Capítulo 2

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SKYLAR

Quando o forno apitou me tirou do limbo, trazendo-me novamente para a realidade. Tirei o prato de comida com cuidado para não queimar meus dedos e apoiei no balcão, para tirar as ervilhas no canto. Meu celular acendeu com a notificação, uma mensagem da treinadora.

"Acho que tive uma ideia para ajudar! Amanhã conversamos..."

Não abri. Meu fiasco no rinque naquela manhã ainda me assombrava. Era melhor que encontrasse um jeito de superar minhas inseguranças antes que todo o investimento em fisioterapia fossem por água abaixo. Encarei o prato de comida e senti o estômago embrulhar. Suspirei voltando a comida na geladeira, e pegando o celular caminhei até o meu quarto. Talvez fosse a frustração e a ansiedade falando mais alto, mas não queria voltar para Exeter naquele ano. Deitei na cama, encarando o teto branco e puxei o ar, enchendo os pulmões de oxigênio. Segurei o máximo que pude antes de soltar o ar. Peguei o telefone na intenção de responder a mensagem, mas ao desbloquear a tela a foto de James, outro patinador de Exeter, apareceu na tela. Seu sorriso torto brilhava, ao lado de sua namorada e mais alguns alunos do último ano, todos em suas roupas de banho. Meu olhar fixou-se no fundo da foto, eu conhecia aquele lugar. Passei para a próxima foto, outra foto do mesmo momento, agora na conta da namorada de James. E então no fundo reconheci as cores de Exeter, era uma das piscinas aquecidas da escola. Que diabos eles estavam fazendo na escola? Me ajeitei na cama, abraçando o travesseiro, e abri os stories de James. A maior parte, senão todos, meus colegas de turma estavam ali. Com seus calções de banho e biquinis. Revirei os olhos, que idiotice, invadir a escola e postar as foto nas redes sociais.

Fiquei ali, alguns minutos vendo os vídeos, passando de uma conta para outra. Até chegar ao capitão do time de hockey, ele parecia embriagado, sorrido feito um idiota para a câmera, enquanto no fundo outro menino virava a latinha de cerveja em uma única golada, mas meu olhar foi até o menino sentado no alto da cadeira de salva-vidas, ele segurava uma garrafa de água, e mesmo rindo gritou:

- Pare de virar latinhas de cerveja seu imbecil, não vou levar você embora se estiver vomitando! - disse fazendo todas as pessoas em volta rirem. Encarei a menina de biquíni rosa, sentada ao lado dele, seu cabelo cacheado ia de um tom escuro, caindo em cascata até as pontas douradas. Ela parecia confortável ao lado do garoto, imaginei ser seu namorado, formavam um belo casal, estranhamente combinavam. Cliquei no arroba, abrindo a conta que estava na marcação. Bryan White, cabelos morenos bem cortados, olhos castanhos escuros, pele levemente bronzeada, defensor do time. Ele fazia algumas aulas comigo, sempre cercado de amigos, em maioria do time de hockey da Exeter, a menina estava em várias das fotos do seu perfil, Zoe Scott. Ela fazia algumas aulas comigo também, e descobri que era prima de Bryan. Fazia sentido, constatei, ambos tinham o mesmo nariz e lábios carnudos.

Eu não sabia da festa. Não que fizesse muita diferença, eu não iria de qualquer forma. A volta do feriado de ação de graças é importante para quem estava disposto a seguir uma carreira profissional, antes de iniciar o treino provavelmente sentaria com a treinadora e decidiria as músicas para as rotinas de apresentação do Circuito das escolas de Massachusetts, depois definiríamos o plano de inscrições, calculando quais competições participar naquele ano. Suspirei bloqueando o celular. Se eu tivesse participado das competições ano passado, poderia ter ido para o Grand Prix Junior, quem sabe já teria alguma proposta para representar os Estados Unidos nas Olimpíadas na próxima edição. Me revirei na cama e fechei os olhos. Era melhor dormir do que entrar nessa espiral de pensamentos depressivos de "se".


BRYAN

Eu estava segurando Carlo pelo moletom molhado enquanto o center botava todo o álcool para fora, junto com o jantar. Suspirei tentando não vomitar junto, e levantei meu olhar para outro lado. Foi quando avistei as luzes cortando os jardins da entrada do bloco de esportes. O diretor e mais alguns guardas caminhavam sorrateiros por ali.

