório e dei um meio sorriso.
— Muito bem. Vai ser um prazer vê-la morando na rua. E mesmo que não queira vender as terras, elas serão minhas de qualquer jeito. Quando o banco tomar tudo da senhora, será uma questão de tempo até que tudo vá a leilão e eu comprar.
Estava extremamente puto da vida. Iria conseguir de qualquer maneira, no entanto, sabia que seria bem mais caro. As terras eram valiosas, só que era muito mais fácil tê-las com um custo-benefício baixo.
— Olha, Max, sei que não pediu a minha opinião, mas eu tenho uma ideia para isso tudo — Xavier disse, levantando a mão.
— Diga.
— Sei que pode parecer loucura, mas há uma solução para que você tenha as terras sem precisar que a Suzana saía da casa.
— Qual seria essa ideia mirabolante? — O olhei, desconfiado.
Eu confiava em Xavier, porém, aquela cartada de última hora não parecia me cheirar bem.
— Um casamento — sugeriu triunfante.
Quase caí da cadeira. Ele estava louco? Eu jamais iria me casar com Suzana. De todas as merdas que já disse e fez na vida, essa era a mais cabeluda e fedida.
— Enlouqueceu, Xavier? Não vou me casar com ela! — retruquei, apontando para Suzana.
— O senhor me ofende, eu sou uma viúva de respeito — disse em tom dramático.
Xavier torceu os lábios tentando controlar uma risada. Nem ela acreditava nesse discurso, visto que, volta e meia, me olhava disfarçadamente com interesse.
— Não com Suzana, mas, sim, com uma das filhas.
— Isso é um absurdo, minhas filhas são meninas!
— Pensa bem, Max, você pode ter as terras. Casando-se com uma das garotas, terá direitos como marido, pode administrar tudo e pagar as dívidas. Suzana pode assinar uma procuração te dando plenos poderes para que tome a decisão que quiser, já que você pagou por tudo. Será seu de qualquer forma.
— É uma ideia a se considerar. — Passei a mão no queixo, cogitando a hipótese.
— Vocês estão loucos? Eu não vejo vantagem nenhuma para mim e nem para as meninas.
Era de se esperar que ela só pensasse na vantagem, não na proposta de trocar uma das filhas pelas dívidas das terras. O ultraje inicial foi só para enganar e ser vista como boa mãe.
— A senhora e a filha não escolhida, poderão continuar morando na casa. Terá todas suas despesas pagas, uma mesada mensal, não será muito já que Max pagará as despesas da casa e será colocado 5% de todo o lucro que a fazenda der em uma poupança para a senhora, caso venha a ter problemas futuros eventuais.
A sacada de Xavier era genial. Com uma filha a menos na casa, a despesa iria diminuir, fora que eu poderia cortar gastos extras eventuais e a mesada estipulada não seria alta demais, já que ela teria o lucro mensal.
— Obviamente, os benefícios só lhe serão ofertados logo após o casamento e a sua assinatura — falei.
— E quem me garante que vou ter tudo isso e não serei prejudicada com valores abaixo do que necessito mensalmente?
— A senhora terá o necessário para cobrir suas despesas. Lembre-se que Max terá que levantar suas terras infrutíferas — Xavier falou em um golpe de misericórdia.
Suzana mordeu o lábio, conseguia ver as engrenagens do seu cérebro trabalhando.
Eu sabia que ela iria aceitar. O valor que dei como lance seria como água nas mãos dela. Gastaria tudo e não teria rendimento.
Já com uma mesada, despesas pessoais pagas, dinheiro rendendo em uma conta de banco e sem dívidas em sua cabeça, era muito mais fácil viver a vida fútil que ela tinha.
— E então? — eu disse, impaciente.
— Tudo bem, eu aceito. Vou fazer um jantar simples para que possa conhecer minhas filhas e decidir qual a que mais combina com o senhor. 
Levantei e apertei sua mão rapidamente para que não houvesse contato maior do que o estritamente necessário.
— De acordo. Espero seu convite.
Ela assentiu e saiu da sala. Sorri para Xavier. Foi mais fácil e mais lucrativo do que pensei.
Suzana achava que a mesada que iria ganhar seria uma fortuna, entretanto, iria querer um relatório de seus gastos. Não era um trouxa para ficar bancando luxos de um inútil.
— Plano de mestre. Só não sei o que fazer com relação a me casar, não estava nos meus planos.
— Está mais do que na hora e você pode muito bem fazer o que sempre fez. Dê tudo o que a mimadinha quiser, elas devem ser iguais à mãe. A compre com presentes caros, joias e viagens.
— Comprar minha liberdade — respondi.
— Exatamente — comentou, sorrindo largamente. — Bom, eu vou dar uma saída, tenho documentos a preparar para seu fechamento de negócio com a senhora Barbosa. — Assenti, e Xavier saiu.
Me sentei de novo na cadeira e me pus a refletir. Nunca me vi casando, gostava muito da minha vida de solteiro. Foder mulheres por aí sem ter que dar satisfação de cada passo que dou.
Esposas exigem cuidados e atenção, coisas que não tenho tempo e nem paciência para dar, porém, se essa era a saída para ter as terras, que seja. Quando tivesse a procuração, tomaria tudo como meu e seria questão de tempo para convencer a viúva a passar tudo para meu nome.
Quanto a minha querida futura esposa, Xavier já tinha me dado a solução perfeita. Daria o que ela quisesse para compensar minha ausência como marido.
Sorri vitorioso e olhei a foto dos meus pais. Minha mãe estava em viagem pela Europa, amava viajar e só voltaria quando o dinheiro que limitei para gastos terminasse, o que não demoraria muito.
Já estava prevendo o show que ela daria por eu por limites e o inferno que faria quando voltasse. Contudo, não estava com saco para pensar muito nisso... por ora.
Foquei no meu pai, tão parecido comigo, e sorri. Finalmente eu consegui pôr as mãos na Fazenda Milênio. Peguei a fotografia e passei o dedo em seu rosto. Sabia que, onde quer que ele estivesse, estava orgulhoso de mim.


Gente, desculpa a demora. Sei que não postando com frequência, mas é que as vezes esqueço por estar tão focada em histórias novas.
Mas o capítulo 2 . Espero que gostem.

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