|002|- Vislumbre do futuro

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Sair do orfanato era algo inevitável, algo que aconteceria cedo ou tarde. No entanto, o que Ja-eun não contara a ninguém foi que, por ironia do destino ou por uma rara sorte, ela fora agraciada com um presente inesperado. Segundo o que dizia o documento, graças aos seus esforços metódicos e à sua dedicação incansável à dança, a companhia de dança da Hyerim High School para Artes e Talentos presenteou-a com uma das raras e cobiçadas bolsas de estudos ofertadas pela escola.

Quando recebeu a carta, Ja-eun mal podia acreditar. O envelope elegante, com o selo da Hyerim High School em dourado, destacava-se entre os documentos antigos e desgastados do orfanato. Com as mãos trêmulas, ela abriu o envelope e leu as palavras que mudariam sua vida para sempre. Ela, uma garota órfã e sem recursos, havia sido convidada a concluir seus estudos na mais prestigiada escola de ensino médio da Coreia.

A Hyerim High School para Artes e Talentos era um lugar que Ja-eun só conhecia de histórias e revistas. Frequentada por jovens nascidos em berços de ouro e herdeiros de grandes conglomerados, a escola era famosa por suas instalações de última geração e um corpo docente composto pelos melhores profissionais do país. Cada aluno tinha acesso a oportunidades inimagináveis, desde intercâmbios internacionais até apresentações em palcos renomados.
O presente inesperado parecia um sonho distante. Ja-eun se perguntava como seria estudar em um lugar onde o talento e a paixão pela arte eram celebrados, em vez de marginalizados. A perspectiva de ter acesso a recursos e oportunidades que sempre lhe foram negados era avassaladora. Ela não só teria a chance de concluir seus estudos em um ambiente estimulante, mas também poderia aprimorar suas habilidades na dança, algo que sempre foi sua única fuga e paixão.

A carta detalhava a oferta de bolsa integral, cobrindo todas as suas despesas - matrícula, mensalidades, uniforme e até mesmo materiais de dança. Havia também um pequeno auxílio para despesas pessoais, algo que Ja-eun nunca tivera antes. Ela se viu imaginando como seria ter uma sala de aula iluminada e estúdios de dança com espelhos que não estivessem rachados. O sonho parecia mais real a cada palavra que lia.

Apesar da excitação, Ja-eun não podia deixar de sentir um calafrio de medo. Ela seria uma das poucas sortudas capazes de conseguir o impossível. A integração das bolsas era um projeto muito recente, e isso a fazia se sentir como uma pioneira em um terreno desconhecido. Sabia que ao entrar lá, não veria seus colegas de sempre, mas futuros líderes e herdeiros de grandes fortunas. As salas de aula estariam repletas de jovens acostumados ao luxo e ao privilégio, diferentes dela em quase todos os aspectos.

Ja-eun sabia que precisaria ser cuidadosa. Certamente, todos, se não a maioria, repudiam o fato de haver alunos de classe baixa vivendo entre eles. Ela precisaria provar seu valor constantemente, não apenas por seu talento, mas também por sua determinação e resiliência. A pressão para se destacar seria imensa, mas Ja-eun estava acostumada a lutar por seu lugar no mundo. E agora, com essa oportunidade dourada à sua frente, estava determinada a agarrá-la com todas as suas forças.

Jae-eun balançou a cabeça, afastando pensamentos desavisados. Agora não era hora para distrações. Agora que era maior de idade e fora praticamente expulsa do lugar onde vivera, sem chance de retorno, encontrar um lugar para viver era uma prioridade máxima. Infelizmente, seu emprego seria um problema, já que estaria o dia todo na escola e não teria tempo nem disposição para empregos de meio período.

Ela podia não saber exatamente como a escola funcionava, mas tinha certeza de que não pegariam leve com ninguém, independentemente de quem fosse seu pai ou de que conglomerado fosse herdeiro. As aulas e os treinos de balé tomariam toda a sua atenção e energia. O auxílio financeiro ofertado pela escola veio em boa hora. Com ele, o pagamento do aluguel não seria um problema e, se Jae-eun fosse cuidadosa, até sobrariam alguns trocados para emergências.
Comida não era uma prioridade para ela. Podia tomar um café da manhã simples enquanto ia para a escola - seu estômago não era exigente - e aproveitar o almoço oferecido pelo local. Seu jantar também era bastante simples, nada com que se preocupar. Adaptar-se a essa nova realidade exigiria disciplina, mas Jae-eun estava determinada. Ela havia superado muitas adversidades para chegar até aqui e não permitiria que novas dificuldades a impedissem de aproveitar essa oportunidade única.

Suspirando, ela abriu a porta da loja de conveniencia. Sua chefe, a Sra. Lee, estava debruçada sobre o balcão, fazendo sua características palavras cruzadas. Sem levantar o olhar, ela disse:

- A velha não perde tempo mesmo. Mal podia esperar pra chutar sua bunda.

- Eu já esperava por isso. Aguentei o quanto pude. Não é exatamente um problema, já estou procurando um lugar. - Colocando sua pouca bagagem na área de armazenamento, Jae-eun passou o uniforme pela cabeça.

- Você é forte, garota, mas isso não significa que não deva cuidar de si mesma. - Sra. Lee finalmente levantou o olhar, sua expressão endurecida suavizando ligeiramente.

Jae-eun deu um meio sorriso. - Eu sei, Sra. Lee. Vou encontrar um lugar em breve. A bolsa de estudos vai ajudar bastante.

- Só espero que encontre logo. Dormir na rua não é seguro, especialmente para alguém como você. - A Sra. Lee voltou ao seu passatempo, mas seu tom de voz mostrava uma preocupação genuína.

- Obrigada, Sra. Lee. Prometo que vou me cuidar. - Jae-eun sentiu uma onda de gratidão pela chefe, que sempre demonstrou um exterior duro, mas com um coração compreensivo.

Jae-eun começou a sua rotina de trabalho, organizando as prateleiras e atendendo os poucos clientes que entravam. Enquanto trabalhava, seus pensamentos vagavam, refletindo sobre o que precisava fazer para se estabelecer antes que as aulas começassem na Hyerim High School.

Quando a loja ficou tranquila, a Sra. Lee chamou Jae-eun para o balcão.

- Sente-se um pouco, menina. Sei que está passando por muita coisa.
Jae-eun obedeceu, sentando-se em um dos banquinhos do balcão. A Sra. Lee colocou uma xícara de chá na frente dela.

- Você tem um plano? - perguntou a Sra. Lee, observando-a atentamente.

- Vou procurar um quarto barato para alugar. Com a bolsa, acho que consigo me sustentar, pelo menos por enquanto. E vou ver se consigo algum bico nos finais de semana. - Jae-eun deu um gole no chá, apreciando o calor que ele trazia.

- Bem, você é uma garota esperta e trabalhadora. Tenho certeza de que vai conseguir. - A Sra. Lee sorriu levemente. - E se precisar de alguma coisa, não hesite em me procurar. Tenho alguns contatos que podem ajudar.

Jae-eun ficou surpresa e tocada pela oferta. - Muito obrigada, Sra. Lee. Você não sabe o quanto isso significa para mim.

- Ah, pare com isso. Só quero ver você bem. Agora, volte ao trabalho antes que eu me arrependa de ser tão boazinha. - A Sra. Lee deu uma risada breve antes de voltar às suas palavras cruzadas.

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