Passaram-se desde então trinta e três anos, e a tragédia na casa dos turcos, e os fatos pra lá de bizarros ocorridos naquele dia, tornaram-se lendas, histórias desacreditadas, contadas pelos mais velhos para assustar e intimidar as crianças que ousavam entrar na antiga propriedade. Sim, ela ainda estava lá, em ruínas, tomada de vegetação e mofo, tão assustadora quanto as histórias que permeiam sua existência. Sua insistência em permanecer de pé somou-se às lendas sobre a tragédia e a outros fatos ocorridos… Outras histórias de fantasmas, de avistamentos dos irmãos turcos, do velho que passeava pelos escombros da velha propriedade com um lampião na mão… Mas nenhuma história podia prever o que estava para acontecer, pois até eu mesmo duvidava das histórias contadas, e vez ou outra, me escondia no quintal brincando de esconde-esconde. Alguns mais ousados entravam dentro dela para se esconder, mas eu nunca me atrevi a tanto. Eu tinha onze anos nessa época, mas desse dia eu me lembro muito bem.
Naquele dia, nós brincávamos de polícia e ladrão, algo bem comum na época. A nossa rua era tranquila, totalmente residencial, e praticamente todos se conheciam. Em dado momento durante a brincadeira, avistei uma luz acesa dentro da velha casa. Eu não acreditava na história do velho turco, mas eu vi... Então chamei um colega que também viu e confirmou que a luz estava acesa, e logo toda a molecada estava alvoroçada. Uns queriam entrar e outros correram para longe. Não demorou muito para aparecer o primeiro adulto, que chamou outro e outro… E logo a rua estava cheia de gente a observar a velha casa, que estava aterrorizando a todos novamente, trazendo de volta todas as velhas histórias que permeiam sua existência.
Quando a luz começou a se mover dentro da casa, um grupo de homens tomou a iniciativa de entrar e ver quem ou o que se movia em seu interior. Foi então que vimos saindo de lá de dentro um homem. Nessa altura, o grupo de moradores já se encontrava no quintal, e o misterioso homem que se movia nos escombros da casa foi ao encontro deles. Como as pessoas disseram, ele se identificou como proprietário do imóvel e que estava ali avaliando a situação do mesmo para uma possível reforma. Bem, após confirmado que não se tratava de um fantasma nem nada do tipo, as pessoas foram se dispersando, até que sobraram apenas alguns poucos curiosos que, por fim, deixaram o homem em paz… Mas isso não saciou a curiosidade das pessoas que continuaram muito intrigadas.
Os dias passaram e o homem continuou ocupando o local, que foi tomando uma aparência mais habitável e menos assombrosa. Mas ele, assim como os antigos moradores do local, era uma pessoa de hábitos estranhos, já que as pessoas não o viam muito durante o dia… Sempre dentro da casa e bem antissocial, os moradores notaram que ele saía sempre tarde da noite e ninguém o via voltando, até que algum tempo depois, minha mãe ficou sabendo de um fato ocorrido não muito longe dali que a levou de volta àquele dia tenebroso. Uma granja que fornecia frangos para quase todos os aviários do bairro havia sido invadida, e os frangos foram quase todos mortos. A forma como descreveram foi exatamente igual ao ocorrido há trinta anos. Este incidente, somado ao fato de que a casa dos turcos estava agora ocupada por um homem desconhecido, depois de tantos anos, deixou minha mãe preocupada, a ponto de fazer com que ela fosse até a polícia para informar que uma casa havia sido invadida em sua rua.
Mas a polícia não se interessou e falou que este era assunto da prefeitura. Então, como ela estava determinada a descobrir quem era o desconhecido ocupando a velha casa dos turcos, foi à prefeitura. Por sorte, tinha uma conhecida que trabalhava lá, e não demorou muito a mandar um fiscal ao local. Alguns dias depois, minha mãe recebeu uma ligação da moça da prefeitura e ela lhe informou que o fiscal esteve no local e estava tudo certo, e que a ocupação do imóvel era legal, tirando algumas dívidas de IPTU, estava tudo regular. Ela também disse que ele, o suposto invasor, era filho dos antigos proprietários e que seu nome era nada mais, nada menos que Ekhein. Minha mãe sentiu todo seu corpo gelar na hora, pois sempre suspeitou que fora ele, Ekhein, quem matou os pais e também Nora, que nunca mais apareceu. Minha mãe também suspeitava que, se havia um lobisomem nessa história, só poderia ser ele… Eu lembro bem dela estar muito preocupada e inquieta nesses dias.
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O MISTERIO DA CASA DOS TURCOS
Hombres LoboTe convido a me acompanhar nesta passagem sombria, que envolve não apenas a minha família, mas toda uma comunidade, estendendo-se por mais de uma geração, em uma teia de horror e mistérios que antecederam uma série de eventos macabros que aterrorizo...