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Naamari sempre ouviu de sua mãe desde criança que o choro demonstra fraqueza, algo que vem do coração e não pode ser mostrado a ninguém, pois o coração era um órgão interno de nosso corpo e nenhuma alma poderia toca-lo ou vê-lo. Era algo frágil demais para um residente de Presa, pois a presa é o que faz um animal perigoso, é ela que mostra a ameaça que esse animal transmite. Mas quando a princesa de Presa observou uma cauda comprida, uma coluna reta e ameaçadora, garras pontudas e dentes afiados vindos de um animal tão majestoso, ela chorou.

Ou ao menos pareceu chorar, já que seus olhos marejados não permitiam lágrima alguma cair. Talvez ela estivesse chocada demais com a cena a sua frente, ou talvez a voz rouca de sua mãe estivesse pairando sobre a ponta de suas orelhas a impedindo de demonstrar fraqueza alguma, mas possivelmente ela já estava demonstrando essa fraqueza desde que seus olhos castanhos se encontraram na pelagem azul clara de um ser extinguido com quase três metros de altura levantando a Chefe de Coração e a deixando de ponta cabeça para examina-la.

— Está inteira? Dez dedos na mão, dez no pé... Está viva! Uma humana está viva! — A voz antes abafada pelos ouvidos da nativa de Presa aumentou gradativamente enquanto a mesma encarava Raya com os olhos tão arregalados quanto os dela. — Você viu isso Pengu? Eu consegui, nós salvamos eles!

O dragão soltou a Chefe e rodeou o pequeno espaço que existia no navio naufragado em êxtase. Parecia estar feliz por alguma conquista própria ou algo assim, Namaari supôs. A verdade é que a mulher estava chocada demais até para supor uma afirmação, ou seja, nada que ela pensasse agora poderia fazer sentido ou coesão.

   Namaari recuperou sua consciência apenas quando um alto suspiro de um ser místico foi ouvido na ponta de seu ouvido, indicando que ele, ou melhor, ela estava atrás da mulher.

   — E quem é você? — A voz feminina, um pouco rouca e velha perguntou ao pé do ouvido da princesa. — Oh, vocês são esposas.

   Foi mais uma afirmação, por mais que tanto Namaari quanto Raya desejavam que fosse uma dúvida. Infelizmente, em uma ocasião onde um ser milenar volta a vida em um mundo quase apocalíptico a última coisa que um humano pensa em fazer é negar uma junção conjugal ou algo do tipo.

  — Você... Você é a Sisu? Sisudatu? — A voz da Chefe de Coração foi ouvida em uma entonação um tanto quanto trêmula em comparação ao modo que ela falava com outras pessoas.

   Em resposta, as mulheres obtiveram um sorriso recheado de presas pontudas e ameaçadoras. Namaari facilmente teria ficado em alerta com isso se o ser a sua frente não fosse um dragão.

   — E vocês são humanas! — Ela respondeu animada. — Pensei que nunca mais veria algum, ou que se quer abriria os olhos novamente.

   Com essa fala, Sisudatu arregalou seus olhos como se quisesse entonar a hipérbole de sua frase, por mais que considerando a história do mundo, sua piada não fosse tão exagerada assim.

   — Eu não sei vocês, mas eu estou com uma fome... Bom, vou indo então. Nós nos vemos por aí.

   Namaari observou abismada a figura de quase três metros se virar de costas e começar a caminhar para a saída da carcaça do barco naufragado, coisa que alertou Raya já que antes do dragão pôr suas patas para fora do náufrago a Chefe de Coração o impediu.

   — Sisu... você sabe que dia é hoje? — Uma hesitação na voz da mulher ainda estava presente, como se ela sentisse medo de falar algo errado.

   — É quinta-feira. — Foi o que o dragão respondeu em uma voz zombeteira, quase rindo da cara da humana pela mesma não se lembrar nem o dia em que estavam.

ᴅᴇᴘ ʟᴀ | Rayaari/Rayamaari - Short FicOnde histórias criam vida. Descubra agora