Cicatrizes

II

O sol abrasado castiga minha pele nesta manhã escaldante, tingindo o céu de um azul deslumbrante. Seu brilho intenso e calor insuportável parecem atravessam até mesmo o boné que protege minha cabeça, deixando-me com a sensação de que estou literalmente queimando sob sua luz implacável. O suor escorre pelo meu rosto, misturando-se com o cansaço que já começa a se instalar em meu corpo.

Hoje é domingo. – Então é, isso mesmo, as aulas voltaram amanhã! – Há algumas semanas, fiz uma promessa à minha mãe de ajudar na ação solidária da igreja. No entanto, jamais imaginei que enfrentaria tantos desafios e dificuldades como os que se apresentam diante de mim agora.

A cada domingo, os membros da igreja se reúnem para distribuir comida aos moradores de rua e às pessoas necessitadas que se aglomeram em filas diante das coloridas barracas montadas em frente ao templo. Servimos a comida em recipientes de plástico e sucos em garrafinhas também de plástico.

Hoje, cumprirei minha promessa e trouxe minha amiga Dinah para me acompanhar nesse trabalho. Apesar de sua natureza trapalhona e desajeitada, sua presença divertida e espontânea traz um alívio bem-vindo ao peso do momento. Dinah é minha melhor amiga, juntamente com Benoni, ou Ben, como chamamos.

– Lauren, joga mais para cá, acabaram as marmitas da minha barraca. – Grita ela sem cerimônia, como sempre fazendo questão de se fazer ouvir.

– Sua barraca é do meu lado! Para de gritar. – Respondo, tentando manter a calma, mas já visualmente estressada, diante da agitação e do calor sufocante que nos rodeiam.

Peguei mais potes e garrafinhas de plástico contendo comida e bebida e entreguei a Dinah, que me agradeceu com um sorriso caloroso. Observando-a cuidadosamente organizar os recipientes, garantindo que tudo estivesse preparado para a distribuição.

Após ter entregado a ela, retornei à minha barraca para finalizar a distribuição das marmitas restantes que ainda estavam na minha cesta.

Conheci a Dinah quando tinha onze anos, e ela se tornou minha primeira e única amiga verdadeira até o momento. No meu primeiro dia na nova escola, ela se sentou ao meu lado e pediu emprestada a minha caneta. Desde então, essa caneta nunca mais voltou para mim, e até hoje continuo aguardando o seu retorno. É engraçado pensar que conheci minha melhor amiga em um "assalto de canetas", mas foi assim que nossa amizade começou, um início inusitado para uma amizade tão especial.

E no ano passado, tive o prazer de conhecer o Ben, um garoto encantador que se tornou meu vizinho. Ele chegou de Viena após o divórcio de seus pais e decidiu morar com seu pai e sua avó aqui em Graz. A casa da avó dele é convenientemente ao lado da minha, e com essa proximidade, nos tornamos vizinhos quase que instantaneamente.

No início, todos os dias, que eu saia de casa Ben já estava lá fora como se me esperasse para irmos juntos para a escola. Nós andávamos um ao lado do outro em completo silêncio. Eu sempre me perguntava como ele conseguia calcular perfeitamente o horário da minha saída de casa.

Em uma manhã comum, eu não percebi que meu tênis estava desamarrado, e foi ele quem gentilmente me alertou sobre isso. A partir desse momento, nossas conversas se expandiram além do simples "bom dia" matinal. Passamos a compartilhar nossas histórias, sonhos e pensamentos no trajeto para a escola. Hoje em dia, é um hábito diário trocarmos palavras, fortalecendo nossa amizade com cada nova conversa.

Dirigi-me até a barraca de Dinah prontamente para auxiliá-la, notando que minha cesta que tinha as marmitas já estava vazia. Enquanto entregavamos as últimas marmitas que faltavam, observei como pouco a pouco elas foram se esgotando, e as pessoas começaram a se despedir, deixando o local mais tranquilo. O relógio do celular já marcava cerca de 11 horas, e tanto eu quanto Dinah estávamos exaustas após a intensa atividade de distribuição.
Após o término da distribuição, finalmente pudemos nos permitir um momento de descanso, sentando para recobrar as energias.