chapitre IX

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𝘾𝙃𝘼𝙍𝙇𝙊𝙏𝙏𝙀 𝘾𝘼𝙍𝙏𝙄𝙀𝙍. ʟᴏꜱ ᴀɴɢᴇʟᴇꜱ, ᴄᴀ



Essa noite foi um verdadeiro inferno.

Minha equipe trabalha para encerrar o serviço enquanto eu encaro as bancadas de aço inoxidável recém polidas. Elas estão lisas e brilhantes, um reflexo do nosso esforço para deixar tudo perfeito.

Senti um alívio gigantesco quando o som das panelas batendo, dos pratos sendo lavados e dos pedidos sendo gritados pelos meus cozinheiros diminuiu. O aroma de tomilho e pimentas começava a desaparecer, enquanto o cheiro de desinfetante tomava conta do ambiente. Era uma confirmação silenciosa de que o corre-corre finalmente havia ficado para trás.

Pensava em como tudo mudou nos últimos dias: eu não penso mais na minha ex-mulher e tenho saído com a garota que, até pouco tempo atrás, só fazia parte dos meus sonhos. Meu restaurante está bem das pernas, mas não o suficiente para eu conseguir a bendita quantia que Walter está pedindo. Meu pai está piorando a cada dia e minhas economias estão indo pelo ralo. A primavera acabou e eu tenho que desenvolver o novo cardápio de verão. Mal tenho tempo para respirar e, com a pressão do trabalho, parece impossível equilibrar tudo.

Eu observei com um olhar distante todo mundo se movendo de um lado para o outro.

Sabia que essas preocupações não desapareceriam tão facilmente. Decidi que precisava de um tempo para mim e caminhei até a despensa em silêncio absoluto. Era um espaço pequeno, mas perfeitamente arrumado. As paredes estavam tomadas por prateleiras do chão ao teto, abarrotadas de ingredientes da mais alta qualidade. Latas de tomates pelados, potes de especiarias, sacos de farinha, arroz e açúcar empilhados. Cada coisa tinha seu lugar, desde as garrafas de azeite e vinagre aos grãos e leguminosas. 

Meus dedos tocam a etiqueta com a data de validade da última mostarda Djon que preparei.

A relação que tenho com os alimentos é uma paixão visceral. Conheço cada detalhe dos meus ingredientes de cor e salteado – o nível de ardor de cada pimenta e a textura de cada vegetal, até a origem das especiarias. Eu poderia responder a qualquer pergunta sobre os meus pratos. A cozinha sempre foi muito mais do que um espaço de trabalho para mim. Talvez seja por isso que eu sempre amei as despensas; é aqui que encontro consolo.

Meus joelhos cedem e um suspiro cansado me escapa.

Eu me sento no chão frio enquanto olho para os recipientes ao meu redor. Existe uma sensação de ordem e tranquilidade aqui dentro que me traz um alívio instantâneo. Nada está fora do lugar.

Geralmente é o suficiente para me fazer manter a calma, mas hoje eu não conseguia afastar a aflição.

Mesmo mergulhada nos meus pensamentos, consegui ouvir o som dos passos do lado de fora. Eu já sabia quem seria, antes mesmo dele abrir a porta. Não é uma surpresa que Nate me encontre porque ele conhece bem as minhas manias.

— Charlotte, você está bem? — perguntou assim que entrou e bateu a porta de alumínio.

Olhei para ele de baixo para cima.

— Só precisava de um tempinho — respondi, tentando sorrir — Foi uma noite cheia — estava um pouco rouca.

Nathan se aproximou com passos suaves, que estudavam o território, e avaliou o meu rosto por um minuto inteiro.

— Tem certeza? Não parece só isso para mim — insistiu. Eu esperava por isso. Ele não desistiria.

Fiquei em silêncio e ele continuou de pé, dando uma olhada ao redor.

— Você precisa de uma pausa, Charlie — sugeriu com a voz carregada de preocupação depois da minha omissão.

Ele estava cuidando de mim e eu não queria ser grosseira, mas uma pausa era tudo o que eu não precisava. Por outro lado, não sabia como dizer isso sem parecer uma megera teimosa, então me calei mais uma vez.

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