FEVEREIRO, 2002

Começar a faculdade é muito desafiador. Afinal, quem disse que aos 17 anos você está pronta para sair de uma sala de aula "controlada", que exige de você a necessidade de pedir permissão para ir ao banheiro e entregar lição de casa, para um universo em que os professores entram em sala, colocam um número na lousa e saem? Pois é... e sabe a distância entre essa realidade e aquela? Dois meses! Em apenas dois meses eu saí do "trazer bolacha recheada para o recreio" para o "quer um teco", frase dita pelo cara da cadeira ao lado, obviamente me oferecendo alguma droga lícita ou ilícita.

Não faz muito sentido. Quem disse que eu estou pronta para decidir o que quero fazer da minha vida inteira tendo menos de 20 anos? Parece que a sociedade tem um critério um tanto deturpado sobre o que é juventude. Há um tempo atrás, lendo um livro de época (leia-se Jane Austen, claro), descobri que as pessoas aos 15 já estavam casadas, aos 20 tinham muitos filhos e aos 40 já eram idosas. Nessa realidade, é 'ok', totalmente aceitável exigir de uma adolescente saber o que vai fazer para o resto da vida, afinal de contas, ela só vai ter mais 20 anos para viver!

Mas, de verdade, não sentia ter maturidade nenhuma com meus 17 aninhos de experiência. E ali estava eu, entrando dentro de uma van para ir à faculdade. Pode até parecer besteira ter que pegar uma condução para ir, já que, a minha cidade nem é tão grande quanto uma metrópole, que exigiria muitos e muitos meios de transporte até chegar ao destino final. Ainda assim, é mais barato ir de van do que pegar ônibus, táxi, só que, muito mais caro do que ir de bicicleta.

Eu tentei convencer minha mãe de que seria uma excelente ideia pegar minha bicicleta e ir para a faculdade, no entanto, na minha primeira tentativa, fui atropelada na rotatória a apenas 500 metros do destino. O que fez com que eu faltasse aos primeiros dias de aula. Pois é, parabéns para Melissa! Excelente motorista sobre duas rodas. Fiquei pensando sobre como seria tirar carteira de motorista, e desisti na mesma hora. Entrei na van ainda vazia e me sentei ao fundo, coloquei os fones de ouvido e tentei me esconder em "algum lugar no caminho".

Estava ouvindo — de novo — a décima segunda faixa de Nevermind, quando algo chamou minha atenção. Muitas pessoas já tinham entrado e se sentado, sem que eu me despertasse da hipnose causada pela voz rouca de Kurt Cobain, mas dessa vez, algo me acordou. Ela entrou e veio em minha direção. Eu conhecia aquela camiseta. Fiquei encarando a estampa que parecia um quadro renascentista e percebi que só parei de encarar quando ela me cumprimentou.

— Oi, tudo bem?

Minha timidez sempre foi tão grande que apenas acenei com a cabeça e dei um sorriso. A menina de cabelos longos pintados de preto parecia que ia falar mais alguma coisa, mas foi interrompida por um grito que vinha da frente do veículo. Não era bem propriamente um grito, mas alguém falando muito, muito alto.

— É isso aí, tio Gê! Toca pra frente que hoje vai ser punk!

— Ela falou "punk"?! — e quando percebi, tinha falado isso em voz alta e automaticamente levo a mão à boca numa tentativa de me calar.

— Parece que foi mesmo, animada, né? — respondeu a menina ao meu lado. — É a Dani, ela é meio doidinha, mas é muito gente boa e uma excelente vocalista, como você pôde ver a potência da voz — ela respondeu antes mesmo que eu pudesse perguntar e acrescentou: — A propósito, eu sou a Larissa e você?

— M-Melissa...

— Prazer, Melissa! Vamos nos dar muito bem. Você gosta de grunge, eu de metal e a Dani de punk. É a combinação perfeita.

Continuei olhando intrigada, tentando entender como ela sabia do meu gosto por grunge e, de repente, olho para o bottom na minha mochila, a carinha feliz que entrega minha paixão por Nirvana, junto de um bottom escrito Pearl Jam. Então, faço as associações e me lembro da estampa de sua camiseta, era a capa de 'Century Child', o recente lançamento do Nightwish. Tudo faz sentido.

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