01. doutora.
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.CAROLINA VIEIRA.
Lembro-me da primeira pergunta que me fizeram na faculdade de medicina.
Por que você quer ser médica, Carolina?
As minhas mãos ficaram geladas e meus olhos se arregalaram. Para a Carolina de dezoito anos, aquela pergunta havia sido mais difícil do que responder a porra do ENEM.
Por que?, eu mesma me perguntei. A resposta óbvia estava na ponta da língua: meu pai é médico, minha mãe também e, olhe só, meus tios e meus primos também são! Estou seguindo o legado da família.
Mas, apesar de parecer lógico, essa resposta não refletia a minha verdade. Eu não estava ali apenas para seguir um legado, para representar o sobrenome Vieira na saúde do Rio de Janeiro. Meu pai sequer imaginou que eu faria faculdade de medicina, já que eu nunca me interessei pela coisa antes dos dezessete anos.
Eu também poderia responder que eu estava ali pelo dinheiro, mas além de ser mentira, isso é uma filha da putisse. Não passei pelos piores seis anos da minha vida pelo dinheiro.
No fim, eu apenas respondi o que todos esperavam.
“Quero fazer a diferença, professor.”
Que piada.
Sabe quem faz a diferença? Pessoas que se sacrificam em nome de algo. E eu nunca me sacrifiquei. Nunca precisei. Nasci com esse privilégio e usufrui dele, cada gota, como um bêbado desfrutando dos prazeres do álcool. Como eu iria lutar por algo se eu nunca soube o que era lutar?
Eu só não esperava que uma resposta boba e mentirosa pra caralho me conduziria por um caminho que nunca imaginei antes.
Eu nunca havia colocado os pés em uma favela até meia hora atrás, quando entramos na comunidade acompanhados pelo meu professor e orientador, Cláudio Ribeiro. O contraste com o meu cotidiano me surpreendia a cada passo.
— Só mais alguns minutos, gente. Logo vamos chegar — alertou ele, liderando nosso grupo com passos firmes.
À medida que subíamos as ladeiras íngremes, o sol inclemente parecia pesar mais sobre nossas cabeças, intensificando o calor do início da tarde. Mesmo assim, eu me esforçava para absorver cada detalhe ao meu redor. Era intrigante pensar que, apesar de morar a menos de meia hora daqui, nunca havia visitado um lugar como esse.
A vida na favela fervilhava ao nosso redor, lembrando-me da movimentação caótica do centro do Rio de Janeiro. As ruas eram um vai e vem constante de pessoas: umas a pé, outras de bicicleta, moto ou carro. A energia do lugar era palpável, cheia de histórias e vidas entrelaçadas.
Meus olhos foram atraídos por um grupo de crianças que, com mochilas grandes e pesadas nas costas, provavelmente estavam a caminho da escola. Uma delas, com o cabelo preso em uma trança apertada, segurava a mão da mãe. Ao notar meu olhar curioso, a pequena acenou com um sorriso tímido. Surpresa e encantada, retribuí o aceno e o sorriso.
— Já está simpatizando com os moradores? — a voz de Miguel me despertou de meus pensamentos.
— Não posso evitar… — um sorriso despreocupado estampou meus lábios. Isso fez meu colega revirar os olhos, mas ele também sorriu. — Você deveria fazer o mesmo. Essa sua cara emburrada não é nada agradável de se olhar.
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HAUNTED || capitão nascimento
Fanfiction──── ❛❛Carolina Vieira, uma médica dedicada e conhecida por sua personalidade gentil, inicia um trabalho em uma clínica comunitária situada em uma das comunidades mais perigosas do Rio de Janeiro. Determinada a fazer a diferença, Carolina se vê dian...