Katherine Em: Morando Com O Inimigo

05 - Conversa Particular

"— Kat! Devolve a minha boneca! — A garota de cabelos escuros gritava, enquanto corria atrás de mim.

— Não! O papai comprou ela pra mim! —Abraçava a boneca de pano nos braços, para protegê-la dos braços da outra, que tentava pega-la a todo custo.

— Quer saber... — Desvio minha atenção para a maior, que se aproxima bruscamente de nós, arrancando a boneca dos meus braços, correndo em direção a janela e jogando-a para fora.

— Max! Por que você fez isso? — Emburrada, a de cabelos escuros corre para o quarto.

— Pra vocês pararem, ué.

E eu, inconformada com o que ela havia feito, corri até a porta, sendo impedida pela mesma, que me empurra para trás.

— O que pensa que está fazendo?

— Eu quero a minha boneca...

— Não podemos sair enquanto o papai estiver fora! Você entendeu? Nunca saia! Nunca!"

— Katherine...? — Abro os olhos, ainda sonolenta, vendo Gina passar de toalha, indo até o seu armário de roupas. — Você dorme a beça, garota.

— Dormi demais? — Me levanto, mentindo uma leve dor de cabeça. — Não estou acostumada a ir dormir tão tarde.

— Relaxa. Toma um banho que se sentirá melhor.

E seguindo o seu conselho, eu tomo um banho gelado para despertar, e após, seguimos até a cozinha para tomar café.

— Bom dia meninas. — A mãe de Gina nos recebe, já se levantando para sair. — Como foi a noite de vocês?

— Foi ótima. — Gina responde. Eu me sentia envergonhada em dizer qualquer coisa a respeito, já que não havíamos passado a noite aqui.

— É, foi ótima. — A irmã mais nova concorda, me surpreendendo. Elas mentem da forma mais natural possível, como se isso fizesse parte de suas rotinas.

Por outro lado, a mãe delas as olhava de forma desconfiada, mas ainda assim, relevante, apenas concordando.

— Que bom. Eu já estou indo, Gina, não esquece de deixar a sua irmã na casa da Grace.

— Sim, chefe.

Nos sentamos e então observei elas se servirem de ovos com bacon.

— Não vai se servir? — Ela me questiona ao me ver encarar o prato vazio.

— É que eu não como carne animal...

— Não brinca?! Achei que essa história de vegetarianismo fosse lenda.

— Está de frente para uma lenda viva então. — Sorrio sem jeito.

— E do que você se alimenta? — Nicole pergunta, levando um pedaço de bacon a boca.

— Bom... De qualquer coisa que não seja feita de bicho morto.

— Ela só não come carne, anta!

— Não enche, sua chata!

— Situação resolvida para a não carnívora. — Indo até o armário, seguido da geladeira, Gina coloca na minha frente um pacote de pão de forma e dois potinhos de geleia de morando e creme de amendoim. — Fique a vontade.

•••

Depois de passar a manhã e o começo da tarde na casa da minha mais nova amiga, era hora de voltar para a minha. E chegando lá, de cara, ao abrir a porta, vejo Raphael jogando vídeo game na sala, acompanhado de um de seus amigos. Tento passar despercebida, mas assim que fecho a porta, os olhares de ambos se viraram para mim.

— Oi. — Os cumprimento como educação, enquanto seguia rumo as escadas.

— Oi. Catharina, certo?! — O garoto pergunta, após o outro ter me ignorado.

— Katherine, na verdade...

— Claro. Senta aqui com a gente, Katherine. — Olho para ele espantada com o convite, tanto quanto Raphael, que não gostou nada da ideia, apesar de continuar calado.

— Obrigada, mas... Eu preciso subir agora. — Agradeço, e continuo o meu caminho, ouvindo Raphael brigar com ele quando sumi de seus olhares.

Respeitávamos o espaço um do outro, ele mesmo quem delegou isso. Então, não seria tola novamente em quebrar a principal regra da nossa convivência. Até porque, da última vez que fiz isso, acabei vendo o que não devia ter visto, e não posso negar que essa imagem ainda assombram meus pensamentos.

[•••]

Após a aula de ginástica que não foi bem sucedida, devido as dores internas que tenho sentido a semana inteira, precisei sair para respirar. Não sabia o que estava acontecendo comigo, mas não pretendia contar para os meus pais. Eles já andam preocupados demais comigo, sempre tive vários problemas, então, não pretendia preocupa-los com mais um que possivelmente, logo passaria.

— Katherine! — Ouço me chamarem antes que eu entrasse no banheiro feminino. Era o amigo de Raphael.

— Ulrich, oi. — Respondo quando ele já está mais próximo de mim.

— Teremos um treino assistido hoje, ficou sabendo?

— Ah... Sim. — Eu não curtia muito esportes, então não estava muito animada para assistir.

— Eu fui dispensado, sabe, enquanto recupero o tornozelo, ainda está um pouco inchado.

— Eu fiquei sabendo. — Não fazia ideia do porquê ele estar me contando essas coisas, já que nunca tivemos qualquer tipo de contato antes.

— Estava pensando, você poderia me encontrar no corredor? Próximo do vestiário.

— Mas... Para que?

— Quero te falar uma coisa. — Ele diz por fim, se distanciando.

O que poderia ser tão importante para ser dito depois? Nessas horas, eu gostaria de ser menos curiosa. Minha cabeça soava um alerta vermelho para mim não ir, nem querer saber do que se tratava, mas por outro lado, eu queria realmente saber quais eram suas intenções comigo.

Gina sempre me fala sobre garotos e relacionamentos amorosos, mas, será que era algo relacionado a isso o motivo dele querer tanto me encontrar em particular? Eu não sei se estava pronta para me envolver romanticamente com outra pessoa, mas também não sabia dizer o que era estar ou se sentir pronta para isso, já que eu nunca vivi nada parecido antes.

Durante todo o dia foi assim. Minha ansiedade gritando alto, minha curiosidade aflorada, e o medo do desconhecido, todos juntos gritando em minha cabeça todas as possibilidades possíveis que pudesse acontecer comigo. Até cogitei contar para Gina, mas minha vergonha me impediu, junto com a incerteza de ser apenas algo banal e comum que aconteceria, e eu estivesse apenas criando paranóias desnecessárias em minha cabeça.

Talvez seja isso. Talvez ele só queira me dar um recado, ou contar uma notícia, qualquer coisa que tenha que ser contada longe dos outros. Não precisava preocupar mais ninguém além de mim mesma. Eu é que sou ferrada da cabeça, então, eu é que tenho que lidar com minhas próprias ansiedades e medos, afinal, se nem eu entendia direito o que se passava em minha cabeça, porque outra pessoa iria?