Cartas de amor

1970

São Paulo, 6 de outubro de 1970.

  Querida Crystal.

   Faz tempo que não lhe escrevo, perdão. Ultimamente não tenho cabeça para isso, as provas estão chegando. Quem diria que esse ano me formo. Parece que foi ontem que me mudei para São Paulo. Como anda as coisas por aí?

Mairiporã, 15 de outubro de 1970.

Benjamin.

Nada demais aconteceu, como sabe eu e André estamos namorando. Mamãe disse que ele é encrenca para mim. Eu amo ele e sei que um dia vamos nos casar. Por que ela não vê isso? A culpa não é minha se meu pai foi embora e ela ficou sozinha. A culpa é minha também por não falarmos tanto assim ultimamente, não fiz muita questão de escrever. Faz dez anos que você se mudou, dez anos que não te vejo. Você não acha estranho tudo isso?
   Tínhamos oito anos quando você se mudou, tanta coisa mudou. Eu jurava que algum dia iríamos casar( você me prometeu antes de ir embora). Sinto falta  do meu melhor amigo.

São Paulo, 20 de outubro de 1970.

Cara Crystal.

Éramos apenas crianças, crianças tolas que faziam juras de amor. Sei que você ama o André, mas talvez sua mãe esteja certa. Só quero o seu bem, se ele te faz feliz fico feliz por você. Ainda não acredito que depois tantos anos nos não marcamos de nos encontrarmos. Acredito que mês que vem poderei ir visita-lá,  se você quiser é claro.
 Seria bom poder revê-la para relembrar os velhos tempos.

Mairiporã, 26 de outubro de 1970.

Caro Ben.

Aquela época foi boa, seria bom mesmo te ver. Tudo mundo sente sua falta, eles ficariam felizes em te ver. Seria um prazer recebê-lo em minha casa, acredito que minha mãe não iria se incomodar. Tenho novidades, sei que sou nova, mas o André me pediu em casamento. Como você sabe eu amo ele, então é claro que eu aceitei. Temo pela reação de minha mãe, eu queria que as pessoas que eu mais amo no mundo se dessem bem.

 
São Paulo, 30 de outubro de 1970.

Minha amiga Crystal.

Estou muito feliz por você, com o passar do tempo creio que sua mãe irá aceitar André. Como eu, ela também te ama e só quer o seu bem. Creio que eu esteja convidado para esse casamento, certo? Será um prazer conhecer seu noivo quando for para Mairiporã. Espero finalmente conhecer o cara que conquistou esse seu lindo e amável coração. Pretendo visitar você assim que possível, no começo do mês que vem acredito.
  Temo que não possuo muitas novidades de minha vida. Como você sabe irei seguir os passos do meu pai, não tenho muita escolha.
  Sobre minha vida romântica tenho  péssimas notícias. Recentemente terminei um relacionamento, para a felicidade do meu pai. De acordo com ele Cecília não era uma mulher de classe digna para mim. Minha mãe como sempre me apoiou, mas não final eu não amava Cecília. Ela era apenas uma distração para cobrir o vazio que tenho aqui neste vasto coração.  Me perdoe pela forma melosa que estou falando. Sinto que apenas com você posso falar abertamente.
 
         Adeus, seu amigo Ben.

Mairiporã , 10 de novembro de 1970.

  Querido Ben.

Esses dias que você passou em minha casa foi um dos melhores da minha vida. Fazia tempo que não me divertia assim, parecia os velhos tempos. Fico me perguntando porque não tinha vindo antes. Foram dez longos anos sem te ver, sem ver o meu melhor amigo.
Não entendo por que você foi embora tão as pressas aquele dia. O jantar de ensaio foi perfeito com você lá. Sei que parece que estou casando as pressas, mas é que o amo. Como você foi embora tão derrepente não houve tempo para mim pedir que fosse meu padrinho, seria uma felicidade tremenda em ter você do meu lado. Como papai foi embora queria que fosse você, meu amigo, a me levar até  o altar.

São Paulo, 18 de novembro de 1970.

Crystal.

Perdoe-me pela falta de conduta por deixar aquele jantar esplêndido. Me senti um pouco indisposto naquele dia e esqueci de avisar que iria voltar a São Paulo no mesmo dia que seu jantar. Certamente você já sabe qual será minha resposta ao seu pedido, seria um prazer ser seu padrinho. E temo que seja a última vez que nos veremos por muito tempo, com o final da escola me mudarei para Inglaterra. Nossas cartas se tornaram cada vez mais escassas, sentirei falta disso. Não sei quando irei retornar ao Brasil depois do seu casamento, se fosse pelo meu pai, nunca.