Até você, Lisboa

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~Verônica Torres~

Muitos acreditam que intimidade é tocar em alguém, conhecer seus pontos de prazer, mas acreditar intimamente entender essa pessoa baseada apenas nisso? Não, isso não. Vai mais adiante, conexão é o que te toca o peito, aquece a alma, conexão pra mim é sinônimo de escrever, de pintar, de arte, de você. Fecho os olhos sentindo-os marejar, quando os abro viajo até a tatuagem em meu pulso, suspirando pesado fixo a atenção no pequeno "A" traçado em cima da veia, "A" de arte, de ar, de amor, "A" de Anita, todos os caminhos me levam a você e isso tem me sufocado ultimamente.

Notei o tempo em que estava acordada quando o sol passou a iluminar a sacada do hotel e fui obrigada a jogar fora o cigarro entre os dedos, a ressaca me batia a porta na medida em que minha dor de cabeça escalava, a mulher nua em minha cama começava a demonstrar que acordaria caso não tapasse a luz, suspiro retornando a cama, tento em vão calar minha mente, mas não dá, lembro dos poemas que escrevi na noite que te conheci, eu nem dormi, eu juro, eu nem dormi.

Fevereiro de 1995, Instituto de Ensino Cosme e Damião...

O diretor devia estar a meia hora em frente ao quadro apresentando algumas diferenças deste ano comparado aos outros, mas eu não o ouvia, não tinha como quando meus olhos haviam se fixado nela, a pose fechada contradizendo a delicadeza de seu rosto, os traços finos só ajudavam a compor o que ela parecia ser: uma das inúmeras obras de arte renascentistas, o equilíbrio entre o simples e o exagero, o caos e a calmaria.

Durante a semana me permiti apenas observá-la de longe, memorizar seus traços a distância, me faltava coragem e talvez ela sempre faltou.

O que era para ser apenas uma semana, se tornou um, dois, quatro meses, a coragem esvaia por entre os dedos cada vez que estava na mira de seus olhos verdes e aqueles olhos, ah, aqueles olhos perseguiram-me de tal modo que em meus sonhos fazia-se presente como tatuagem ou pior, como uma marca gravada em meu coração a ferro em brasa.

Até o dia que você veio e o caos a minha volta se calou.

Junho de 1995...

–– Você é a Verônica, não é? –– Quando ouvi sua voz próxima a mim, senti meu coração disparar no peito e o chão estremecer abaixo de mim.

–– Sou, você é a Anita, certo? –– A loira confirma com a cabeça, –– desculpa perguntar e não quero parecer indelicada, mas, o que você quer comigo? –– O anjo loiro abaixa um pouco a cabeça enquanto ri fracamente cerrando os olhos.

–– Perdão Verô, é que eu sempre te vejo pelos cantos desenhando ou escrevendo e bem... –– ela estava corando? –– Eu queria saber se você poderia me ensinar, depois daquele trabalho de artes em que você apresentou aquele quadro eu venho reunindo coragem para perguntar se você poderia me ajudar.

–– Eu te ensinar?

–– É, a desenhar, nada melhor do que aprender com a melhor, não é mesmo? –– O sorriso aberto destinado a mim só fez sumir cada vez mais as palavras que deveria dizer e não havia outra alternativa a não ser seguir o que meu coração mandava em batidas tortas.

–– Você consegue começar amanhã?

–– Com toda a certeza, muito obrigada Verô!

Da mesma forma que você veio, sumiu de minha vida, em um estalar de dedos desapareceu de minha frente como se tudo que passamos fosse algo efêmero e talvez, para você fosse isso, algo passageiro, tão frágil que na primeira oportunidade se fragmentou de tal modo que beira o impossível tentar retratar, talvez todas as flores que roubei para você fossem um erro, talvez tudo isso fosse um erro, talvez voltar nessa cidade fosse um erro, talvez seguir a maldita promessa fosse um erro, parece uma piada, mas cá estou eu, flertando novamente com este erro de voltar nessa cidade, mas você sabe o que aconteceu e sei que uma parte de mim foi embora junto com ti naquele dia.

Parece piada, mas ontem fez dez anos desde a última vez que olhei em seus olhos e eu lembro de cada segundo encarando suas íris como se minha vida dependesse disso e cá estou eu, novamente seguindo este pensamento como uma louca desvairada, uma viciada em abstinência de você que necessita que pelo menos uma última vez cumpra sua promessa que fez naquele dia, pois estou indo até você, Lisboa.

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Demorei para voltar não demorei?

Mil perdões a todos os meus leitores, sei que prometi não demorar tanto, mas antes tarde do que nunca. 

Venho apresentar a vocês meu mais novo xodó, "Lisboa" - como carinhosamente chamo -  apareceu para mim enquanto eu escutava a música de mesmo nome da dupla Anavitória, escrevi/escrevo essa história com muito carinho para vocês, serão capítulos curtos divididos entre Anita e Verônica. Desde já agradeço pela compreenção por ter me esperado por tanto tempo e quero que apertem os cintos e se ajeitem para esta viagem em direção a capital portuguesa.

Fiquem bem e um beijo!

Ass: Luiza.

Até você, LisboaOnde histórias criam vida. Descubra agora