oito

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Devolva-me todas as risadas que arrancou de mim, todos os segredos que um dia te contei, enquanto as lágrimas desciam pelas curvas do meu rosto e você tentava me acalmar. Reações anafiláticas que você era capaz de curar.

Já nos perdemos nas ruas barulhentas, e eu sei que em você ainda dói, porque em mim chove todas as noites em que me deito.

Já passaram meses, e eu sei que não está sozinho. Vi seu amigo semana passada, e ele me disse que estava bem.

E eu não posso acreditar que foi tão fácil assim pra você me esquecer. Eu não esqueci de nada, refresco as memórias todas as noites. Sentada no parapeito do prédio da Francisco Matarazzo, vejo as pessoas passarem com tanta pressa, e isso me assusta.

Costumávamos ser as pessoas mais apaixonadas dessa cidade que nunca dorme. Agora tudo está cinza. Saímos nos finais de semana, nos contentamos com corpos que nunca havíamos tocado, e o sexo com estranhos parece igual a todos que já fizemos na vida. Mas não é a mesma coisa do que éramos juntos. Você entrava em mim me olhando nos olhos, ninguém fez com tanta intensidade como você. E você estava em tudo em que eu tocava com os dedos. Claramente eu não era mais eu, eu era você e todos os lugares em que visitamos. O caminho em que percorríamos entre sua casa e a rua principal. Você era música que entrava em meus ouvidos e mente.

Na boca do primeiro cara que me fez ousar encostar pra te esquecer. Era tudo pra te esquecer e não esqueci. Ainda penso em você.

Em quando eu te olhava assistir os dramas irlandeses - você percebia minha adoração por você? Ainda é a mesma. Ainda amo sua risada, ainda visto sua camisa e ouço suas músicas favoritas. Em alguns instantes me odeio por ceder ao que me lembra você. Deveria deixar você sair de mim e se doar pela cidade inteira, derramar um pouco de si em cada esquina que passar e sentir que encontrou alguém com a mesma energia que você encontrou em mim.

Aquela semana foi a última de nossa vida juntos. Agora somos dois: você e eu, separados por um instante em que se cabe um caminho inteiro. Da distância entre sua casa e a minha, o mesmo céu e a mesma paixão e a mesma dor. Mas não o mesmo ar, não a mesma casa, não o mesmo cômodo.

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