PRÓLOGO

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RIO DE JANEIRO, 1998

A verdade é que o Rio de Janeiro não era pra qualquer um. O Brasil inteiro, se fossemos realistas, mas o Rio de Janeiro tinha algo de especial – e não no bom sentido.

Tínhamos mais de três mil aglomerados subnormais, ou favelas, no Brasil, mais de setecentas delas só no Rio de Janeiro, era o segundo estado com o maior número de favelas, locais onde aproximadamente 18% da população do estado residia. E lá em cima dos morros da cidade paradisíaca é onde ficava escondido o sangue de diversas mortes pelo tráfico.

Nenhuma favela do Brasil se comparava com as favelas do Rio, ali, era onde você conhecia a bandidagem em seu pior estado de natureza, o tráfico já havia corroído e apodrecido todo o local e era aí que a figurava mudava. A polícia militar convencional não dava mais conta, e quando eles perdiam a luta, o BOPE entrava para a guerra.

O Batalhão de Operações Policiais Especiais foi criada, principalmente, com o intuito de conter essa criminalidade quando a polícia convencional não conseguia, e lá em cima, nos morros, eles nunca conseguiam. Então, quando o BOPE entrava, os moradores – e bandidos – sabiam que o que os esperavam eram fuzis e não algemas, porque o BOPE não prendia.

Marina não concordava que fosse assim, mas também não ia contra. Cresceu na favela, sabia e viveu na pele a realidade lá em cima e diferente de grande parte dos seus amigos da escola, vizinhos e até mesmo familiares escolheu seguir o caminho contrario ao que o trafico desenha para a vida dos moradores de lá.

Estava na polícia desde os dezenove anos e a primeira coisa que fez foi sair da Rocinha, porque sabia que não era mais bem-vinda ali. Um ano depois levou junto sua mãe e o irmão, sabia que era tão perigoso para eles quanto para ela.

A verdade é que quando você entrava na polícia as coisas mudavam; se você alivia para sua roda de convivência só porque vocês são seus conhecidos, você não é um bom policial. Se você pesa a mão para a sua rodinha só porque é policial, você não é um bom amigo. São escolhas a serem feitas, não tem um meio termo. Para a Marina nunca teve.

Agora, com vinte e nove, foi retirada da equipe que comandava para cooperar com o Batalhão Especial como auxílio especial em negociação e inteligência tática. O BOPE era mão de obra forte, eram guerrilheiros, um exército impiedoso e por conta disso, por muitas vezes, deixavam o extinto sanguinário falar mais alto nas operações; e isso podia não ser um grande problema se considerassem que o outro lado da guerra tinha tanta sede de sangue quanto, mas a mídia estava caindo em cima.

Os jornais colocavam em questão a necessidade do BOPE, questionavam seus métodos, estavam sendo visto como torturadores e essa imagem queimada era boa nos morros, trazia medo e receio a sua imagem, mas não era boa para grande parte da população e dos governadores, que próximo a época de eleição não gostavam de ter suas imagens atreladas a polêmicas desse tipo.

Estava ali para tentar manter as coisas amenas, sabia que o fato de ser mulher cooperava com isso – mas escolhia jogar o machismo da corporação para baixo dos panos. Tudo que precisava era manter as coisas em ordem: impiedosa com os soldados e um rostinho amigável para as câmeras.

A polícia em geral não era vista como um lugar de pertencimento das mulheres, o preconceito ainda era grande. Colocavam como impedimento a força física, a altura e até mesmo o fato de gestarmos; "sexo frágil" era a justificativa. Representávamos menos de 15% do efetivo policial, no BOPE a distorção era ainda maior: apenas uma mulher integrava o BOPE até então, e até onde Marina sabia, ela era a única que passou pelo Curso de Operações Especiais junto a outros Caveiras.

Portanto, estar ali, emplacando a cabeça da operação, era um grande feito para ela, e a pressão disso estava sob seus ombros desde o dia que foi movida, porém, naquele dia, onde a apresentação oficial ocorreria, estava mais calma do que nunca. Era ali que separaria os homens dos moleques e estavam tão preparada quanto nunca esteve.

Não vestia a farda, hoje o operacional seria interno. Enquanto caminhava firme pelos corredores da base via alguns olhares serem direcionados a ela; alguns discretos e outros nem tanto. Em seu interior admitia que gostava da atenção, amaciava seu ego saber que sua fama antecedia sua presença.

Ao se aproximar da quadra pela parte superior do alojamento viu que já havia cerca de cinquenta homens, fora o Coronel e o Capitão que tomavam a frente do pequeno palanque. Desceu a escada sendo analisada por eles, naquele momento deixou a Marina de lado e se apresentou como a pessoa criada pela polícia:

— Boa tarde, Senhores. Sou a Capitão Rodrigues, primeira mulher a passar pelo COE, condecorada duas vezes, conhecida pelos corredores como ceifadora de corrupto e, nesse momento, o maior pesadelo de vocês.


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Oi, gente!

Esse capitulo é apenas uma pequena apresentação e contextualização do momento que se encontra o desenrolar da história. 

Para todas as apaixonadas pelo Wagner Moura (e as politicamente incorretas apaixonadas pelo Capitão Nascimento): essa é pra vocês!


PONTO DE VISTA | Capitão Nascimento (Wagner Moura)Onde histórias criam vida. Descubra agora