AGOSTO, 2002
Pois é, eu estava muito feliz e não conseguia parar de sorrir. Dani disse que parecia que eu tinha tido uma noite tórrida de amor e sexo, por causa da minha cara de besta. Só que não era nada disso, eu só estava feliz demais por duas coisas: 1 - eu tinha convencido as meninas a incluírem uma música do Silverchair no repertório; e 2 - eu finalmente tinha conseguido tocar o riff de 'Greedy Fly' usando o mindinho e sem enroscar em nada.
Tanto que passei todas as pausas do ensaio repetindo a mesma sequência. Dani olhava brava para mim toda vez que eu recomeçava a sequência de Mi e Lá. Só que eu não estava nem aí, se ela podia pegar a guitarra e fazer aquele riff do AC/DC toda santa vez, o que tinha de mal eu ter o meu "tique" de baixista também, né? Claro, nem de longe era um super riff ou solo do Flea (do Red Hot), na verdade, era bem besta e eu deveria ter vergonha de comemorar isso, mas, quem liga?
Estávamos prestes a repassar pela centésima vez "Zombie", do Cranberries, quando Mariana abriu a porta e se jogou na poltrona que ficava no canto da sala de ensaio. Esse era o novo passatempo da minha mais nova amiga. Poderia ser impossível e também improvável, eu conseguir fazer tantas amigas em tão pouco tempo e, além do mais, ter entrado para uma banda de rock. Minha mãe não acreditava e disse que pagava pra ver se eu teria coragem de subir em um palco com um monte de gente vendo.
Para minha sorte, Dani gostava tanto dos holofotes que eu me sentia confortável em tocar olhando para Lari, enquanto ela tocava bateria com suavidade. A presença de Mari era o mais próximo que eu já havia chegado de uma plateia e, apesar de pequena e conhecida, ainda assim era sempre um desafio.
— Mais forte, Lari! Com força, não dá pra fazer esse refrão tão xoxo assim, tem que ter peso na mão, peso, força! — Dani repetiu mais uma vez (essa foi a quinta), mas a média de vezes em que ela falava isso por ensaio era de dez a quinze.
— Estamos tocando pop rock, Dani, não é punk! Tem que ter pegada, não força... são coisas diferentes.
Eu balancei a cabeça concordando com Lari, que certamente era minha pessoa favorita da banda. Não que eu não gostasse da Dani, mas ela era, digamos, intensa demais para mim, que tenho uma personalidade mais amena. Por sorte, ela percebeu a minha 'vibe' e nunca me pressionou do jeito que faz com a baterista. Lari sorriu e deu de ombros, ela já estava acostumada. Afinal, as duas estudavam juntas desde o colégio e praticamente aprenderam a tocar instrumentos ao mesmo tempo, treinando e praticando ali naquele mesmo quartinho nos fundos da casa de Lari. Dani estudava Computação, ou, como ela gostava de dizer, Tecnologia da Informação. Alguma coisa que a deixaria rica no futuro, com certeza, fazendo minha profissão e a de Lari parecerem ofícios obsoletos desde os anos 1930.
— Já acabaram o ensaio? Quero tomar milk-shake, va-amos?! — Mari implorou.
E eu meio que estava torcendo pra isso acontecer, meus dedos doíam e a sede era imensa. Apesar de estarmos em agosto, o calor era atípico para aquela época do ano. Para mim, que sempre estava de calças jeans, All Star e camiseta, o calor parecia ser o equivalente a um forno elétrico, cozinhando suavemente minha pele de ébano e fazendo todos os cremes capilares que eu usava escorrerem pela nuca, dando a sensação de que tudo estava derretendo e descendo pelo pescoço.
Lari se levantou em um pulo e foi a 'deixa' que eu esperava para começar a enrolar os cabos. Terminei de me arrumar e Dani continuava tentando criar alguma melodia, já tinha um tempo que ela queria fazer músicas próprias para gravarmos uma 'demo' e tentarmos tocar no festival de Rock Feminino (que começou a rolar na cidade), porque eles só aceitavam bandas com som próprio.
— Vamos, Blondie? Só falta você — Mariana gritou da porta.
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Viu, deixa quieto...
RomanceAos 40 anos, a ex-baixista Melissa está encarando uma nova realidade: mudar de emprego depois de 25 anos trabalhando para o mesmo escritório de contabilidade. Tudo estaria bem com ela e suas duas gatas, exceto pelo fato de que seu mais novo chefe é...