Capítulo 1

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Acordei com a voz alta da minha sogra nos dando boas-vindas com um grito animado. Vitor riu baixinho ao meu lado enquanto retirava o cinto e praticamente saltava do carro para abraçar sua mãe, levantando-a do chão em um forte abraço. Thai sempre seria uma mulher linda, seus longos cabelos castanhos eram a única característica que a diferenciava de seus filhos, porque o enorme sorriso e a atitude positiva eram definitivamente uma herança do seu lado da família. Seu falecido marido era carrancudo por fora e doce por dentro, com os olhos azuis profundamente irritados e os curtos cabelos loiros em um eterno corte militar.

Sai do carro e me juntei a eles em um abraço em família. O rosto dela se iluminou ao me receber, enquanto dizia:

— Que saudades de vocês! — ela nos apertou mais uma vez antes de nos soltar — Parece uma vida que não nos vemos!

— Mãe — Vitor a repreendeu docemente — três meses atrás você estava conosco em São Paulo.

— Não, três meses atrás eu estava em um apartamento sozinha enquanto vocês trabalhavam em São Paulo — a culpa cruzou os olhos de Vitor antes de suas bochechas corarem levemente — Mas agora, vocês estão aqui e estão de férias comigo!

— Por que não guardamos nossas malas e vamos comer algo diferente? — perguntei, passando meu braço pela cintura de Vitor quando nos afastamos, intercedendo e salvando-o de sua mãe — Estou morrendo por um bom jantar, amor.

— Vocês nem mesmo pararam na estrada? — ela nos acompanhou até o porta-malas do carro.

— Eu não sei, dormi o caminho todo — sorri, agarrando uma mochila e passando para ela, antes de pegar outra mochila, deixando as duas malas para ele.

— Eu parei e comi um salgado no carro mesmo — Vitor deu de ombros ao fechar o carro e nos seguir para dentro — Não vou recusar um bom restaurante e um bom vinho, o que tem em mente?

— Italiano — respondi rapidamente — Eu quero massa e massa e massa, por favor.

— Eu conheço o lugar perfeito — ela deu um pequeno pulinho de animação, sua alegria a deixando ainda mais jovial, seu vestido florido flutuando ao seu redor enquanto andava.

Após nos estabelecermos, voltamos para o carro. No caminho, Thai nos contou sobre todas as novidades e fofocas de seu grupo de leitura, crochê, dança e pilates, expressando cada mínimo detalhe com a animação de uma criança descobrindo um pote de doces. Era gratificante estar na presença de uma mulher tão forte, mesmo após passar por tantas adversidades, ela permanecia radiante, uma mulher viva.

Chegamos na linda cantina italiana e nos sentamos em uma mesa ao canto, permanecendo em silêncio e ouvindo todas as histórias dos últimos dois meses, até Thai perceber nossos sorrisos discretos e respirar fundo dizendo:

— Estou aborrecendo vocês com minhas aventuras de senhora.

— Nunca — peguei sua mão sobre a mesa — sua vida está bem mais animada que a nossa.

— Nós só sabemos trabalhar e dormir — Vitor completou — Você está com tudo, né mãe? Eu deveria perguntar sobre namoradinhos?

— Vitor! — bati levemente em seu peito o repreendendo. Thai corou levemente, seu sorriso se tornando mais discreto — Espera! Eu acho que tem alguém...

— Não — eles falaram ao mesmo tempo. Vitor a olhou exasperado enquanto ela corava mais profundamente.

— Oh meu Deus, com certeza tem! — ri alto, me animando — Você vai me contar tudo, é uma ordem!

— Me matem... — Vitor acenou para o garçom.

— Amanhã — ela sussurrou — eu prometo.

— Eu vou cobrar! — sussurrei em retorno antes de pedirmos nossas comidas.

Duas garrafas de vinho depois, ambos chamavam atenção de todo o local com sua conversa alta e risadas estridentes. Eu confortavelmente observava o desenrolar antes de Thai se levantar para ir ao banheiro, me deixando com um namorado dengoso e animado.

— Eu te amo — ele puxou minha cadeira até meu corpo estar quase colado ao seu — Eu te amo muito.

— Você está bêbado? — Sorri suavemente, retirando um pouco de seu cabelo de sua testa suada, observando mais de perto seu rosto se desmanchar em um de seus lindos sorrisos quando me aconcheguei a ele, suas leves sardas como constelações no topo de seu nariz e bochechas.

— Eu sou um poeta, meu amor — ele beijou meu cabelo — e nenhum artista tolera a realidade.

— Vitor Lispector? — brinquei.

— Nietzsche, na verdade — ele riu — viu? Ainda estou parcialmente sóbrio!

— Ênfase no parcialmente — terminei meu vinho — Podemos ir?

— A noite é uma criança — ele mexeu as sobrancelhas sugestivamente — Podemos deixar ela em casa e, você sabe, buscar um pouco de diversão.

— Aposto vinte reais que você cai na cama e dorme — pisquei em desafio.

— HÁ — ele apertou minha mão estendida — Eu sou uma máquina! Acha mesmo que algumas taças podem me derrubar?

O ronco alto de Vitor me provou que eu precisava chamar a assistência técnica para minha máquina, porque ele dormiu sentado no sofá, nem mesmo alcançando a cama antes de seu corpo ceder ao cansaço. Retirei seus tênis e ajustei seu corpo para estar parcialmente deitado, cobrindo-o com uma manta.

— Meu filho é sortudo — Thai saiu da cozinha, entrando na sala com um copo de água e dois remédios em sua mão, os depositando na mesa de centro — Ele tem sorte de ter você.

— Eu é quem tenho sorte — abracei-a de lado e caminhamos juntas para o corredor dos quartos — por ter vocês dois em minha vida.

— Nós te amamos — ela sorriu.

— E eu amo vocês — nos separamos — Boa noite, Thai. Tenha uma boa noite de sono.

— Sempre durmo bem quando vocês estão aqui — ela disse abrindo a porta suavemente e se apoiando no batente, aguardando que eu fizesse o mesmo.

— Nos vemos amanhã de manhã - mandei um beijo pelo ar.

— Às dez horas da manhã — ela bocejou entrando em seu quarto — com pontualidade inglesa.

— Sempre — sorri, fechando a porta, meu coração transbordando ternura.

Vitor acordou em algum momento da madrugada, se juntando a mim em nossa cama ainda meio sonolento, mesmo no escuro eu sabia que estava exausto, mas feliz. No silêncio ouvi sua voz baixinha, testando se eu estava acordada ao dizer:

— Estou feliz por estarmos juntos.

— Eu também - respondi me virando, ficando de frente para ele e encostando nossos narizes carinhosamente, ele passou sua perna por cima de mim e me puxou para seu peito, permitindo que eu me ajustasse em seu abraço de urso.

Adormeci com um sorriso no rosto.

O Homem SantoOnde histórias criam vida. Descubra agora