"Soldier keep on marchin' on
Head down 'til the work is done
Waiting on that morning sun
Soldier keep on marchin' on"KUJOU SARA
Nada, não existe nada que possa mudar.
Meu corpo já não sente mais as dores dos ferimentos, nem mesmo os cortes profundos das katanas podem me fazer sentir algum estímulo de dor. Minha cabeça poderia estar vazia mas esse não é o caso, por que consigo escutar todas as vozes ressoando no fundo da minha mente.Sinto a terra roendo minha pele, estou quase soterrada se posso dizer assim, mas nada é tão ruim quanto a sensação de sangue em todo o meu corpo. Aquele líquido molhado escorrendo como água até chegar aos meus pés, ele não deveria ser tão abundante fora das minhas veias mas não é meu, então é diferente, não é meu.
Levanto meus olhos e vejo os corpos estirados pelo chão, as cabeças rolando até minha direção. Uma delas fica bem do meu lado olhando bem no fundo dos meus olhos. Parece viva se não fosse pelo sangue escorrendo e as veias não mais pulsando com aquele tom roxo se formando, talvez eu pensasse que estava vivo me julgando pelos meus pecados.
O cheiro denuncia que estou aqui a bastante tempo, pois aquela podridão carregada da morte enche meus pulmões passando pelo meu sistema respiratório como se fosse um prato podre cheio de minhocas e moscas andando pelo corpo já esquecido.
É horrível, carregado de enxofre, digamos que nem mesmo os ácidos mais horríveis que poderia sentir trazem a sensação horripilante do fedor de corpos apodrecendo.
A cabeça continua ao meu lado, com o tempo consigo lembrar de seus gritos... Era tão alarmante sinto que vinha do fundo de sua garganta, a própria alma sentiu o pavor de morrer. Será que eu sentiria isso perto da minha morte? Se bem que isso não é possível.
Aqueles gritos, eles estão na minha cabeça, entram como parasitas loucos para devorar tudo que veem pela frente. Estão devorando-me de dentro pra fora, aquelas palavras não pronunciadas, ou metade delas saindo de suas bocas como se fossem gemidos. Carregadas de dor, medo e pavor.
Meus olhos continuam estáticos, desde a guerra nada mudou, continuo a mesma carregando aquele olhar distante que ninguém nem eu mesma consegue alcançar ou compreender para onde estão indo. Por que não tem rumo, não existe lugar para mim.
Eu já não me recordo quanto tempo fiquei aqui, mas depois de matar uma dúzia de samurais alado acabei me sentindo sem vontade de continuar andando. Só queria um momento de paz.
O céu está nublado, cheio de nuvens cinzas que deixam o sol coberto. Não consigo enxergar mais nada além do sangue derramado pelo chão, a poça já secou mas o cheiro continua presente. Deito-me colocando minha cabeça contra a terra molhada.
Os gritos continuam ressoando em minha mente, são alarmantes, doem como uma pontada perfurante de uma lança de pequeno porte. Infelizmente não é o suficiente para me matar, só o mínimo para me deixar tremendo.
Sei que estou aqui olhando para o nada a dias sem conseguir me mexer, de meus lábios não sai uma palavra desde que a guerra acabou, não grito por misericórdia nem falo com os meus inimigos. Mesmo que eles tentem se comunicar comigo não vejo o porquê de proferir palavras que nunca vão chegar até seus ouvidos.
A guerra deixou em mim inúmeras marcas, não só de cicatrizes como também aquela sensação de inutilidade de que ninguém mais me quer no paraíso deles. Nenhum dos deuses ficaram comigo depois da guerra, me deixaram vagar na terra apenas matando samurais que podem ser ruins ou apenas inocentes.
Minhas mãos por mais que estejam curadas ainda é possível ver os calos de tanto segurar minha katana, algumas cicatrizes feitas pelos deuses que matei continuam aqui, uma bem aparente no peito foi do deus que esqueci o nome mas lembro-me de sua voz estridente. Foi mais um entre muitos.
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Correntes da Alma - YaeSara!¡
RomanceUma guerra muito antiga deixou rastros nas almas de muitas pessoas, os deuses pararam de brigar para finalmente deixar seus guerreiros descansarem. Mas alguns ainda carregam as marcas do seu passado, as vidas inocentes que tiraram ou as coisas ruins...