- Como foi a aula, querida? - Minha mãe pergunta, depois de me dar um abraço. - Ocorreu tudo bem?
- Acho que sim. - Respondo, colocando o meu cabelo molhado do banho recém tomado para trás. - Mas eu ainda prefiro estudar em casa.
- Bobagem, logo irá se acostumar com o novo ambiente, e terá vários amigos.
Amigos... Eu nem sabia o que era isso.
- Poderia chamar o Raphael e o seu pai para jartarmos, enquanto eu coloco a mesa?
Confirmo, indo em direção a escada. Meu pai estava lendo um livro aleatório, ele trabalhava como médico cirurgião, então quando estava em casa, sempre estava a ler algum livro, ou esquematizava algum programa em família.
Após chamá-lo, me dirigi até o quarto de Raphael, já lendo a grande placa na sua porta de "não perturbe". Ele sempre foi reservado, pelo menos, desde que eu cheguei aqui, é como ele age.Bato de leve na porta, esperando uma resposta do mesmo, mas ele nada responde.
Será que ele ainda não havia voltado? Depois que cheguei, só agora desci para a cozinha, então não tinha ideia.
E é com esse pensamento que eu decido quebrar as regras, girando a maçaneta e adentrando no quarto. Seu quarto tinha um cheiro diferente, e as suas coisas em volta do quarto se formavam uma enorme desordem nesse ambiente caótico, e estando aqui, eu não me contive em observar todo o espaço cujo eu só havia visto uma vez quando criança. Nas paredes haviam vários pôsteres de bandas de rock, jogos do seu vídeo game espalhados pela mesa gamer, entre outras coisas que não tive chances de ver melhor.
Me viro ao ouvir o barulho de porta se abrindo, e não podia me arrepender mais de ter entrado naquele quarto sem a sua permissão.
- Porra, garota! O que está fazendo na droga do meu quarto? - Raphael havia acabado de sair do banheiro, completamente nu, se cobrindo rapidamente com a toalha que secava o seu cabelo.
Não consegui dizer nada, meus olhos vidrados no momento em que ele saiu me fazia querer pular da janela. Então, antes que ele pudesse falar mais alguma coisa, eu simplesmente corri para fora do quarto.
O que eu fiz? Por que entrei no seu quarto? Eu nunca havia o visto daquela forma, me sentia envergonhada, nunca mais conseguiria olha-lo novamente.
Depois de lavar o rosto no banheiro, na tentativa de limpar minha mente daquela imagem, eu desço, encontrando todos já sentados a mesa, exceto por Raphael, que chegou assim que eu me sentei. Não conseguia sequer olhar para ele, ainda me sentia constrangida, e não confirmaria isso olhando em seus olhos nem pensar.
Comemos em silêncio, e depois, cada um seguiu para uma área da casa. Eu, fui para o meu quarto, pois acordaria cedo no dia seguinte para a minha cessão de terapia antes da aula. Pego um livro sobre mitologias que eu sempre lia alguns capítulos antes de dormir, e como de costume, já me preparava para ler na minha posição favorita, deitada de bruços, quando a porta é aberta grosseiramente.
- Raphael... - Olho para ele por poucos segundos, antes de desviar para as minhas próprias mãos, envergonhada.
- Não entre no meu quarto novamente, está me entendendo? Nunca! - É tudo o que ele diz, saindo em seguida da mesma forma que surgiu.
Como se não pudesse piorar nossa relação...
[•••]
- Como está sendo sua primeira semana indo para a escola? - Priscilla, minha psicóloga me perguntava, dando início as suas anotações.
- Normais, eu acho... Ainda me sinto estranha estando rodeada de tantas pessoas, me causa uma certa falta de ar.
- E isso é completamente normal no início, mas só de não ter tido nenhuma crise, significa que está indo ótima.
- Pode ser.
- E quanto aos sonhos? Persistem?
- De vez em quando, mas essa semana eu ainda não tive. - Respondo, enquanto fitava o ventilador do teto girar.
Eram as mesmas perguntas de sempre, se eu continuava a ter os mesmos sonhos, como estavam as minhas crises, e se eu estava tomando os meus remédios normalmente. Desde criança eu fui obrigada a tomar uma série de remédios, tudo isso graças ao meu diagnóstico de crises de pânico e ansiedade e até alucinações.
Depois da terapia, o meu pai foi quem me levou para a escola, aquele se tornaria nosso ritual de sempre a partir de agora, então caberia a mim me acostumar com essa nova rotina, já que eu havia estudado desde os seis anos em casa, e só agora, ao completar dezesseis é que eu enfrentaria o caos que é frequentar uma escola.
Raphael é sempre o primeiro a entrar, sempre fazendo questão de me manter longe. Então quase não o via durante os intervalos entre as aulas.
- Boa aula, filha. - Me despeço do meu pai com um aceno, seguindo para dentro.
Já no colégio, me sento no mesmo lugar, já familiarizado por mim, chamando o mínimo de atenção possível.
- Droga... - Não deixo de notar, uma garota sentada a minha frente se frustrando por algo, me assustando quando a sua atenção se volta para mim. - Você teria uma caneta sobrando? Acho que deixei o meu estojo cair em algum lugar.
Era a primeira pessoa em uma semana a puxar assunto comigo, e a sensação era estranhamente boa.
- Claro... Fique com essa. - Entrego a minha para ela, que me agradece com um sorriso, virando-se novamente.
Durante o intervalo, segui até o refeitório, e novamente sou chamada a atenção, pela mesma garota da minha aula de matemática.
- Oi, Katherine, não é?!
- Sim. - Respondo sem jeito enquanto me servia.
- Prazer, sou Gina.
O que eu falava agora?
- Sobre o trabalho de Matemática, você já tem uma dupla?
- Na verdade não. - Respondo, agora com a bandeja em mãos, procurando por uma mesa vazia.
- Ótimo, então podemos fazer juntas, se você quiser é claro.
- Juntas?... Sim, eu quero sim. - Respondo sem conter o sorriso. Será que isso era o início de uma amizade?
- Olha só, tem uma mesa vazia bem ali, vamos.
Havia um sentimento novo dentro de mim, eu nunca havia tido uma amiga, ou amigo, e ter criado uma conexão com alguém em tão pouco tempo me deixava extremamente feliz. Talvez minha psicóloga tenha razão, eu realmente precisava de amigos, e de ter pessoas novas para conversar.
Talvez seja por isso que eu sonho tanto com aquelas duas garotas... Porque no fundo, talvez eu só tenha medo de ficar sozinha, ou de ser deixada para trás.
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Katherine Em: Morando Com O Inimigo
Ma cà rồngAonde três irmãs ao tentarem fugir do perigo, ainda na infância, por um descuido, acabam se separando numa floresta traiçoeira. Katherine ainda era nova, não entendia o que estava acontecendo, e o porque dos seus pais quererem que elas fossem embora...