Ainda é possível ouvir os batimentos altos no ouvido, conforme a mão que cobria sua boca lentamente deixa que respire novamente, com o cheiro de cigarro desagradável ainda presente. O misto de sensações é uma novidade que não conseguiria classificar nas coisas que têm acontecido desde o início do colegial, mas depois das inúmeras garrafas de bebida, ela não deveria estar surpresa.
Alena se levanta quase que num pulo, se mantendo de costas para a pessoa, sem conseguir organizar seus pensamentos em todas as coisas que aconteceram nos últimos minutos, como um efeito dominó em sua mente, recheada de informações que assustam.
- Por nada. - O dono da voz enrouquecida se anuncia, chamando a atenção dela para seu rosto pela primeira vez.
A imagem que toma os olhos da garota poderia ser considerada de outro mundo, pelo menos para o que faz parte da estética da cidade em que passou a vida toda. Ele dá mais uma tragada no cigarro que tinha em mãos, antes de se tornar apenas uma bituca na ponta dos dedos, que ele prontamente apaga no chão, mas sem deixar o lixo como prova. O que mais parece ferver a adrenalina no corpo dela vai além das regras que estão sendo quebradas tão facilmente, como se não houvesse tanta rigidez assim. Na verdade, revisitar os traços do rosto dele a deixam completamente perdida, por Ophelia ter o classificado como alguém que se deveria manter distância.
E ele tem mesmo um rosto de problema. Um rosto lindo de problema.
Alena se sente desorientada, conforme ignora a figura dele e aperta o passo para longe do jardim e da capela, sentindo as unhas curtas apertarem a própria pele sem ter percebido antes.
Yoongi prontamente se levanta da posição em que estava, se atentando ao teto baixo do espaço embaixo da escada, por mania passando o dedo no isqueiro, conforme observa o movimento do fogo, com a mente distante.
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- Onde você tava?
Ophelia a questiona, fazendo com que tudo se misture em sua cabeça, sabendo que a reposta não poderia ser dita tão fácil assim, na frente de tantas pessoas na fila da cantina e justamente com Jimin do lado.
- Você sabe. - Alena tenta contornar a situação, os olhos pedindo desesperadamente para que a amiga simplesmente não a questionasse nesse momento. Por sorte, e principalmente pela relação próxima, Ophelia se limita a acenar com a cabeça e incluir a outra na fila, que já se torna pequena.
Taehyung ainda observa a paisagem além dos vidros da cantina, enquanto mastiga devagar, um pouco apreensivo com o que virá nos próximos anos, já que há uma promessa que exige dedicação nos estudos e ele nunca foi tão bom assim.
- Sabe o que eu estava pensando? - A voz de Nicole tira Taehyung do transe. - Tenho que ter um atestado por mais tempo pra poder fugir das extracurriculares.
- Não tem nada que queira fazer?
- Não temos skate e eu detesto xadrez, desculpa.
Ele deixa um riso suave sair, por ela saber bem a relação que ele tem com o xadrez e ser tão fascinado pelo jogo.
Antes que pudesse terminar o pão recheado em sua bandeja, a movimentação para além da entrada da instituição prende os olhos do garoto. Assim como prendeu no primeiro dia os olhos de todos, com a chegada de um mustang vermelho que se recusava a sair da frente da escola e todos estavam ávidos para saber quem seria o dono.
Os primeiros dias passaram voando mas ainda pairam muitas dúvidas sobre o dono do mustang vermelho, já que dele só se sabem o nome e alguns rumores sem confirmação alguma.
Yoongi caminha com calma até o carro, a jaqueta de couro por cima do fardamento poderia fazer ele se confundir com qualquer adulto vindo da capital, já que na cidade não se via tantas expressões de estilo, nada além de tons frios nas roupas e tecidos que poderiam cobrir o suficiente.
