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8 de Março de 2020 - 14:25H

Lauren estava no carro com a sua família em direcção à zona suburbana de Miami. Enquanto olhava pela janela, não reconhecendo grande parte da zona, a sua mente viajava para os últimos acontecimentos.

Flashback On

23 de Fevereiro de 2020 - 10:42H

Camila, está na hora! - Lauren gritou da rebentação das ondas para a latina que acabava de vestir a mais nova.


10 anos após o dia em que chegaram aquela ilha, dia definido como o aniversário do membro mais novo da família, Lauren estava decidida em voltar ao mundo e dar uma educação à pequena Taylor Sophia.

Com esse pensamento, todos os dias, ela passava horas a consertar o bote que as levou até lá, para que, todos os anos, no mesmo dia, elas tentassem sair dali.

Todas as tentativas foram falhas ora por um mar revolto, ora por tempestades fortíssimas, tubarões que circulavam aqueles mares, correntes que as traziam de volta à areia daquela que era a sua casa agora.

Naquele dia, Lauren tinha acordado com uma energia sobrenatural e uma alegria contagiante. Tinha a sensação de que algo bom iria acontecer e, lembrando-se do dia que era, sai apressadamente do acampamento para encontrar o presente perfeito para a sua, agora, filha.

Como todos os anos, Lauren mergulhou por entre os corais daquele mar transparente, com a sua faca em punho, procurando por aquela concha de onde tiraria uma pérola. Aquele objeto era uma das coisas preferidas de Camila e Taylor e o presente ideal em todas as festividades.

Para tornar ainda mais especial, Lauren pegou uma das flores favoritas da Taylor e com alguns fios improvisados fez uma tiara onde colocou a pérola no meio. Votou para junto das outras duas mulheres que ainda dormiam e se deixou apreciar a beleza de ambas.

Taylor, agora com 10 anos, era dona de uma beleza invejável. Com longos cabelos loiros e madeixas naturais mais escuras, uma pele branca, mas bronzeada pela permanência da ilha e uns olhos azuis que pareciam o céu. Apesar da pouca educação escolar, Taylor Sophia sabia ler um pouco e fazer algumas contas básicas, pois era muito inteligente e as duas mais velhas fizeram questão de lhe ensinar tudo o que sabiam.

Apesar de adorar aquela ilha, que agora era a sua casa, e poder olhar o mar todos os dias, Lauren sonhava com uma vida melhor para Taylor. Queria que ela pudesse ter uma casa, uma família, um amor, tal como ela teve, por isso, todos os anos, no dia 23 de Fevereiro, após dar o seu presente de aniversário, as três iam para o pequeno bote e rumavam ao horizonte.

Naquele dia, o céu estava limpo e com um azul nunca visto. O mar estava calmo e a linha do horizonte era ténue, quase invisível. Após estarem as três no barco, com um recipiente com água e algumas bananas, lauren pegou nos remos e começou aquela que seria a sua última tentativa de um futuro melhor.

Com um objectivo em mente e uma alegria que transbordava, Lauren remou até lhe faltarem as forças até perceber que a ilha já não estava perto. Agora era apenas um ponto verde a muito metros de distância. Camila estava calma e esperançosa, aninhada a Taylor que dormia profundamente nos braços da sua mãe.

Lauren parou de remar quando se viu sozinha, em alto mar, sem rumo, sem orientação e com apenas três bananas restantes. Três dias se haviam passado desde que estavam em alto mar e a esperança começava a desaparecer.


6 de Março de 2020 - 9:56H

Após 12 dias em alto mar, as três passageiras do pequeno bote se deitaram juntas, aceitando aquilo que elas acreditavam ser o fim. Com a pele queimada do sol, os lábios secos pela desidratação, os corpos magros pela falta de alimento e o olhar cansado e sem brilho, aceitaram deixar nas mãos do destino como se iriam reencontrar no paraíso.

Adormeceram as três, abraçadas, naquela que elas acreditavam ser a viagem final para a morte.

21:12H

Um cruzeiro que fazia a viagem pelo atlântico recebeu nos seus radares a informação de um objecto não identificado, chamando a atenção da tripulação.

21:20H

Vendo o objeto se aproximar, o Capitão pediu que alguém averiguasse o conteúdo do mesmo. Três membros da tripulação se dirigiram a estibordo do cruzeiro, conseguindo apenas perceber que se aproximavam de um bote de madeira, aparentemente vazio.

21:38H

Após baixar o barco de apoio do cruzeiro, o Capitão seguiu rumo ao bote de madeira, acompanhado dos três membros da tripulação. Sem ideia do que iriam encontrar, decidiram não irem carregados com utensílios desnecessários.

21:43H

Quando o barco de apoio chegou perto o suficiente do bote de madeira, o Capitão encarou a dura realidade: Três mulheres vestiam roupas brancas sujas e rasgadas, estavam num estado lastimável, os cabelos despenteados e longos, os corpos magros e queimados do sol, a aura de vida naquele barco era inexistente e, para confirmar as suas suspeitas, o capitão entrou no pequeno bote para declarar óbito às três pessoas que ele não sabia quem eram.

21:51H

Quando chegou perto o suficiente para tocar nos corpos desfalecidos, o capitão colocou alguns dedos no pescoço da mulher mais velha tentando sentir o ponto de pulso. Após alguns segundos um brilho surgiu nos seus olhos, assim como a esperança de um milagre.

21:56H

Os dois pequenos barcos voltaram para junto do cruzeiro, trazendo as três mulheres inanimadas e quase sem vida, para serem tratadas na ala hospitalar da cidade flutuante.

Flashback Off



Chegamos. - Clara anunciou, tirando Lauren das suas lembranças.


Com um ar surpreso, a de olhos verdes se permitiu olhar em volta do seu bairro. Ali tudo continuava igual, o cheiro ainda era o mesmo e aquela sensação de nostalgia a rodeou. Sem mais demoras, com olhar triste, sorriu para a família que se dirigia para dentro de casa.

Cansada da viagem e de todas as emoções dos últimos dias, Lauren subiu para o seu antigo quarto, onde tudo estava da forma que ela se lembrava, e caiu na cama com todo o corpo sentindo o seu colchão macio. Por entre lembranças, sorrisos e lágrimas, adormeceu sem dar conta.

O NaufrágioOnde histórias criam vida. Descubra agora