Jogada ideal

Capítulo 29

Clarice Fowler

Uma onda de emoções contraditórias me atingiram ao saber que teria que reviver todo aquele teatro novamente. August e eu já tínhamos feito isso antes, e foi desgastante. Lembrei de como cada olhar trocado, cada sorriso forçado parecia roubar cada vez mais nossa autenticidade. Mas, por outro lado, não poderia negar que tivemos momentos memoráveis, tanto que eu me apaixonei por ele. Antes havia um propósito nessa farsa, agora parecia apenas uma exigência vazia e injusta. A exaustão tomou conta do meu corpo, eu só queria ir embora dali. Isso tudo só fez com que a tristeza que eu sentia se aprofundasse ainda mais. Ter sido afastada como capitã, ainda que temporariamente, foi um golpe duro. Uma ferida que ainda estava aberta e doía sempre que eu lembrava. Eu estava cansada de fingir, de sorrir mesmo querendo chorar, cansada de me sentir sozinha mesmo cercada de pessoas que, por muitas vezes, não se importavam em esconder que meu lugar não era ali com elas. Sem ter mais o que fazer naquela reunião com os treinadores, pontuei que depois eu conversaria com August e abandonei aquela sala, com passos largos e pesados, sentindo cada um deles como um fardo. Enquanto caminhava para fora do campus, parei por um momento para respirar e me acalmar. Minhas mãos tremiam ligeiramente, o trajeto para casa seria doloroso e repleto de pensamentos inquietos. Eu sabia que Agnes iria adorar a noticia, até imaginei o sorriso debochado da garota e suas palavras afiadas de desdém assim que soubesse que fui destituída. Cada detalhe daquela imagem mental me irritava profundamente, o que me deixava ainda pior. Caminhei depressa de volta ao alojamento, não queria correr o risco de ser vista em condições deploráveis. Cada passo parecia mais difícil que o anterior, como se eu estivesse caminhando contra uma maré invisível de decepção e frustração. À medida que o prédio se aproximava, meus pensamentos se voltaram para Samantha, minha melhor amiga e agora capitã. Senti uma ponta de alívio, pelo menos seria ela quem assumiria o meu lugar, o que tornava a situação um pouco menos terrível. Com esse pensamento, adentrei em casa, sentindo-me um pouco mais leve. O silêncio encontrado parecia ecoar minha própria solidão, confesso que esperava encontrar algum conforto em um rosto familiar, mas a casa estava vazia. Nenhum som, nenhuma luz acesa. Cansada depois de um dia longo, decidi que o mais adequado seria deitar e tentar processar tudo, absorver cada informação. Foi então, que no quarto, percebi que minha colega de dormitório também estava lá.

— Clarice, finalmente você voltou! O quê aconteceu lá? – Samantha levantou de sua cama, agitada e preocupada. — Deu tudo certo? 

Sinalizei que não com a cabeça e larguei meu corpo quebrado na cama. 

— Eles querem que August e eu voltemos com a mentira de que estamos juntos para que as pessoas pensem que o que aconteceu na festa foi porque ele estava me defendendo.

Samantha ficou boquiaberta. 

— Você está falando sério? Isso é meio louco, Clarice! – Ela ficou revoltada. — Aposto que essa ideia idiota veio dele, garoto imbecil! Então quer dizer que ele e o babaca do amigo dele perdem o controle e a merda só respinga em você? 

Contei a ela que a ideia tinha sido da senhora Thompson e assisti minha amiga ficar cada vez mais irritada, falei também que nem August queria voltar com essa farsa, nós dois sabíamos o quanto isso foi terrível da primeira vez. 

— O que me machuca mais, Sam, é que depois de tudo que aconteceu, fui substituída como capitã e agora tenho que fingir que estou com August, depois daquela briga horrível!! 

— Isso é outra coisa que me deixa revoltada, eu não acredito que ela me colocou nessa posição!! – Falou, sobre ter assumido como a nova capitã. — Eu nunca quis assumir o seu lugar, nunca quis tomar essa responsabilidade pra mim!! Ainda mais sabendo que só virei porque você foi afastada! 

— Você era minha co-capitã, natural que te colocassem no meu lugar e eu fico feliz, de verdade, que tenha sido você. Já pensou se fosse, sei lá, a Agnes? – Falei e ela riu, depois simulou calafrios. — Mas eu entendo, é estranho pra mim ver outra pessoa em uma posição que sempre foi minha. 

Fiquei conversando com Samantha, sua companhia leve e divertida fez com que eu pudesse ver toda situação por um outro ângulo. Apesar de ter sido recolocada de sua posição inicial, ela me garantiu que toda decisão e direção que envolvia a equipe continuaria sendo tomada por mim, até que, de fato, o lugar que me foi tirado temporariamente fosse devolvido.