Prologue.

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Londres, início do século XVIII.

“Vosso auxílio é necessário, Beatrix,” a voz de Finn permanecia calma, mesmo diante da urgência da situação. Logo estariam sem tempo, e a oportunidade de aprisionar Malgaroth se esvairia. Contudo, não desejava assustar a mulher à sua frente. “Eu sei que ainda nutris esperanças quanto a vosso marido.”

Um riso de escárnio ecoou da figura ao lado da janela, fazendo Finn e Beatrix voltarem-se para a presença elegante. Finn torceu o rosto para sua irmã, que apenas deu de ombros e retomou sua contemplação do exterior.

“Compreendei,” Finn virou-se novamente para Beatrix. “Não desejava que as coisas se desenrolassem assim,” falou sinceramente. “Mas vosso marido se foi, e a criatura que tomou seu corpo deve ser detida, antes que...” Finn sentiu um nó na garganta. “Antes que mais sangue inocente seja derramado,” concluiu com as palavras rasgando sua voz, recordando a tragédia da sua amada sendo estraçalhada diante de seus olhos.

Beatrix ouviu atentamente as palavras de Finn. Contudo, não se tratava mais de seu marido, já perdera seu amor há tempos. Agora era sobre sua filha. A mulher levou a mão ao ventre, pressionando-o como sinal de proteção e posse.

‘Seria capaz de ajudar a aprisionar o pai de vossa filha?’ Beatriz refletiu, seu olhar fixo na barriga.

“Irmão...” pronunciou-se a terceira pessoa na sala, finalmente desviando a atenção do campo.

A mulher trajava um vestido lilás pastel de seda, com mangas bufantes e corpete que moldava sua silhueta. Seus cabelos brancos deslizavam sobre seus ombros, contrastando com sua pele negra.

Beatrix já havia encontrado alguns feiticeiros ao longo de sua vida como bruxa. Mas aqueles dois irmãos com certeza tinham algo a mais. Não só pelos olhos de coloração roxa peculiar, nem pelos cabelos platinados naturais, mas pela aura de poder que emanava de ambos. Apesar da pouca idade, seus poderes rivalizavam com os de um feiticeiro de novecentos anos, especialmente quando estavam juntos. Beatrix pôde perceber pelo tom inquisitivo de Feyer que ela faria o papel da irmã impiedosa.

“Não percebes?” Feyer fechou seu leque lilás adornado e caminhou lentamente até Finn.

“A bruxa se aperfeiçoou pelo demônio,” Feyer pronunciou com um sorriso sutil.

Finn fitou a bruxa com surpresa. Esperava que ela negasse a acusação de sua irmã, ainda que raramente estivesse errada. Mas Beatrix exibia uma expressão culpada e envergonhada.

Finn levou a mão à cabeça e massageou as têmporas, exausto.

Suspirou.

“Irmã, eu lhe disse que lidaria com a bruxa sozinho,” sussurrou para Feyer, ignorando a revelação recente.

“Irmão, eu conheço vossa maneira de lidar com as coisas, sempre muito gentil e compreensivo. Mas não é mais tempo de gentilezas, Finn. Malgaroth está deixando um rastro de corpos por onde passa, e fostes vós quem decidiu ser o herói,” Feyer não mediu a irritação em suas palavras. Eles não faziam parte de uma convenção, não era responsabilidade deles deter Malgaroth, e nem mesmo deveriam se expor, ainda eram os filhos de uma exilada e de um caçador.

“Feyer, violência não é a resposta,” Finn falou pacificamente. “E nossa mãe iria querer que fizéssemos isso, ela amava os humanos, e antes de ser exilada era seu dever manter o mundo sobrenatural oculto, incluindo proteger os humanos de seres como Malgaroth."

Feyer revirou os olhos, mas não se opôs, mesmo discordando dessa ideologia. Beatrix e seu marido, libertaram um ser do qual não tinham conhecimento. Malgaroth não era apenas um demônio comum, ele foi o primordial.

“Eu sei o que pensam,” Beatrix dirigiu-se aos feiticeiros. “Mas não foi dessa forma, só queríamos proteger nossa família. Os humanos estavam tornando-se cada vez mais conscientes da nossa existência. Bruxos e Bruxas estavam sendo lançados à fogueira, o que deveríamos ter feito? Sentar e esperar chegar nossa vez, e a de nossos filhos?” A mulher indagou com fervor.

“É, e libertar um demônio que estava a centenas de anos aprisionado, foi uma ótima solução,” Feyer retrucou com sarcasmo.

“Eu entendo…” Finn ameaçou aproximar-se da bruxa, mas foi contido pela mão da irmã envolta em uma luva longa da mesma tonalidade que seu vestido. 

“Entende!?” Feyer bradou, incrédula, forçando o irmão a voltar ao lugar. “Ela e o marido libertaram um ser imortal poderoso, que não sente remorso, culpa, nada; que mata por puro divertimento, e como se isso não bastasse toda a desgraça,” Feyer elevou a voz. “Ela ainda engravidou da criatura.”

Feyer avançou um passo. “Diga-me, onde está vossa família?” Indagou à bruxa.

Beatrix abaixou a cabeça.

‘Estavam mortos, todos estavam mortos.’

“Sabeis que ele não vos ama, não é mesmo? Sabeis que o único motivo de estardes viva é esse feto em vosso ventre,” Feyer falou quase sussurrando, movendo-se lentamente em direção à bruxa.

“... sabeis que no mesmo instante que expulsardes essa criatura para fora, ele vos matará; assim como matou vossos filhos, lembram-se?” Feyer soprou no ouvido da bruxa. “Vós. Sois. Apenas. Uma. Incubadora.” Feyer sussurrou pausadamente.

Beatrix arregalou os olhos cheios d’água.

‘Talvez Feyer estivesse certa,’ pensou a mulher. ‘e talvez eu tenha sido uma tola por acreditar nas promessas de Malgaroth, talvez sua única opção seja ajudá-los, pelo menos assim terá chances de ver minha filha crescer. É o que resta agora.’

Beatrix agarrou com firmeza o tecido do vestido que cobria sua barriga.

Não, não posso perder minha menina.’

Feyer afastou-se da bruxa, exibindo um sorriso vitorioso. E Finn pareceu entender, pois não ficou surpreso com o que veio a seguir.

“Está bem, irei ajudá-los,” Beatrix rendeu-se. “De que precisais?”

“Vossos poderes. E, sobretudo, vossa filha.”

....

O que acharam do prólogo? Achei interessante trazer vocabulário de época, espero que tenham gostado. ✨️
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Agradecimentos a minhes betas 🤍🧡

𝐁𝐋𝐎𝐎𝐃 𝐆𝐄𝐌'𝐒 || 𝐓𝐄𝐄𝐍 𝐖𝐎𝐋𝐅Onde histórias criam vida. Descubra agora