Quando o sol já não adentra mais as janelas do local e tudo que sobra são luzes artificiais e um tom de azul melancólico nas salas, Alena se despede da professora de Balé, junto a outras garotas que em sua maioria já participavam das aulas de anos anteriores. Mesmo com a dificuldade de principiante, Alena sente que as coisas não parecem mais tão assustadoras quanto a primeira impressão que teve sobre o colegial.
No corredor e nas escadas, o fluxo de estudantes pode ser comparado com o horário de almoço, conforme a maioria gostaria de estar indo para a casa após um dia inteiro de estudo e esportes, mas sendo direcionados a capela da escola, pequena e rodeada de um jardim simples.
Alinhadas na segunda fileira dos bancos da capela, Ophelia e Alena veem o lugar ao lado delas ser ocupado por outras pessoas com quem não têm tanto contato.
- Onde o Jimin sentou? - Ophelia sussurra, buscando o rosto dele em algum outro assento, enquanto Alena fica em silêncio, pensando que talvez fosse culpa dela a distância que ele traçou e para falar a verdade, ela nunca gostou de mudanças assim.
O que fazer sobre isso acaba pesando um pouco nos pensamentos dela, que sabe a necessidade de encarar situações mais desconfortáveis agora. Deve fazer parte desse novo momento, em que não é possível se esconder por trás da saia de sua mãe sempre que algo for complicado demais. E mudanças assustam.
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O leve ronco do motor do carro ainda é inaudível dentro da loja de conveniência, especialmente vazia no meio da semana, com o volume do aparelho de som mais alto que o habitual, conforme Namjoon bate os dedos contra o balcão vermelho do estabelecimento, no ritmo da musica. Com os passos lentos, parecendo explorar o ambiente com cuidado, Yoongi passa pela entrada, encarando todo o cenário que costumava ser tão conhecido e confortável. A sensação de nostalgia o engole, sem perceber em que momento exato seu peito passou a bater tão forte, como se voltasse a ser apenas um menino.
Quando o primeiro levanta os olhos, se mantem imóvel por alguns segundos, os dedos sem conseguir mover ao ritmo da música como antes e o misto de sensações o deixando impactado o suficiente para não conseguir ao menos se levantar da banqueta por trás do balcão.
- Filho da puta. O que você tá fazendo aqui?
O tom de voz de Namjoon é completamente oposto ao que as palavras poderiam significar, quando segue num impulso inexplicável na direção de Yoongi e o abraça com força.
Há um contraste na altura e no estilo de roupas que usam, afinal, no clima forte da cidade pequena ninguém ousaria usar a jaqueta de couro, ou o coturno bem fechado nos pés. Mas Namjoon não percebe o quanto eles não são mais nada parecidos fisicamente, como costumavam ser antes, com roupas parecidas, cortes de cabelo iguais e até bicicletas combinando.
- Vim comprar um cigarro. - A voz dele abafada pelo abraço é quase chorosa, quando deixa essa resposta para uma pergunta retórica, é possível ouvir o riso soturno que escapa da voz de ambos.
Ao se soltarem do abraço, se encaram um pouco.
- A gente precisa beber!
Yoongi apenas concorda com a cabeça, um pequeno riso nos lábios, logo se apoiando em uma prateleira de salgadinhos próxima a entrada, na mesma maneira que estava há dois anos atrás.
Em 1986...
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.Essa é a primeira vez que escrevo em narrador observador, então estou ciente que existem muitas coisas que poderiam melhorar, de qualquer maneira espero que estejam gostando dessa escalada inicial da história, o melhor ainda está por vir!
O que estão achando dos acontecimentos até agora? Parece que muitos deles têm seus segredos e apreensões... Alguma teoria?
Irei atualizar em breve!!
With love, M.
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Kids Of Yesterday
FanfictionUma cidade pequena no auge dos anos 80, um grupo de adolescentes cuja maior habilidade é guardar segredos, cujo maior medo é crescer. As crianças de ontem não são nem um pouco diferentes, mas você já sabe disso. 2023 © 𝑪𝒂𝒏𝒄𝒂𝒍𝒍𝒎𝒆𝒉𝒐𝒏𝒆𝒚 ...