Capítulo 3 - Eco.

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"A fulana me disse" — ela fala com a voz mais feliz, quase rindo — "que a fulaninha vai ser para mim tudo aquilo que você não foi."

Tudo aquilo que eu não fui. O eco se repete todos os dias na minha cabeça. Já fazem anos.

Ela disse essa frase sorrindo, muito feliz, com a voz feliz. Toda feliz. Eu nunca consegui fazer ela falar assim de qualquer coisa que eu fiz ou disse. Nem de mim.

Eu, a filha. Eu que tentei tanto, mesmo estando em fragmentos e constante sofrimento, passando por coisas que alguém na minha idade nunca deveria ter passado... Eu não consegui. Eu, que deveria ser a pessoa de quem ela falaria daquela forma. O orgulho dela. A vitória dela. Eu.

E aquela frase, aquela maldita frase, me corroeu mais um pouco. Tocou lá no fundo, na garotinha para a qual ela nunca tinha tempo e que queria desesperadamente ser amada por ela. Na adolescente insegura que só queria agradar a mãe porque achava que, se fizesse isso, talvez fosse amada. Na adolescente que se revoltou, mas ainda assim continuava tentando ser algo de que sua mãe pudesse ter orgulho, alguém que ela pudesse amar e gostar de estar perto. O eco vai e volta.

E eu observo o tempo que nunca foi meu sendo dela. A atenção que eu nunca tive, o cuidado que deveria ter sido meu. Tudo que eu lutei tanto para ter e merecer, mas não é meu e sim dela.

O eco grita, me lembrando que talvez ela tenha me criado e me dado suporte financeiro, mas eu sou apenas o fardo. A escolha da qual ela provavelmente se arrependeu. Será que ela me ama mesmo? E se ama, acho que não ama mais do que ama a outra.

O eco grita. Eu choro. Eu sou adulta. Eu não deveria me importar. Eu sobrevivi a todo o resto. Ainda estou sobrevivendo. Eu tenho o suporte financeiro, por que ainda deveria me importar com o resto? Por quê? E daí se ela está ocupando o lugar que deveria ter sido meu? Quem se importa?!

O eco grita de novo. O eco me traz de volta todas as inseguranças a cada vez que ela fala dela e faz coisas para ela.

O eco grita absurdamente alto, e mesmo aos 24 eu respondo baixinho que ainda me importo, mesmo sabendo que eu não deveria mais me importar.

Eco.

Textos soltos - Os espinhos da Rosa.Onde histórias criam vida. Descubra agora