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??? POV. - Maio 2010.

Tudo estava escuro. As paredes úmidas cheiravam a limo, as goteiras que caiam dos diversos canos formavam pequenas poças de água, a única pequena fonte de luz era a fresta por baixo da porta, porém, ainda assim, preferiamos ficar bem longe da mesma.

Gritos e mais gritos, nunca acabava. Eu tentava me distrair de alguma forma, nem que me perdesse em meus pensamentos. Olhando para o lado, vejo Haruka sentada no primeiro degrau da escada, a escada que levava até aquela bendita porta que nos prendia aqui, no porão.

A garota de cabelos extremamente claros e pele pálida estava olhando fixamente para uma poça de água formada em seus pés, como se através daquela água ela pudesse ver toda a verdade por trás desse miserável universo. Ou, talvez, um novo universo. Um que seríamos livres e não tratados como animais num abatedouro, lutando por suas próprias vidas, sobrevivendo.

Desvio o olhar da garota, olhando para minhas próprias mãos. Elas estavam raladas, consequência de tentar resistir a ser jogado aqui. Novamente. Pela terceira vez na semana.

Isso era tão injusto. As pessoas lá fora sempre juraram e sempre irão jurar que fazemos parte de uma família perfeita. A nobre, rica e perfeita Família Matsumoto. Quando, na verdade, somos tratados como lixo.

Sento-me no chão, começando a me sentir tonto. Apoio minha cabeça na parede atrás de mim e fecho os olhos, com todas as memórias horríveis voltando à minha cabeça.

O que seria uma família perfeita, afinal? Uma família onde todos se dão bem ou uma família rica que não se importa com mais nada além de status?

Começo a suar. Tiro aquele casaco pesado de meu corpo, deixando a mostra meus braços. Aqueles cheios de cicatrizes que eu sempre tive que esconder em roupas compridas, mesmo em um calor agoniante.

Sinto o olhar de Haruka em mim, então me viro para ela. Ela me olhava preocupada, como se lesse todos os meus pensamentos. E eu não duvido que realmente estivesse, gêmeos são conectados, não são?

Ela se aproxima e senta ao meu lado, apoiando sua cabeça em meu ombro. Eu seguro em sua mão.

Iremos superar isso juntos, irmãzinha.

Então, os gritos param, tudo fica em completo silêncio. Seguro a mão de Haruka, com medo, por mais que tentasse não demonstrar esse sentimento.

A porta se abre lentamente, revelando uma mulher alta, de cabelos escuros e pele clara.

Minha mãe.

Olhando para ela, era possível perceber que sua bochecha esquerda estava avermelhada, com leves marcas de dedos aparecendo. Ela havia levado um tapa em seu rosto. E eu, assim como Haruka, já sabia e conhecia muito bem quem era o agressor. Mas, infelizmente, não podíamos fazer nada.

Haruka se levanta e puxa minha mão com delicadeza, indicando para mim fazer o mesmo, e assim faço. Me levanto, ficando atrás de Haruka, que andava lentamente em direção àquela escadaria.

Mamãe, então, começa a chorar. Ela estende seus braços, os quais em poucos segundos eu e Haruka abraçamos e nos perdemos na profundeza de seu abraço.

“Me desculpem, minhas filhas, me desculpem.”

A culpa não é sua, mãe. Nunca foi.

Por mais que tentássemos pensar o contrário, por mais que tentássemos ficar com raiva, por mais que tentássemos lhe odiar, isso nunca dava certo.

Porque, novamente, a culpa de tudo isso acontecer nunca foi sua.

Você foi uma vítima, assim como nós.

The Twins, The Memories of The Past.Onde histórias criam vida. Descubra agora