14. Epílogo

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Três meses depois de seu confronto com Slughorn, Harry atravessa a porta do Quartel-General dos Aurores e percebe de repente que não pode mais trabalhar lá.

Não é uma grande surpresa, na verdade. Ele vem falando sobre isso com Draco há semanas, durante o jantar ou nas manhãs preguiçosas na cama - o fato de que ele só entrou nesse ramo de trabalho porque achava que era o que deveria fazer, porque não conseguia se imaginar fazendo outra coisa. Draco tem feito muitas brincadeiras, cutucando-o no peito e chamando-o de idiota, mas não chegou a dizer que acha que Harry deveria desistir. Harry não tem certeza, mas acha que é uma conclusão que Draco quer que ele tire por si mesmo, seja pela saúde mental de Harry ou porque Draco não quer ser responsabilizado por quaisquer consequências.

Mas houve uma noite em que Harry chegou em casa abalado e coberto de sangue, com muita raiva e com o coração partido pelo que tinha visto, pelo que não tinha conseguido impedir, para dizer a Draco algo além de "Estou bem, o sangue não é meu" e "Não, não quero falar sobre isso, porra". Ele entrou no chuveiro e tentou, sem sucesso, se limpar da experiência e, depois de um tempo, Draco entrou atrás dele, colocou um braço em volta da cintura de Harry, o queixo sobre o ombro dele.

— Você não precisa fazer isso consigo mesmo, você sabe — Draco disse, quase inaudível por causa do som do spray. — Há muitas pessoas que até gostam do seu trabalho. Eu gosto do meu trabalho. Acho que Blaise faria amor com seu trabalho, se fosse possível.

Harry baixou a cabeça, a água batendo em um padrão constante e vergonhoso contra sua nuca.

— Blaise é um homem doente — disse ele, porque sempre valia a pena dizer, antes de, miseravelmente, continuar: — Mas é... eu tenho uma obrigação, sabe? Para essas pessoas. Para todos. Eu tenho que lutar e defendê-los, e não posso simplesmente abandonar isso porque não... gosto, ou algo assim.

Após um longo momento de silêncio, e com uma voz estranha, Draco disse:

— Meu Deus, Harry. Você nunca se cansa de se martirizar? 'Tenho uma obrigação para com todas as pessoas em qualquer tipo de perigo', honestamente .

— Mas — Harry disse, e Draco calmamente estendeu a mão e redirecionou o jato do chuveiro diretamente no rosto de Harry, aquele filho da puta desagradável.

— Eu tenho essa teoria — Draco disse, todo inocente e sério interesse enquanto Harry balbuciava. — Que você realmente não se ouve quando fala. Decidi que toda vez que você abre a boca tudo o que você registra é... bem, não sei, ainda não resolvi essa parte. Um pato grasnando ou algo assim. De qualquer forma, é claramente menos teoria do que fato, porque se você pudesse ouvir como você falou agora há pouco, tenho plena fé de que você saberia o absurdo total que é. — Ele cravou o queixo pontiagudo na carne do ombro de Harry, um pequeno gesto de punição. — Você merece ser feliz, você sabe, mesmo sendo a pessoa mais tragicamente irritante que existe.

Harry realmente não acreditou nele nem nada, mas se virou para pressionar Draco contra o piso frio e úmido e beijá-lo só por dizer isso; apenas por parecer pensar que era verdade. Draco abriu a boca contra a de Harry e com uma coisa e outra eles nunca voltaram ao assunto, mas ele carregava as palavras de Draco no bolso desde que as ouviu todas iguais, uma espécie de talismã. Você merece ser feliz. É um pensamento estranho.

Ainda assim, não é isso que acontece, na manhã em que ele entra no escritório e sabe que não está mais preparado para ser Auror. Não é como se ele pensasse: Isso não me faz feliz e nunca fez e, portanto, devo ir, porque mereço a felicidade; Draco disse isso, ou qualquer coisa boba assim. É mais porque ele olha para a colmeia de atividade que zumbia ao seu redor e fica impressionado, totalmente e sem reservas, com a percepção de que não sabe mais onde se encaixa nisso. Que talvez ele nunca tenha sabido.

What We Pretend We Can't See | DrarryOnde histórias criam vida. Descubra agora