- Puta merda! - sussurrei - Carlo, você precisa respirar fundo agora mesmo.

- Eu to tentando cara! - ele respondeu fraco, levantando o rosto para mim - To tentando!

- Fala baixo! - virei a cabeça do menino na direção do grupo que se aproximava - Precisamos tirar o time daqui, agora!

- Merda! - ele limpou o canto da boca com a manga do moletom e respirou fundo - Certo, estou bem! - mentiu, visivelmente segurando a ânsia.

- Eu vou atrasar eles, mas preciso que tire minha prima daqui e leve ela para casa. Andando! - completei.

- Vai por mim cara, eu to tão burro que não sei nem onde deixei o carro. - Soltei um riso baixo e empurrei Carlo para dentro do ginásio. - Mas e você?

- Eu me viro! - ele assentiu - No máximo vai me dar uns dias de castigo e o treinador vai converter em horas extras no gelo. Vai logo. - Carlo saiu cambaleando e me virei para o grupo que se aproximava do ginásio. Forcei um sorriso e tirei o moletom, segurei as mangas do casaco e saí correndo pelo caminho rodando a peça de roupa, aos berros.

Foi uma cena bem ridícula para ser honesto, os seguranças não conseguiram me segurar e eu acabei tendo que fingir cair no canteiro de flores para que um dos caras encostassem em mim. Queria começar a rir, mas mantive a expressão embriagada o máximo que conseguia fingir, e o banho de cerveja que tomei de Zoe ajudava.

- Sr. White, sinceramente me surpreende que esteja envolvido. - o diretor balançou a cabeça vindo em minha direção. - Está cheirando cerveja. Sabe que é proibido o consumo de álcool dentro da escola, não? - assenti, abaixando a cabeça. - A tradição da festa da piscina é algo bem conhecido, mas me pegou de forma diferente esse ano. - ele admitiu - Nos anos anteriores, proibiram telefones, para evitar isso aqui! - ele virou a tela do celular, um vídeo da festa gravado por algum dos alunos. - E continua! - ele passou o dedo pela tela, mostrando vídeo e fotos, uma atrás da outra. Senti uma leve pontada de vergonha, quem diabos invade a escola e posta nas redes sociais? Sorri fraco.

- Esse vídeo aí tá legal! - disse meio enrolado - Me manda depois? - o diretor bufou, bloqueando o celular.

- Não vou deixar barato, sr. White. Tem pais me ligando, e o conselho vai querer uma medida disciplinar. A tradição vai acabar. - Ah, maravilha seremos a turma que ferrou com tudo. - Leva ele para o bloco administrativo e dê um café ou algo para ele. - pediu para o segurança. O homem assentiu e me empurrou na direção. Só esperava que tivesse dado tempo de saírem, pelo menos Zoe e o time.

...

Depois de duas canecas de café, o diretor apareceu na sala dele. Não estava muito feliz, nunca havia o visto daquele jeito, era sempre muito solícito e sorridente. Ele indicou que eu entrasse na sala e em silêncio o fiz, sentei em uma das cadeiras em frente sua mesa, enfiando as mãos no bolso do moletom. Ele ficou em silêncio, me encarando.

- Você não estava bêbado, estava? - neguei em silêncio. Ele bufou, olhando em volta - Não conseguimos pegar ninguém, além de você. - respirei aliviado - Já estavam todos saindo pela porta dos fundos.... Sabe o que significa?

- Que precisa de seguranças mais novos? - respondi.

- Que você vai ser o único responsável, senhor engraçadinho. - o diretor se apoiou na mesa - Amanhã, quando chegar, não irá para a aula, vai limpar o ginásio todo, sozinho. - dei de ombros. Se fosse tudo que eu teria de castigo, teria valido a pena. O time, provavelmente, me ajudaria de qualquer forma.

- Tudo bem. - relaxei na cadeira, tirando as mãos do rosto e levei a mão até o cabelo.

- Espera, acha que é só isso? - o homem riu, levantei o olhar para o homem.

- Um mês de castigo? - perguntei.

- Pense um pouco maior, sr. White. - meu coração parou.

- Não, o senhor não pod...

- Está fora do time de hockey, até segunda ordem. 

Coração de GeloOnde histórias criam vida. Descubra agora