Terra firme

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Ah, que saco! Estamos sentadas num banco a um tempão esperando o Uber, eu tô morta! Não aguento mais o aeroporto!
A comida é ruim e injustamente cara, além de que tem vários homens de preto que falam em uma espécie de celular, eles são estranhos.
Pelo menos o avião não caiu e até agora ninguém tentou me sequestrar (pesquisei um pouco e vi que isso é muito comum), mas estou de olho nos homens de terno. A primeira e última vez que estive em um aeroporto antes dessa foi quando eu fui para São Paulo, aos 7 anos, e para a surpresa do total de zero pessoas eu dormi a maior parte do tempo então não me lembro de muita coisa.
Depois de muito, muito, muuuuuito tempo o Uber finalmente chegou, nunca vou me esquecer do nome daquela motorista desgraçado

-olá, é o Roberto Dias?
-sim senhora Renata, pode entrar

Mas é claro que podemos entrar, estamos pagando! Maldito Roberto Dias, vou guardar esse dia para sempre em minhas memórias mais rancorosas!
Estava tão cansada que só percebi que aquela era a hora certa para perguntar á mamãe  onde estávamos indo depois de uns 4 cochilos

-mãe... eu sei que a senhora tem muitas coisas pra resolver mas... para onde nós vamos?
-MEU DEUS, eu não te contei?
-n-não...
-ah filha, eu estava tão ocupada com as coisas do divórcio que me esqueci completamente de dar a atenção que você merece
-tá tudo bem mãe, eu estou ótima
-bem, de qualquer forma estamos indo para a casa da vovó Fátima

Fátima? Vovó? Demorei uns 10 segundos para puxar esse nome do fundo das minhas memórias esquecidas, e quando finalmente consegui me lembrar meus olhos se arregalaram de desespero

-o-oque?... ela te rejeitou no momento que você mais precisava... Ela ME rejeitou! Se ela virou as costas pra você naquele dia por que acha que ela vai nos acolher agora?

Eu fui falando cada vez mais rápido e meu desespero era claro.

-Alissa Alencar, não seja tola, a sua avó não é um monstro e com certeza vai nos ajudar!

Mamãe parecia estressada, mas imagina eu? Eu mereço pelo menos ter certeza de que vou ter uma cama pra dormir!

-você arrancou a minha vida de mim, não vou confiar em você e muito menos na velha coroca que você chama de "vovó"

Ok, eu admito que exagerei um pouquinho no tom de voz, mas eu estava certa... né?
Um silêncio constrangedor tomou conta do carro, e o maldito Roberto dias achou que seria uma ótima ideia ligar o rádio e tocar música pop.

-poderia por favor desligar isso?

Mamãe ficou mais estressada ainda (ela odeia música pop!).
Algum tempo depois chegamos ao nosso destino; Acho que só estive lá uma vez na vida, aos cinco anos joguei ovos e papel higiênico nas paredes externas como forma de protesto por ela ter largado a minha mãe, era uma casinha azul bebê com detalhes em branco e um teto de telha laranja.
   Enquanto encarava a casa e ouvia o som do carro nos deixando sozinhas, percebi uma coisa que nunca tive tempo de pensar, não sei como é o rosto da minha avó materna! Tudo o que sei é que ela se chama Fátima e é minha avó, depois disso comecei a suar, minha respiração ficou difícil e comecei a ver borrões pretos, tudo o que eu sabia sobre a veia além disso era que eu deveria ficar longe dela e de seu mau caráter.

-m-mãe...

-sim meu amor?

-não acha melhor voltar pro SP, rasgar as folhas de divórcio e ser feliz?- dei a sugestão de forma tão natural que até pareceu uma pergunta cotidiana.
   Mamãe ignorou minha pergunta e finalmente tocou a campainha, que ecoou um som estridente.
   A porta velha se abriu revelando o rosto de uma senhora que para a minha surpresa parecia gentil
-boa tarde, no que posso ajudar?
Minha mãe franziu o senho, ela parecia perplexa, como se algo estivesse muito errado
-a senhora... está diferente
-desculpe a grosseria, mas eu conheço vocês?
Foi nesse momento que mamãe começou a se desesperar
-ai meu Deus... senhora, você mora aqui a quanto tempo?
A senhora franziu o senho
-há quatro anos e meio, por que?
A maldita velha vendeu a casa!

Bom dia flor do diaOnde histórias criam vida. Descubra agora