— Logo fará cinco anos, o tempo não nos espera mesmo. — Ryuko sorriu tristemente para o túmulo em sua frente. - Mas eu esperarei por você, sempre.
A lápide simples continha as datas de nascimento e falecimento, o nome do falecido brilhava suavemente em tinta dourada: Hiroshi Asano. Os humanos são criaturas vis e grosseiras que não entendem o verdadeiro significado da vida, mas ele entendia. Ryuko sabia disso; foi por essa razão que casou-se com este homem do mundo dos vivos, ambos deram um ao outro razões para permanecerem firmes. Ambos se amavam. Ela continuaria o amando até o fim dos tempos.
O cemitério estava vazio, Akaibara foi tomada por um mal tempo que envolveu a pequena ilha em uma chuva fora de hora, o céu chorava. Ryuko crispou os lábios em um princípio de sorriso ao ver Tsubaki, a Kodama em sua forma humana para vagar no mundo dos vivos era muito bela, usava sempre yukatas e sandálias com meias limpas.
— A vida é mesmo algo efêmero, olá Ryuko. — Ela se curvou em um cumprimento leve. — O festival Tanabata está chegando, espero que Asano possa abençoá-la de onde estiver.
— Ainda me lembro de nosso casamento, os próprios deuses permitiram que fosse possível, e-eu...eu apenas gostaria de ter tido mais tempo.
— Não fique triste, aqueles que estão além de nossa existência sabem o que é melhor para todos. — Tsubaki se aproximou para tocar o ombro da outra. — Seus corações estão eternamente conectados, olhe só para a princesa Orihime que vê seu amado Hikoboshi apenas uma vez ao ano...a história de vocês já foi escrita, assim como a deles.
— Você acha que ele se lembrará de mim daqui a mil vidas? — Ryuko fechou os olhos e ergueu o rosto para o céu, a chuva escondia suas lágrimas.
— Ele se lembrará, e garanto que irá procurá-la em todas elas.
— Tsubaki, alguma vez você já amou alguém?
A youkai mais velha riu de forma divertida.
— Claro! Eu amo os humanos, a vida e principalmente a natureza. — disse de forma sincera. — Porém, romanticamente nunca me senti atraída por alguém. Sortudos são aqueles cujo amor tocou profundamente, não acha?
Ryuko se permitiu rir levemente.
— Eles são abençoados com a capacidade de escolherem seus pares, entretanto, muitos nem chegam a conhecer sua alma gêmea. — A Hebi permaneceu de olhos fechados. — São egoístas, ruins, rudes e muitas outras coisas. Penso que certos tipos não merecem conhecer o amor.
— A vida dos humanos é difícil, Ryuko, eles lidam com muitas coisas e às vezes acabam corrompidos. Estão cansados, não que justifique todos os seus atos esdrúxulos...mas devemos julgá-los menos do que o habitual.
— Mas e-
— O amor chega para todos. — Tsubaki a interrompeu. — Alguns simplesmente ficam com a parte distorcida, é difícil entender como os deuses guiam o universo.
Ambas ficaram quietas, o barulho da chuva que diminuiu era a única coisa ouvida com clareza. Tsubaki tocou as costas de Ryuko e também fechou os olhos, a água se encarregou de lavar todos os sentimentos ruins.
❀
O tempo se abriu, o céu azul espantou a chuva de mais cedo dando lugar a um clima fresco e agradável.
Aizen suspirou pela última vez ao ouvir a voz de Yushi preencher sua audição, o menino já havia se jogado no chão e rolado dentro do supermercado humano para ganhar biscoitos recheados. O inugami continuou andando com o kappa ao seu lado até finalmente se abaixar para que o mais jovem subisse em suas costas.
— Então, a Haru obasan é como se fosse sua namorada? — a criança arregalou os olhões para observar bem as reações do outro. — Eu pensei que vocês pudessem casar como humanos.
— É difícil explicar algo tão complexo, jovem tartaruguinha, mas não pense demais nisso. — Algumas mulheres sorriram para Aizen ao ver a atitude de carregar o menino, mas nenhuma delas era Haru. — Casamentos são enormes dívidas cuja maior parte do valor vai para a mulher.
A resposta pareceu ser o suficiente para mantê-lo quieto, o falso loiro respirou de forma aliviada.
— Então, por qual razão os homens se casam?
— Nós homens sem mulheres não somos nada.
— Que estranho, a Haru obasan poderia te enrolar em uma teia e depois comer você como se come mochi.
Uma pequena pausa foi feita.
— Eu deixaria ela me prender em uma de suas teias, seria a morte mais deliciosa para o cachorro velho. — Aizen soprou um risinho. — Mulheres...sem elas o mundo seria cinza como a chuva.
Yushi encostou a bochecha no ombro de Aizen e não disse mais nada, o velhote tem umas esquisitices.
❀
O Tanabata está chegando. Mushiko observa o movimento dos humanos na rua, mulheres com vestidos frescos, crianças coradas e... homens. A atmosfera lhe causa nojo, são criaturas inferiores e, portanto, não deveriam nem sequer possuir o direito de respirar; quanto mais realizar festejos idiotas. Iriam celebrar o amor, mas aquele sentimento não passava de uma farsa distribuída em contos por charlatães. Humanos viviam pela ilusão de serem adorados, entretanto, essa dádiva é dada apenas aos deuses.
Um casal em especial chama sua atenção: o homem usa um yukata azul e a moça está muito bem maquiada, suas vestimentas são de um tom coral. Mushiko abre o leque e esconde uma parte de seu rosto enquanto observa, enraivecida, odiava casais felizes.
— Eu amo você. — ela escuta o homem dizer para a mulher, uma lembrança profunda dentro de seu ser a faz lacrimejar.
— E-eu amo você...eu o amo com todo o meu ser. — Mushiko sentiu o próprio sangue invadir seu rosto em excesso
— Criaturas como você devem morrer pelas mãos de heróis como eu, um demônio jamais conhecerá o amor. — Matsumoto pressionou a lâmina de sua katana no coração da jorōgumo. — Acaba aqui Mushiko, não irá mais aterrorizar ninguém.
Não havia percebido que fechou os olhos, a jorōgumo os abriu e continuou sua leve caminhada; seu tempo jamais deveria ser perdido com ilusões patéticas e sentimentalismo infundado. Homens eram crueis sem meio termo, eles nunca se importariam verdadeiramente com os sentimentos femininos. Assim como Enishi jamais se importou com os seus, tirando-lhe sua dignidade e esperança.
O dia em que renasceu foi marcado pela chuva torrencial do deus Raijin, ele sim era um homem que deveria ser adorado e respeitado até o fim dos tempos; foi o próprio deus dos raios e trovões que lavou o sangue que encharcou seu corpo - devolvendo desta forma a vida para Mushiko, fazendo-a renascer em sua natureza mais sincera.
Aquele casal se vai de mãos dadas, seus olhos os seguem até que sumam de suas vistas, ela não deixa de desejar que todas as desgraças do mundo caíam por cima deles.
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Hakanai
Romance𝐋𝐈𝐕𝐑𝐎 𝟎𝟐 𝐃𝐀 𝐒𝐄́𝐑𝐈𝐄 "𝐃𝐈𝐀𝐒 𝐌𝐀́𝐆𝐈𝐂𝐎𝐒 𝐄𝐌 𝐀𝐊𝐀𝐈𝐁𝐀𝐑𝐀" Expressão japonesa que significa "efêmero", algo que não dura muito. É Tanabata Matsuri, o momento em que a princesa Orihime e seu amado Hikoboshi atravessam a Via Lác...