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o medo

| Praia de Copacabana, Rio de Janeiro. 2005

Para uma quarta-feira de inverno, o sol brilhava tão intensamente no céu azul que parecia não ter fim. Mariana, aos 6 anos, estava sentada com um chapéu rosa de praia enquanto construía um castelinho de areia e o decorava com pequenas conchas. Ela estava de férias com a família na casa dos avós, tinha chegado cedo na orla da praia para garantir um lugar afastado da multidão e vazio, o que parecia impossível para um dia de carioca.

Mas aquele momento era especial, pois dias como este eram raros em sua infância. Seu irmão mais velho, Matheus, estava ali para supervisioná-la, mas ele já cochilava há pelo menos 20 minutos, jogado em cadeira de praia, enquanto tinha uma toalha caída protegendo seu rosto do sol. Os pés dele já afundaram na areia e foram cobertos pelas pequenas obras de arte feitas pela irmã mais nova.

Anos atrás, ela e Matheus costumavam construir castelos de areia perto da água salgada, colecionar conchas e peixinhos em um baldinho de plástico. Com o tempo, ele foi crescendo e suas brincadeiras juntos já não eram mais divididas, pois Matheus se tornou adolescente e a menina passou a se acostumar com seus momentos sozinha.

Naquele dia de praia, Mariana não queria mais construir castelos. Estava entediada deitada de barriga para baixo, com os pés balançando para cima e enquanto a mão esquerda apoiava o queixo, de frente para o mar. Enquanto cantarolava uma música que somente ela reconhecia a letra, seus olhos estavam fascinados com as ondas que quebravam na areia em sua frente, e o mar que chegava cada vez mais perto. Foi então que surgiu a ideia, de repente ela queria sentir a água salgada e experimentar a sensação de liberdade que via nas histórias das sereias nos seus desenhos favoritos.

Ela levantou e correu em direção ao mar, mas hesitou por um segundo, pensando se era certo avisar o irmão, pois sabia que se acontecesse algo, ficaria de castigo e sem seus brinquedos favoritos.

Mas logo o medo sumiu e foi substituído por uma empolgação incontrolável, junto ao sorrisinho com tentes tortos da típica criança que quando ficava sozinha gostava de aprontar, Mariana correu em direção à água, sentindo o gelado aos seus pés, mas não se importando.

Ela se jogou nas ondas, rindo enquanto a água espirrava ao seu redor. Ignorando totalmente a bandeira vermelha de alerta que ficava para trás. Olhando ao redor notou os barquinhos ao fundo, quase como brinquedos e não como turistas ou pescadores, então, veio a vontade de ir mais longe e determinada a provar que era corajosa, nadou até onde as ondas eram maiores mas também mais poderosas. Quando sentiu que já não alcança os pés na areia, era tarde demais.

Então, veio a onda maior e mais violenta. Mariana não teve tempo de se preparar. A onda a engoliu, puxando-a para baixo com uma força que ela nunca havia sentido antes. Tentou nadar para a superfície, mas não sabia mais onde estava o início do céu e onde e o fundo do mar. Não adiantava gritar, pois a água a jogava cada vez mais para o fundo. Se sentia sozinha e desesperada e parecia uma eternidade o desespero que apertava o peito.

Foi então que Matheus notou que algo estava errado ao ouvir os barulhos de gritos que estavam abafados no fundo. Ele levantou assustado lembrando da irmã, até que percebeu o que acontecia e correu pela areia em direção ao mar, mergulhou sem hesitar. Mas a distância entre eles era maior do que parecia.

Um surfista que estava mais próximo ouviu os gritos do irmão e se lançou em direção a Mariana. Com força, ele a alcançou e a segurou, puxando-a para cima de sua prancha. Mariana, exausta e apavorada, se agarrou a ele, lágrimas misturadas com água salgada escorrendo por seu rosto avermelhado.

Tudo o que Mariana se lembra desse dia, é que de alguma forma retornou para casa com três pontos na testa e a briga que casou na família.

Nos dias que se seguiram de suas férias, Mariana evitava a praia, mesmo com a família. O som das ondas passaram a ser como um ruído agoniante. Ela não conseguia e muito menos queria entrar na água, nem mesmo até os joelhos. O baldinho de plástico foi deixado de lado e o mar se tornou uma lembrança ruim.

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Sereia | gabriel medinaOnde histórias criam vida. Descubra agora